O Conselho Superior de Magistratura deu parecer negativo à possibilidade de as secretas terem acesso aos dados de tráfego dos telemóveis, os chamados metadados, avança o Diário de Notícias. Para os juízes, o projeto de lei do CDS e a proposta de lei do Governo, que foram debatidos esta quarta-feira no Parlamento e que vão ser votados esta sexta-feira, incorrem em inconstitucionalidade. Na sequência das notícias divulgadas, o Conselho Superior da Magistratura deu conta à imprensa de que, afinal, o parecer em causa foi remetido à Assembleia da República “por lapso” e não passa de um “mero documento de trabalho”.

“Por lapso, foi remetido à Assembleia da República o documento hoje divulgado pela comunicação social, o qual constitui mero documento de trabalho elaborado pela assessoria do CSM e que será oportunamente apreciado em Conselho Plenário”, lê-se na nota.

A posição dos juízes contra o acesso das secretas aos metadados aparece expressa num parecer entregue ao Parlamento a propósito dos novos projetos de lei que estão a ser debatidos e que reúnem, à partida, consenso entre o PS, o PSD e o CDS. No último debate sobre o tema, na quarta-feira, o Bloco de Esquerda, ciente de que o diploma do Governo deverá ser hoje aprovado, apelou desde logo ao Presidente da República para que pedisse a fiscalização preventiva do texto, antes de o promulgar. “Confiamos que entidades com competência para suscitar a fiscalização preventiva o façam. Este diploma está ferido de inconstitucionalidade”, disse José Manuel Pureza.

Antes, a ministra da Administração Interna tinha procurado sustentar que a proposta do Governo “respeitava os princípios constitucionais da proporcionalidade, da adequação e da necessidade”, e que conciliava “os direitos fundamentais da segurança e o direito ao sigilo das comunicações”. Mas para o BE e o PCP a Polícia Judiciária já pode aceder a comunicações deste tipo desde que o faça no âmbito de processo criminal, e isso basta.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Agora, no parecer entregue ao Parlamento, o Conselho Superior de Magistratura dá razão à esquerda parlamentar, recordando que em 2015 o Governo já tentou uma lei semelhante, para permitir o acesso dos serviços de informações aos metadados, mas foi considerado inconstitucional. Isto porque, explica o documento, a Constituição proíbe a “ingerência” das autoridades públicas nas comunicações “salvo nos casos previstos na lei em matéria de processo criminal”.

Na altura, o Governo de Passos Coelho tentou contornar a questão com a criação de uma comissão administrativa composta por juízes do Supremo Tribunal de Justiça, cabendo a essa comissão autorizar ou negar o acessos dos metadados aos serviços de informações, consoante os casos específicos. Agora, a proposta de lei do Governo, assim como o projeto do CDS, prevê a criação, no âmbito do Supremo, de uma secção de juízes a quem caberia autorizar o acesso daqueles dados. Mas, para os magistrados, isso não chega. “Não tem a virtualidade de atribuir natureza procedimental penal à atuação” dos serviços de informações, dizem. Ou seja, não contorna o âmbito não-criminal da questão. Só as polícias e a Ministério Público têm o poder legal de fazer investigação criminal, e por isso só eles devem poder ter acesso àquele tipo de dados, equiparado a escutas telefónicas.

Ainda assim, não é certo que, caso o diploma seja aprovado no Parlamento e seja depois pedida a fiscalização preventiva da medida, o Tribunal Constitucional venha a declará-la inconstitucional. É que a interpretação da lei fundamental cabe aos juízes do Constitucional e, em 2015, a norma só foi chumbada por sete juízes, de um total de 13, e na sequência das mudanças naquele organismo quatro desses sete já não integram a equipa. Resta saber qual será a interpretação dos novos magistrados.