Portugal está “bem representado” na investigação da malária e uma vacina desenvolvida por cientistas portugueses pode até ser a primeira a ser lançada, já na próxima primavera.
A vacina contra a malária está já a ser testada em humanos, podendo ser a primeira vacina realmente eficaz a ser lançada, dentro de menos de um ano, segundo um dos investigadores, Miguel Prudêncio, que diz que o país tem especialistas reconhecidos mundialmente e está bem representado na comunidade de investigação.
A vacina foi criada por uma equipa do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa (IMM), mas a doença e formas de a evitar e tratar estão a ser estudadas por outras entidades portuguesas, como o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), a Universidade do Minho ou o Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica.
Para já, como diz à Lusa o líder da equipa de investigadores do IMM, Miguel Prudêncio, os voluntários (na Holanda) estão a ser expostos a doses crescentes da vacina e nas duas primeiras fases “não há efeitos adversos”.
Otimista mas cauteloso, Miguel Prudêncio diz que já era bom uma proteção em metade dos voluntários. “Temos de ser realistas, não quero dizer às pessoas que temos uma solução milagrosa”, diz, lembrando que “há vacinas em fases mais avançadas” e que “é possível que outras se revelem mais eficazes antes” da vacina do IMM.
A malária, doença transmitida pela picada de mosquito, matou quase meio milhão de pessoas em África em 2015, segundo a Organização Mundial de Saúde.
No entanto nos últimos dois anos têm sido muitos os avanços na investigação que se faz no combate à doença.
Cientistas da Universidade de Maryland, Estados Unidos, fizeram em 2016 os primeiros testes de uma vacina, enquanto em Cambridge, no Reino Unido, se anunciava uma técnica para prevenir a infeção através de transfusões de sangue.
Também no Reino Unido o Instituto Wellcome Trust Sanger anunciava no início deste ano que a combinação de duas proteínas do parasita da malária podia servir de base para uma vacina eficaz, e uma empresa norte-americana dizia ter criado uma vacina com proteção total durante 10 semanas.
Novidades têm surgido de todo o mundo, como um novo medicamento descoberto pela Universidade da Cidade do Cabo, África do Sul, uma vacina para crianças desenvolvida por uma farmacêutica britânica, ou a modelação completa do metabolismo do parasita (para ajudar na criação de novas terapias), feita na Suíça.
Em Portugal vão testar-se medicamentos num modelo de fígado humano infetado, o IGC recebeu financiamento, através da Fundação Bill e Melinda Gates, para investigar uma molécula do parasita e a universidade do Minho juntou-se à de Columbia (EUA) para estudar as mutações genéticas do parasita e anunciou que as hexahidroquinolinas, usadas em fármacos para tratamento da malária, contribuem para o bloqueio da doença, ao matarem também o parasita responsável pela sua transmissão.
E enquanto o IMM descobria um mecanismo para o parasita ficar vulnerável à toxicidade do ferro o IHMT criava o primeiro insectário de alta segurança da Península Ibérica, que permite infetar mosquitos com malária humana sem risco para os cientistas ou o ambiente.
Henrique Silveira, subdiretor do IHMT, explica à Lusa que investigadores do instituto estudam a resistência antimalárica, a transmissão da doença, ou a interação entre o parasita e o mosquito, para entender como é que este consegue atuar contra a infeção.
“O objetivo é arranjar ferramentas que possam ser utilizadas como bloqueadores de transmissão”, afirma o responsável, lembrando a colaboração com o IGC na produção de uma vacina, ou outro projeto ainda, este também financiado pela Fundação Bill e Melinda Gates, para encontrar um tipo de alimentação para o mosquito que não o sangue (que é fundamental para a produção de ovos).
A luta contra a malária é “muito competitiva” e há “muito para fazer”, diz Henrique Silveira, acrescentando que foi uma área esquecida durante algum tempo e que ganhou nova dinâmica com o investimento da Fundação Gates.
Miguel Prudêncio também salienta o aumento da investigação a nível mundial, que aconteceu da mesma forma mas não especialmente em Portugal. “Aconteceu globalmente”.
Henrique Silveira não pensa muito diferente. O aumento da investigação portuguesa na área da malária existe e faz parte “do ressurgimento da ciência portuguesa”, porque hoje “há mais investigadores portugueses a trabalhar em quase todos os lados”.
Em 2015 houve 214 milhões de casos de malária. Morreram 438.000 pessoas.