Isabel Meirelles, uma das vice-presidentes de Rui Rio no PSD, participou na reunião do Conselho Geral da Ordem dos Advogados em que foi aprovada, por unanimidade, uma auditoria externa à gestão da antiga bastonária, Elina Fraga. A ata, publicada no site da Ordem dos Advogados (OA), confirma que Isabel Meirelles esteve nessa reunião — a segunda do mandato do atual bastonário, a 20 de janeiro de 2017 — mas a advogada e vice-presidente do PSD confessa ao Observador que “não se lembra” de ter participado e que, no máximo, poderá “ter passado por lá brevemente“. Elina Fraga, colega de direção de Isabel Meirelles, tem associado o pedido de auditoria a uma perseguição do atual bastonário, Guilherme Figueiredo. A decisão foi, no entanto, tomada num órgão colegial, no qual participou a sua nova colega na direção do PSD.

A advogada, que fez parte da lista ao Conselho Geral de Guilherme Figueiredo, que não se recorda de “ter discutido qualquer auditoria“, até porque “por motivos de saúde” pediu “escusa logo na primeira reunião“. Ora, esta decisão foi tomada na segunda reunião, onde Isabel Meirelles admite, no máximo, ter “passado” para se “despedir dos colegas”. Além disso, já não esteve na terceira reunião, onde foi aprovada a ata anterior, não podendo, por isso, ser responsável por eventuais erros que a mesma possa ter.

No entanto, Isabel Meirelles confessa ao Observador que é normal uma nova gestão, quando entra, “pedir uma auditoria”, já que é “uma forma de se defender”. A vice-presidente do PSD lembra que ela própria o decidiu fazer quando foi presidente da Comissão Instaladora da Agência para a Qualidade e Segurança Alimentar (a antecessora da ASAE). A ata — que está há quase um ano online — é clara quanto à presença de Isabel Meirelles:

Excerto da ata de 20 de janeiro de 2017, a segunda reunião do bastonada de Guilherme Figueiredo.

A ata é igualmente clara quanto à aprovação de uma auditoria à gestão da anterior bastonária:

Excertos da ata de 20 de janeiro de 2017, a segunda reunião do bastonada de Guilherme Figueiredo.

Embora na ata não esteja expressa a votação, o Observador apurou que foi aprovada por unanimidade pelos 17 membros presentes, que são apresentou no documento pela seguinte ordem: Guilherme Figueiredo, Ricardo Brazete, Miguel Cardoso Matias, Manuel Guerra Henriques, Rui Assis, Ana Rita Duarte Campos, Isabel Cunha Gil, Isabel Meirelles, Isilda Alves, Ivone Pita Soares, Jorge Manuel Pote, Pedro Botelho Gomes, Pedro Cabeça, Regina Franco de Sousa, Rita Branco e Silva Cordeiro.

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Na conferência de imprensa de terça-feira, na sede nacional do PSD, Elina Fraga sugeriu que a auditoria que lhe foi feita faz parte da guerra com o seu antigo adversário e atual bastonário: “Em relação à auditoria da OA tem de ser situada numa luta que existiu na OA, que teve a ver com as próprias eleições. Um luta que foi intensa. Eleição que ganhei à primeira volta e perco segunda volta quando todas as listas se unem à volta do candidato que venceu.”

Entretanto, Isabel Meirelles já não faz parte do Conselho Geral da Ordem em novembro de 2017, quando aquele órgão decidiu enviar — mesmo com o voto contra do bastonário Guilherme Figueiredo — as conclusões da auditoria para a Procuradoria-Geral da República, Isabel Meirelles já não era um dos membros.

A polémica auditoria

Foram vários os problemas apontados à sua gestão à frente da Ordem dos Advogados numa auditoria financeira conhecida recentemente. Alegadas violações dos estatutos e do Código de Contratação Pública, descontrolo orçamental e contratação de serviços a amigos foram algumas das conclusões de uma auditoria. As conclusões foram mesmo enviadas — em novembro de 2017 e por decisão do Conselho Geral da Ordem dos Advogados — para a Procuradoria-Geral da República e para o Tribunal de Contas.

A auditoria feita pela consultora PKF & Associados, encomendada pelo atual bastonário e sucessor de Fraga, Guilherme Figueiredo, detetou várias irregularidades de gestão. Um dos problemas, segundo o documento — noticiado pelo Público em novembro de 2017 — era precisamente o facto de 98% dos montantes pagos por serviços jurídicos entre 2014 e 2016 terem sido adjudicados a apenas cinco sociedades de advogados e ascenderem aos 525 mil euros. Fechando ainda mais o ângulo, 84% deste valor, em contas feitas pelo Eco também em novembro, foi pago a apenas três advogados. Um deles era o antigo patrono de Elina Fraga, Adérito Ferro Pires, e dois membros do Conselho Geral da Ordem.

Salvador Malheiro e Elina Fraga. Os dois problemas de Rui Rio

Só o patrono de Elina, Ferro Pires, ganhou em contratos com a Ordem dos Advogados, segundo a mesma auditoria, 187 mil euros. A escolha podia, no entanto, não depender de Elina Fraga. Mas dependeu e, também nisso, a auditoria é clara: “A seleção do advogado ou da sociedade de advogados e a negociação dos honorários era realizada diretamente pelo bastonário”. Na conferência de imprensa de terça-feira, Elina Fraga respondeu dizendo que o “patrono” é simplesmente quem “patrocinou” o seu estágio quando era advogada-estagiária, acrescentando que “não é filho, não é tio, nem cunhado”. E destacou ainda que isso se passou há 21 anos e que “a confiança que ele mereceu, é a mesma que está a merecer do atual bastonário”. Acrescentou ainda, sobre os dois membros do Conselho Geral, que “prestaram serviços fora das suas funções, por razões que tem a ver com sigilo profissional não poderiam ser prestadas por outras pessoas.”

Numa investigação às contas da própria bastonária, também foi encontrada “alguma inconsistência” em despesas de deslocações apresentadas por Elina Fraga. Essa inconsistência, diz a consultora, está relacionada com os “locais de partida” dados na justificação das despesas. A maioria das deslocações da bastonária eram entre Lisboa e Mirandela e Mirandela e Lisboa. Elina Fraga é de Valpaços, mas tem escritório em Mirandela. Foi ao município de Mirandela que foi, aliás, candidata pelo PSD na lista de vereação nas autárquicas de 2005. Na conferência de imprensa, Elina Fraga explicou que se partisse de Valpaços, onde reside, ainda iria fazer “mais 15 quilómetros” do que ao partir de Mirandela. Ou seja: a antiga bastonária alega que ainda poupou dinheiro à Ordem dos Advogados.

Outra das críticas a Elina Fraga foi precisamente quanto ao salário auferido. Marinho e Pinto, o seu antecessor e “mentor” na OA recebia 7.780 euros mensais, o salário de Elina Fraga passou a ser de 8.730 euros por mês.

Elina Fraga começou por pedir ao jornalistas que não falassem de “desvio” da sua gestão sem acrescentar a palavra “orçamental”, já que o que está em causa não são “desvios de dinheiro”, mas sim um “desvio orçamental” que resulta de atividades extra da ordem, como as “comemorações dos 90 anos da OA” ou a “aposta séria no combate à procuradoria ilícita”.

Rui Rio prometeu “todas, todas, todas” as perguntas. Elina Fraga não cumpriu: só respondeu a quatro