O vice-presidente da Comissão Europeia Jyrki Katainen garante que o encontro que teve com Durão Barroso, representante do Goldman Sachs, foi um momento entre amigos e que não houve qualquer tentativa de fazer lóbi por parte do português. “Somos amigos, conhecemo-nos há anos. Encontro-me sempre com os meus amigos, sejam eles quem forem”, garantiu o comissário finlandês ao EU Observer, o site que noticiou inicialmente o encontro, esta terça-feira.

O jornal, que acompanha a política europeia, começou por noticiar esta manhã que Katainen e Barroso se encontraram em outubro de 2017, no Silken Berlaymont Hotel em Bruxelas, para discutirem “sobretudo assuntos de comércio e defesa”, como foi confirmado por escrito pelo próprio Katainen ao Corporate Europe Observatory (organização sem fins lucrativos cujo objetivo é expor, precisamente, os efeitos do lóbi corporativo nas decisões europeias) e como consta do registo público das reuniões do vice-presidente europeu. O facto de a reunião ter sido registada como tendo sido com um “representante do Goldman Sachs” levou o jornal a noticiar que esta teria sido uma reunião profissional, onde Barroso fez lóbi em nome do Goldman Sachs junto da Comissão.

“Injustiçado”. A reação às acusações de que Durão fez lóbi pelo Goldman Sachs

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Depois de uma fonte próxima de Durão Barroso ter garantido ao Observador que tudo não passava de “uma invenção” e que se tratava de uma “sacanice”, Katainen acabou por dizer ao EU Observer horas depois que a reunião foi pessoal e não passou de um encontro de amigos. O comissário europeu diz que já andava para contactar Barroso há algum tempo e…

“Ele parece que leu os meus pensamentos e ligou-me ou mandou-me uma mensagem. ‘Estás por Bruxelas? Vamos tomar um café’. E eu propus: vamos antes beber uma cerveja.”

Katainen, que foi primeiro-ministro da Finlândia de 2011 a 2014, conheceu Barroso nos corredores de Bruxelas, quando o português era presidente da Comissão Europeia. O finlandês acabou por servir como comissário das questões económicas de 2014 em diante, passando a vice-presidente com a presidência de Jean-Claude Juncker. Ao EU Observer, garantiu não ter havido qualquer tipo de tentativa de influência política no encontro com o amigo: “Se alguém estava a fazer lóbi, era eu. Estava a contar-lhe sobre a nossa ambiciosa agenda para o comércio e para a defesa.”

O encontro entre os dois só foi acrescentado ao registo oficial de Katainen depois de o jornal Político ter dado conta dessa reunião. Depois de revelada essa informação, o encontro foi acrescentado ao registo do comissário, mas omitindo sempre o nome de Durão Barroso.

Agora, ao prestar esclarecimentos, Katainen assegura que pediu à sua equipa que registasse o encontro, por uma questão de transparência, mas admite agora que o registo deveria dizer “encontro com Durão Barroso” e não com “o Goldman Sachs”. “Ao dizer ‘Goldman Sachs’, indica que o Goldman Sachs, enquanto banco, tinha algo a dizer-me. Não foi o caso”, declara. “Sou a favor da total transparência.”

O próprio Goldman Sachs também reagiu entretanto. Em comunicado, o banco declara que desde que começou a trabalhar com o Goldman Sachs, Barroso “recusou representar a firma em quaisquer interações com representantes da UE”, sublinhando que qualquer reunião com pessoas que ocupem tais cargos “são tidas a título pessoal, e referentes a uma longa carreira de serviço público”.

Aliança para a Transparência do Lóbi faz queixa de Barroso

Entretanto, a Aliança para a Transparência do Lóbi e a Regulação Ética (ALTER-EU), coligação de agências não-governamentais dedicadas à transparência, apresentou uma queixa junto da Comissão Europeia, numa carta enviada ao secretário-geral da Comissão Europeia, Alexander Italianer, onde pede uma reavaliação das atividades do seu antigo presidente no Goldman Sachs.

Quando assumiu o cargo no Goldman Sachs International, e depois da controvérsia causada pelas suas novas funções, Barroso escreveu uma carta a Jean-Claude Juncker garantindo que não iria fazer lóbi pelo gigante norte-americano. “Não fui contratado para fazer lóbi em nome do Goldman Sachs e não tenciono fazê-lo“, escreveu na altura.

Esse compromisso foi uma das razões para o comité de ética ‘ad hoc’ da Comissão Europeia ter concluído, no mês seguinte, que o antigo presidente do executivo comunitário não violou as regras dos Tratados, ao cumprir o dever de integridade e discrição. Em 31 de outubro de 2016, o comité de ética ad hoc da Comissão Europeia concluiu que o antigo presidente Durão Barroso não violou as regras dos Tratados ao aceitar o cargo de presidente não-executivo da Goldman Sachs, ainda que tenha demonstrado falta de “sensatez”, recorda a Agência Lusa.

Em resposta ao requerimento de Juncker, que em setembro solicitou um parecer relativamente à designação do seu antecessor para o cargo de presidente não-executivo do banco de investimento norte-americano, o comité de ética considerava no eu parecer que Barroso não demonstrara “a sensatez que se poderia esperar de alguém que ocupou o cargo de presidente durante tantos anos”, mas, ainda assim, as novas funções não violavam “o seu dever de integridade e discrição”.

O comité de ética sublinhava então na sua opinião o compromisso assumido por Durão Barroso de não desempenhar o papel de “representante de interesses” (lobista) do Goldman Sachs, considerando que o mesmo responde ao dever de integridade e discrição imposto pelo Tratado.

Em conferência de imprensa, o porta-voz da Comissão, Margaritis Schinas, afirmou que o vice-presidente da Comissão “seguiu religiosamente os parâmetros de legalidade aplicáveis”, ao registar a reunião e que encontro entre Barroso e Katainen aconteceu fora do edifício da Comissão Europeia e 36 meses depois da saída do ex-primeiro-ministro português da presidência da Comissão Europeia, quando o “período de nojo” estipula apenas 18 meses.