Rui Rio é oficialmente candidato à liderança do PSD e foi a Aveiro explicar as suas razões e motivações. Numa intervenção lida, de cerca de 20 minutos, sem direito a perguntas como tinha sido indicado — “os jornalistas terão três meses para fazerem as perguntas que entenderem” –, Rio garantiu estar “com os dois pés no PSD e no país”. Disse que a política em Portugal, de tão descredibilizados que estão os partidos, precisa de “um banho de ética”; agradeceu a Passos Coelho, porque a “gratidão é dos valores éticos mais relevantes da nossa convivência social”; falou aos jovens sociais-democratas e apelou a uma mudança de política no PSD. Uma mudança que, disse, passa por recentrar o partido.

Já depois da sua intervenção, Rui Rio diria uma breve frase enigmática ao Observador quando questionado sobre o seu concorrente assumido, Pedro Santana Lopes: “Quanto aos candidatos, eram dois e agora estão três, é só o que eu sei…” Rui Rio estaria a referir-se a José Eduardo Martins — segundo uma fonte próxima — que uma hora antes de ele discursar lançou um site com um manifesto com dez pontos como linhas gerais de orientação para o PSD. Mas que não surge com uma candidatura.

José Eduardo Martins lança “Manifesto PSD 2017” uma hora antes de Rio falar

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No seu discurso, o ex-presidente da câmara do Porto, foi claro na intenção de querer recentrar o partido. “Somos sociais-democratas, o PSD não é um partido da direita. O PPD de Sá Carneiro, de Francisco Pinto Balsemão e de tantos outros, com raízes profundas na nossa classe media e transversal a toda a sociedade, é um partido do centro. E o centro vai do centro-direita ao centro-esquerda, não é um partido de direita como alguns o têm tentado caracterizar. Não é nem nunca será”, disse, motivando aplausos na sala.

Não falou em pactos de regime, ou em acordos necessários à esquerda, como fez Santana Lopes no seu comentário na terça-feira à noite. Nem sequer em ideias de bloco central, que tantas vezes têm sido coladas ao ex-autarca do Porto, conhecido que é o seu bom entendimento com António Costa. Antes pelo contrário, não se poupou a indiretas a António Costa. E para os que lhe imputam essa ideia, Rio deixou claro que “o PSD é um partido de poder, não é a muleta do poder”. E mais: afirmou que o seu objetivo no partido é acabar com a “geringonça” que, “pelas contradições que em si encerra, jamais será capaz de ser o agente da mudança”. “Hoje é o princípio do fim desta coligação parlamentar que nos governa”, disse.

O alvo, depois de abater a concorrência interna, está definido. Mas, curiosamente, Rui Rio começou a sua intervenção a citar António Costa: “Na política como na vida, a palavra dada deve ser palavra honrada”, disse, depois de enumerar as duas vezes nos últimos anos em que lhe foi feito o “apelo” para avançar para a presidência do PSD, tendo das duas vezes (2008 e 2010) rejeitado. “Seria normal, no quadro de valores pelo qual se tem regido a política em Portugal, que eu tivesse aceitado perante os apoios de que dispunha”, continuou, para a seguir citar o primeiro-ministro socialista ao dizer que palavra dada deve ser palavra honrada.

Uma sala cheia de militância de cabeça grisalha

Numa sala cheia do hotel Mélia em Aveiro, onde se ouvia maioritariamente o português do norte, Rui Rio anunciou a sua candidatura. Desde presidentes da câmara que conseguiram renovar o mandato com sucesso, como o caso de Salvador Malheiro que coordena a campanha de Rio, passando por presidentes dissidentes que viram os seus municípios mudar de cor, como o caso de Rui Rocha de Ansião, em Leiria, até quem tivesse sido “esquecido” por Passos Coelho nas autárquicas, como João Barbosa de Melo, antigo presidente da câmara de Coimbra, foi com convicção que Rio anunciou que avançava para a liderança do PPD/PSD.

Outros nomes como Arménio Santos, dos Trabalhadores Sociais Democratas, ou a deputada Rubina Berardo, a madeirense deputada à Assembleia da república, juntaram-se ao composto quórum laranja que mostrou que é “hora de agir” e, como afirmou Rio, que “o PSD não é um partido de direita”. A deputada madeirense, logo após o discurso, afirmou ao Observador que, após ouvir o discurso, estava “ainda mais certa do apoio”.

Apesar de Rio querer um PSD onde todos são importantes, desde “os mais velhos pela sua experiência, pelo seu saber e pelo respeito e gratidão que nos merecem” até aos “mais jovens, pela dinâmica, pela ambição e pela criatividade que nos trazem”, na sala contavam-se mais cabelos grisalhos do que cartões jovens. Os poucos militantes que ainda estavam a engrossar a voz, levados pela distrital de Aveiro, eram empurrados para a frente para empunhar bandeiras ainda o evento não tinha começado. Mesmo com esse esforço, a multidão que assistia a Rio era claramente mais experienciada do que dinâmica, como Rio apelou.

Sem se falar de Santana Lopes e do recente anúncio da sua candidatura, todos os apoiantes pareciam recetivos a falar com a imprensa antes do início do evento, mas apenas para constatar que apoiavam o antigo presidente da câmara do Porto. Rui Rio foi perentório ao não responder a nenhuma questão dos jornalistas, como tinha avisado, mesmo com várias tentativas frustradas por parte da comunicação social. As perguntas iam sempre ao encontro do mesmo tema: a candidatura de Santana Lopes. Rio apenas sorria e mantinha o mesmo silêncio que impôs à imprensa.

Um evento que se queria para a sociedade civil, como referiu ao Observador Rui Rocha, da distrital de Leiria, foi principalmente para militância do PPD/PSD, que entre cânticos e V’s de vitória, nesta apresentação, apoia incondicionalmente Rui Rio. Com a presença de vários rostos de algumas distritais importantes em termos de votos, o habitual caciquismo inerente à estruturas do partido foi desvalorizado por Salvador Malheiro, em conversa com o Observador. Quanto a isso: “é muito menor”, disse, depois de ter elogiado Rio como “um homem do centro-esquerda”. Já Rui Rocha, outro apoiante que fez questão de chegar cedo limitou-se a dizer: “Faremos o que for legal” no processo de convencimento para amealhar votos.

No dia em que fez a apresentação oficial da sua candidatura, Rui Rio pode dizer que conta já com o apoio de algumas distritais de peso. Guarda, Leiria, Aveiro, Portalegre, Vila Real, Viana do Castelo e Bragança é a informação que na comitiva é dada como territórios já seguros. Entre representantes das várias distritais e autarquias que já deram sinais de apoio ao ex-autarca do Porto, até Álvaro Amaro, presidente da câmara da Guarda, quis estar presente mesmo depois de, há poucos dias, ter sido ferido com um tiro enquanto caçava. “Não quis deixar de vir dar o meio apoio”, disse ao Observador.