910kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Luís Marques Mendes, a discursar em 1975, apelando ao voto antes de poder votar. Tinha 17 anos. Por detrás do palanque tinha calças à boca de sino
i

Luís Marques Mendes, a discursar em 1975, apelando ao voto antes de poder votar. Tinha 17 anos. Por detrás do palanque tinha calças à boca de sino

D.R.

Luís Marques Mendes, a discursar em 1975, apelando ao voto antes de poder votar. Tinha 17 anos. Por detrás do palanque tinha calças à boca de sino

D.R.

Marques Mendes: “Digo com mágoa: não vi os meus filhos crescer"

Luís Marques Mendes, 58 anos, é um dos políticos com mais tempo no poder em democracia. Diz que daqui a oito anos pode "pensar" nas presidenciais. É "viciado em política". Leia a entrevista de vida.

    Índice

    Índice

Luís Marques Mendes é um dos homens que mais tempo passou em funções governativas. Aos 58 anos, dois dias antes de ir de férias, aceitou falar ao Observador da sua vida e das suas memórias políticas. Faz 59 no dia 5 de setembro. A conversa de duas horas, realizada no escritório da Abreu Advogados, onde é consultor, foi feita numa sala com vista para a sede do PCP na Soeiro Pereira Gomes. Numa entrevista de vida onde faz algumas revelações, Marques Mendes admite que entrar para o Governo aos 28 anos o impediu de ver os dois filhos mais velhos crescer (o terceiro já nasceu no fim do cavaquismo). Também confessa que a sua imagem nos Governos de Cavaco Silva era “péssima”, uma espécie de “Yes Minister”.

Mesmo no fim (na última pergunta), assume que daqui a oito anos, quando Marcelo Rebelo de Sousa entrar na reta final do seu (eventual) segundo mandato, pode “pensar” nas eleições presidenciais. É um “viciado em política”. Conta que começou no Governo minoritário de Cavaco Silva, em 1985, e depois de duas recusas, com “um medo louco”. Reconhece que já recusou empregos “incompatíveis com os comentários” políticos que agora faz na SIC, mas recusa dizer de onde surgiram.

Marques Mendes recorda como começou no PREC, a discursar pelo PPD com longos cabelos e calças à boca sino, lembra as conspirações para Cavaco chegar ao poder e diz que era um atrasado crónico nos Conselhos de Ministros. Conta como se relacionou com Marcelo Rebelo de Sousa, critica o amigo Passos Coelho e fala da influência do pai e da mãe. Leia esta longa e rara entrevista de vida.

O jovem Luís dos cabelos compridos que saneou o diretor do liceu

É das pessoas que, durante a democracia, esteve mais anos no Governo em Portugal. A política vicia?
Talvez a uns mais que a outros, mas não deixa de ter alguma componente de vício. As pessoas habituam-se a um conjunto de comportamentos e até mordomias. Vi muita gente que depois teve muitíssima dificuldade em cortar. Nunca foi, felizmente, o meu caso, porque cortei várias vezes. Pouca gente se recorda, mas fui, por exemplo, líder parlamentar [1996-99], eleito pelos seus pares como o melhor líder parlamentar da legislatura. Toda a gente me pedia para ficar, mas saí. Também saí da liderança do partido, depois de uma derrota eleitoral autárquica em Lisboa, em que decidi pôr a minha liderança em xeque. Mas há pessoas que têm dificuldade em fazer um corte…

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Há duas formas de colocar a questão: se o poder vicia e sentiu isso; e depois há o lado de ser tão viciado que nunca consegue desligar dessa realidade.
As hipóteses que coloca são todas possíveis na vida política. No meu caso, acho que só se aplica a segunda hipótese: sou, com cargos ou sem cargos, um viciado em política. Não é na política, mas em política. Continuo a gostar de uma boa discussão política, de uma tertúlia política, gosto de emitir opinião. Nesse sentido geral, sou viciado em política.

Há pessoas que fazem essa autocrítica, de assumirem que a certa altura estavam viciados no poder.
Isso comigo nunca aconteceu porque tenho “n” exemplos ao logo da minha vida de tomar a iniciativa de sair. De uma forma geral, toda a gente se acotovela para entrar, e tomei várias vezes a iniciativa de sair. Depois, há outra parte: há o vício que conduz a atitudes condenáveis como a corrupção e outros. Mas de um modo geral, no que se me aplica, sou um animal político, no sentido que, estando fora ou dentro, gosto de política. E hoje devo dizer que não tenho nenhuma saudade de cargos políticos. Gosto de fazer, de vez em quando, uma participação, ainda que curta, numa campanha eleitoral. Sempre adorei campanhas eleitorais e continuo a gostar imenso, sobretudo na componente do contacto popular.

“Com cargos ou sem cargos, um viciado em política. Não é na política, mas em política. Continuo a gostar de uma boa discussão política, de uma tertúlia política, gosto de emitir opinião. Nesse sentido geral, sou viciado em política."

Quem acompanha as campanhas, como um jornalista político, pensa como é que é possível aguentar aquilo. Como se aguenta um ritmo daqueles?
Quem corre por gosto não cansa. É preciso gostar-se para não se sentir cansado e saturado com uma campanha eleitoral. Vou dar um exemplo: sempre fui bastante influenciado na vida política pelo meu pai. Já antes do 25 de abril se respirava e falava de política em casa e isso influenciou-me muito. Todavia, há desde logo uma diferença essencial. O meu pai não gostava de fazer campanhas eleitorais. Era a parte que ele menos apreciava na política. Preferia o trabalho de gabinete. Apesar de influenciado para a vida política por ele, toda a vida fui exatamente ao contrário.

Quando é que o seu pai o começa a influenciar politicamente?
O meu pai foi um grande advogado durante muitos anos e, ao mesmo tempo, também teve uma carreira política longa: já fazia vida política antes do 25 de abril. Naquele período, que antecede o 25 de abril, em que eu próprio estou a acabar o liceu, o meu pai tem conversas sobre política. Recordo sobretudo as centradas na ala liberal da Assembleia Nacional (Sá Carneiro, Miller Guerra, Balsemão, Magalhães Mota). Lembro-me de um livro que corria lá por casa, que era sobre Sá Carneiro: ser ou não ser deputado, e a renúncia dele ao cargo de deputado na antiga Assembleia Nacional. Tudo isso teve uma influência grande. Tive sempre uma ligação afetiva muito forte com o meu pai, por um lado, e depois o exemplo dele condicionou-me positivamente. Acho que fui advogado por causa do meu pai e, em grande medida, fui político por causa do meu pai.

"O cabelo comprido era o que se usava na altura, de resto havia duas coisas que se usavam muito em 75: o cabelo compridíssimo e as chamadas calças à boca de sino. Também usava."

A seguir ao 25 de abril, aquela fotografia do jovem Luís Marques Mendes com cabelo comprido, era uma imagem que as pessoas não associam ao ar certinho e engravatado. Quem era o Marques Mendes revolucionário?
Sempre fui bastante menos certinho do que aquilo que se convencionou. O cabelo comprido era o que se usava na altura. De resto, havia duas coisas que se usavam muito em 1975: o cabelo compridíssimo e as chamadas calças à boca de sino. Também usava. No resto estou igual: já era pequenino à época e continuo hoje. Não há aí diferenças substantivas.

Não cresceu com a política.
Não, pelo contrário. Até há quem diga que a política desgasta e que sou um exemplo disso. Mas voltando à parte séria: usava-se cabelo comprido e usava-o assim, nesses tempos em que fazia intervenção política pelo PPD. Essa fotografia tem essa curiosidade, dos comícios que andava a fazer. Mas a maior é que nessa altura fazia comícios a apelar ao voto quando não tinha idade de votar. Só votei nas eleições de 1976. Nas de 1975 participei em campanhas, falava em nome da JSD.

"Não sei, um dia daqui a oito anos talvez pense nisso [na presidência da República]. O Presidente em princípio faz 10 anos e, portanto, começa-se a pensar nisso dois anos antes. Um dia poderei pensar nisso, apenas e só. Não mais que isso. Não está nos meus horizontes." 

Era o quê? Líder da JSD de Fafe?
Não, era uma espécie de coordenador. As coisas não eram muito formais. Era uma espécie de coordenador da JSD no distrito de Braga. Portanto, nos concelhos do distrito de Braga, fazia esse tipo de intervenções.

Nessa época, os partidos eram mais à esquerda do que são hoje e no distrito de Braga havia um contexto específico, tendencialmente mais à direita e com lutas muito fortes com o PCP.
Era um distrito sui generis, porque tem um setor muito conservador e depois porque tinha uma forte implantação de movimentos de extrema-esquerda. Não era só o PCP. A FEC-ML [Frente Eleitoral Comunista – Marxista Leninista] tinha uma grande presença em Braga e comícios muito aguerridos.

Andou à pancada?
Não, à pancada não andei, mas tive comícios interrompidos porque tudo começou à pancada. O distrito de Braga foi, nesse plano, muito violento. A política, na época, estava muitíssimo mais à esquerda do que hoje: o PSD falava de socialismo democrático, e da social-democracia como via para o socialismo.

E em autogestão de empresas e coisas desse género…
Era sobretudo a componente da “cogestão” no nosso programa, mas também havia afloramentos de autogestão. Mas era o período em que todos nos batíamos para que o PSD entrasse na Internacional Socialista, coisa que nunca conseguimos alcançar porque o PS e Mário Soares vetaram sempre.

O que dizia nos comícios? Coisas de esquerda?
Tentava dizer as coisas certas e relativamente sensatas, mas tudo aquilo era uma novidade.

Era um miúdo.
Tive a grande vantagem de poder participar em cursos de formação política quer cá dentro quer no estrangeiro. O PSD facultou muito isso.

“Um dia [a minha mãe] disse-me: 'Tu tens de falar sem papel, tens de falar de improviso'. Porque ela ouvia as pessoas a dizer: ‘Ele fala bem, mas quem escreveu aquilo foi certamente o pai'."

Fez onde? Na Alemanha?
Sim, com a Fundação Naumann e outras. Até aos anos 80, tive esta possibilidade o que é, para um jovem daquela idade, uma mais-valia inquestionável. Tudo aquilo era uma aprendizagem. Com base nas nossas linhas programáticas, fazíamos a apologia daqueles valores. Desse tempo vem uma coisa que me marca para a vida inteira: tinha por hábito escrever os discursos — sempre gostei muito de escrever –, mas veio desse tempo ter conseguido começar a falar sem papel, de improviso. E quem teve influência nisso foi a minha mãe.

Porquê?
Como tinha orgulho no filho — ela é que diz, não sou eu — ia assistir a vários comícios, mas colocava-se no meio do povo. E um dia disse-me: “Tu tens de falar sem papel”. Porque ela ouvia as pessoas a dizer: “Ele fala bem, mas quem escreveu aquilo foi certamente o pai”. A referência era o meu pai, em toda aquela região. Eu era um ilustre desconhecido. Portanto, a minha mãe, que foi professora e é muito intuitiva, dizia: “Tens de falar sem papel, tens de falar de improviso. Que é a única forma de as pessoas acreditarem que és tu mesmo o autor daquilo que estás a dizer”. Assimilei essa recomendação, ganhei o hábito, e ainda hoje por regra fale de improviso. Só por exceção é que escrevo.

Disse que o seu pai o marcou muito do ponto de vista político e profissional. E a sua mãe? A relação era diferente?
Se tivesse conhecido o meu pai e a minha mãe, olhando para mim vê-se logo. A componente de boa disposição, de um certo espírito extrovertido, de algum sentido de humor consigo próprio — eu sou a pessoa que mais brinco com a minha estatura e acho isso divertidíssimo e não me incomoda nada quando alguém brinca com isso — este espírito devo-o à minha mãe. O meu pai era o contrário: sério, introvertido, muito racional. Tive a sorte de herdar do meu pai o lado mais racional, que tenho conciliado com uma boa disposição e um otimismo que, não sendo “irritante”, ajuda a vencer muitas dificuldades.

E em miúdo? Era um miúdo certinho? Disse que não, mas como era na escola? Andou na escola em que a sua mãe dava aulas?
Não, nunca fui aluno da minha mãe. Nem andava na escola onde ela andava aulas. Mas andei na escola da aldeia onde nasci e depois andei na escola da cidade e andei num colégio particular, que era o único de ensino secundário que havia na minha terra, em Fafe. Depois, fiz os dois últimos anos do liceu público, em Guimarães.

Era bom aluno, o filho do senhor doutor?
Fui sempre um aluno razoavelmente bom, com uma claríssima tendência para disciplinas para o lado das letras e menos ligado à Matemática. No antigo 6º e 7º ano, tinha Latim, que era obrigatório para Direito. Gostei sempre muito de Latim, e tive média de 19. Há até quem diga que só não tinha 20 porque de vez em quando chegava atrasado às aulas e tinha de ser penalizado. Mas o professor dizia sempre que o Latim era a Matemática das letras. Quem tivesse queda para a Matemática, tinha para o Latim e vice-versa. Eu dizia que era uma exceção. Era um grande aluno a Latim e a Matemática, não sendo mau aluno, não tinha o brilhantismo que tinha a Latim. Mas de modo geral fui sempre bom aluno.

Como é que era como jovem? Era certinho ou não?
Não sei se era assim tão certinho. Fazia muito desporto…

Não jogava basquete…
Não, a estatura não me permitiu isso… Mas joguei futebol e andebol federado. Fui guarda-redes de futebol e fui guarda-redes de andebol. Ocupava muito dos meus tempos livres com o desporto e o cinema. Hoje tenho imensa pena de não ir tanto à sala de cinema quanto gostaria. Sobretudo em Guimarães, que era o centro da região. Eram coisas normais. Depois, a faculdade foi diferente: já a faço em regime de estudante-trabalhador.

marques mendes,

Luís Marques Mendes confessa que Fidel Castro o fascina (ver vídeo das fotografias no início da entrevista). Conversou com o líder cubano, no gabinete dele, durante uma visita como deputado em 2001: “Foi das personalidades que exerceu sobre mim maior fascínio e das mais charmosas e talentosas que conheci.”

Não fez a vida normal do estudante universitário.
Praticamente só ia a Coimbra para fazer frequências ou exames. Não estava lá em permanência, porque estava a exercer cargos políticos: ou no Governo Civil de Braga ou na Câmara de Fafe. Fui fazendo o curso ao mesmo tempo, mas consegui fazê-lo sem chumbar um único ano, conciliando uma coisa e outra. Foi talvez dos conflitos mais saudáveis (de dois ou três) que tive com o meu pai. Ele foi sempre contra a ideia de acumular o curso com a vida política. E eu, que gostava muito de política, aceitei o convite do engenheiro Eurico de Melo para ser adjunto dele [no Governo Civil]. Ao fim de um ano, tive o convite para ser número dois da Câmara de Fafe. Quis provar a mim próprio que era capaz de fazer uma coisa e outra. Tive tempo para estudar sem chumbar, para exercer os cargos que exerci — modéstia à parte, acho que não exerci mal –, tive tempo para namorar, tive tempo para fazer o que um jovem faz.

Já conhecia a sua mulher nesta altura?
Sim. Começámos a namorar logo ali no 25 de abril, pouco tempo depois. Estudávamos ambos no liceu em Guimarães, conhecemo-nos aí, e, dois três meses depois da Revolução, começámos a namorar. Um produto da era da liberdade.

O que fez sanear o então reitor do liceu?
Achávamos que era alguém ligado ao regime anterior e que tinha de sair. O reitor, por quem hoje tenho uma enorme estima — e que tem uma enorme qualidade intelectual –, era na altura deputado da Assembleia Nacional. Achávamos que era preciso dar um outro rumo àquela escola. Por isso, participei nesse processo revolucionário. São as coisas que se fazem. Fiz aquilo que imensa gente fez nessa ocasião, a única que não fiz foi começar na extrema-esquerda e acabar na extrema-direita. Nisso mantive-me mais ou menos sempre no mesmo sítio.

Acompanhou o processo de saída do seu pai do PSD, com as Opções Inadiáveis, uma visão pela esquerda contra Sá Carneiro. Esteve de acordo com ele? Ou concordava mais com Sá Carneiro do que com o seu pai?
Aí tivemos uma divergência. De resto, não foi a única. Eu era presidente da Concelhia de Fafe do PSD e fui muito crítico de todos os que tomaram essa decisão. Eram duas visões de natureza estratégica relativamente à forma de exercício do poder, que nada tinham a ver com esquerda ou direita. Pouco tempo depois, parte deles voltou ao partido. Estava muito mais do lado de Sá Carneiro. Estive do lado contrário ao meu pai e só fiquei satisfeito quando, dois anos depois, ele reconsiderou e voltou.

Negar Cavaco duas vezes e aceitar só à terceira

A sua imagem, justa ou injustamente, é de uma pessoa unidimensional. Para além da política, o que é a sua vida?
É normal, porque fiz muitos anos de vida política consecutiva. Só no plano nacional fiz 22 anos de vida política nacional consecutiva. Mas antes de ser uma figura conhecida, fiz a minha vida profissional. Fui advogado antes de ser secretário de Estado, deputado, ministro e essas coisas todas. O meu pai sempre achou interessante a ideia de eu fazer vida política, mas sempre me chamou à atenção que era muito importante na retaguarda ter uma profissão. A única coisa que nos permite na vida política sermos independentes, pensar pela nossa cabeça, dizer “não” ao chefe quando se entende, é ter a retaguarda de ter uma profissão. E vi tanta gente na vida política que tinha de atuar de forma oposta porque nunca cuidou a montante de ter uma profissão. E se acho isso importante no passado, acho cada vez mais importante no presente e no futuro. Conheço muito boa gente na vida política que é de uma qualidade intelectual invulgar, grande cultura geral e política, com intuição, mas em que muitas vezes falta a coragem de dizer “não”. E isso vem dessa independência de uma pessoa poder dizer: hoje estou e amanhã não estou. Por isso comecei a fazer a minha vida profissional e só por um acaso é que no final de 1985, um convite do professor Cavaco Silva, me faz mudar de vida.

"Pedi umas horas para pensar, mas respondi [a Cavaco] dizendo que não podia [aceitar o convite para secretário de Estado]. Para minha surpresa, ele insiste e eu peço mais um dia para pensar. Volto a dizer-lhe que não. Ele colocou aquele ar hirto e perguntou-me se tinha alguma coisa contra ele."

O seu pai também era contra ir para o Governo aos 28 anos…
No primeiro momento não reagiu bem. Recusei a primeira vez. Fui convidado a segunda e voltei a recusar. Só à terceira é que aceitei. E já era com Cavaco Silva, que não é propriamente um exemplo de uma pessoa muito flexível. Tinha de fazer uma mudança de vida radical. Para já, é preciso situar no tempo. Estamos a falar no fim de 1985. Vivia no Norte, e era uma mudança radical de vida em dois planos: deixar de viver no Norte para viver em Lisboa, deixar a advocacia para fazer política a tempo inteiro.

Foi diretamente Cavaco Silva que o convidou?
Foi. Não faço ideia se o Eurico de Melo teve alguma sugestão nesse sentido, mas julgo que não. Foi diretamente o professor Cavaco Silva.

Como é que ele chega a si?
Eu já fazia parte da Comissão Política Nacional dele. Isto foi poucos meses depois do congresso da Figueira da Foz, em que houve a rutura do Bloco Central, eleições antecipadas e a vitória de Cavaco Silva com uma maioria relativa. Na Figueira da Foz entrei para a Comissão Política Nacional. Aí sim, entrei sob influência de duas pessoas com quem tinha trabalhado: Eurico de Melo e Alberto Ribeiro da Silva. Trabalhei com os dois no Governo Civil e mais até, com Ribeiro da Silva — ainda hoje um grande amigo meu — que foi sempre muito próximo de Cavaco Silva e que me recomendou para a Comissão Política Nacional (CPN). Cavaco Silva mal me conhecia. A partir daí passou a conhecer-me, pois vinha de 15 em 15 dias às reuniões. A prova de que não me queria envolver na vida política é que fui a única pessoa da CPN que não aceitou ser candidato a deputado. Mas, depois das eleições, ele chamou-me e convidou-me.

Chamou-o a Lisboa?
Sim, coincidiu com uma reunião da CPN, e convidou-me. Fiquei surpreendidíssimo. Convidou-me para vir para o Governo, para secretário de Estado. Pedi umas horas para pensar, mas respondi dizendo que não podia. Para minha surpresa, ele insistiu e pedi mais um dia para pensar. Julgo que o surpreendi, porque pensava que eu ia dizer que sim e voltei a dizer-lhe que não. Ele colocou aquele ar hirto, de autoridade, e perguntou-me se tinha alguma coisa contra ele. Disse-lhe que não, que tinha apenas um problema de natureza pessoal, neste caso, profissional. E ele pediu-me que revisitasse essas questões, que falasse com o meu pai. O meu pai, nessa ocasião, flexibilizou a sua oposição e até me estimulou a ir para o Governo. Foi à terceira que aceitei. E só depois me disse qual era o cargo: secretário de Estado da Comunicação Social. Antes tinha-me falado de uma coisa vaga, de ligação do partido ao Governo. Secretário de Estado da Comunicação Social, no primeiro momento, foi um choque, porque todos os meus antecessores se tinham queimado. Achei que era um convite para ser rapidamente incinerado. Mas depois correu bem.

“Pecadilhos” na RTP e o poder como comentador

A RTP era sempre controlada pelos Governos. No seu caso, também se dizia que telefonava para a RTP e que fazia alinhamentos dos Telejornais. Como é que era?
Dizia-se de toda a gente. Não vou dizer que nunca falei para a RTP. Agora, houve uma mudança grande. Seguramente que todos os governantes têm nesse domínio os seus pecados ou pecadilhos.

Pode confessar os seus?
Não. Não tenho nada para confessar. Mas todos têm essa tendência, e quem disser o contrário está a fugir um bocadinho à verdade. Agora, houve uma mudança grande de atitude nessa ocasião e o mérito não é tanto meu. O professor Cavaco Silva ditou um conjunto de regras rigorosas para a generalidade dos ministros. Queria uma grande separação das águas. Ele fazia gala, mesmo em Conselho de Ministros, de dizer que esta notícia foi melhor, aquela pior. “Mas atenção: a gente pode criticar, mas respeita”. Ele fez esta pedagogia. Adorei esse período. Comecei essa experiência com um medo louco: um antecessor tinha-se demitido, uns anos antes, pois tinha tentado fazer a fusão das agências de noticias vetada pelo general Eanes. Fiz a fusão da NP com a ANOP [que dá origem à Agência Lusa]. E iniciei o processo de privatização dos jornais.

marques mendes,

Marques Mendes entrevistado por Joaquim Letria no dia da inauguração da RTP Internacional, que o ex-ministro considera ser a sua mais importante obra política

Agora está a experimentar o outro lado, como comentador. Há uma grande diferença entre o poder de influência e o poder efetivo? Discorda de Marcelo Rebelo de Sousa, que antes de ser eleito disse ter mais poder como comentador do que muitos políticos?
Claro que um comentador tem poder, mais nuns momentos que noutros. Apesar de tudo, essa ideia de que um comentador tem mais poder que um ministro…

"Não vou dizer que nunca falei para a RTP. Agora, houve uma mudança grande. Seguramente que todos os governantes têm nesse domínio os seus pecados ou pecadilhos.”

Se calhar tem mais que muitos deputados…
Os deputados, vamos ser francos: têm um poder reduzidíssimo e cada vez menos, por várias razões algumas das quais por culpa deles próprios. Mas quando se fala de poder de influência relativamente a um Governo, as coisas não se colocam nesses termos. É uma afirmação um pouco destituída de fundamento. O poder real, o poder de mudar, o poder de transformar, o poder de tomar decisões e de influenciar a vida das pessoas… Mas há ministros e ministros. Essa é outra questão.

Sente que tem esse poder de influência através do comentário?
Admito que sim, em alguns momentos. Não vou dizer que não. Julgo que é importante fazer comentários sem ter uma agenda. Se uma pessoa tiver uma agenda, as pessoas percebem perfeitamente.

No seu caso não é uma agenda, mas um estilo…
Não tenho agenda nenhuma…

Que é a dar notícias.
Não, não…

Dar noticias não lhe dá um poder reforçado?
O comentário que faço na SIC, e que já fazia na TVI24, tem essa componente. Mas não é sempre.

"Adorei esse período. Comecei essa experiência [no Governo ] com um medo louco: um antecessor tinha-se demitido, uns anos antes, que tinha tentado fazer a fusão das agências de noticias e o general Eanes."

Faz sempre esse esforço para dar a notícia.
Às vezes faço o esforço em sentido contrário, para me conter e não dar tantas notícias como as que poderia dar. Faço alguma contenção. Senão, a dada altura, habitua-se demasiado as pessoas e isso também não pode ser. O meu papel não é ser jornalista. Gosto de descodificar assuntos, apresentar aquilo a que chamo quadros informativos, que é o aprofundamento de algumas questões.

Há muitos políticos que têm o secreto desejo de ser jornalistas. Nunca teve essa tentação?
Não, e até lhe digo mais. Quando era miúdo dizia que queria ser advogado e político. E já fui.

Não queria ser bombeiro nem astronauta?
Não, não me recordo dessa parte. Mas também devo ter tido isso, aí pelos cinco anos. Mas que me recorde…

O político que não viu os filhos crescer

Que impacto é que a vida que levou na política teve na sua vida familiar, sobretudo nos seus filhos?
Para já teve um impacto profilático. Nenhum dos meus três filhos foi para a política, nem sequer lhes passa pela cabeça. Nesse plano ficaram vacinados. A vida política é muito exigente do ponto de vista do tempo, sobretudo a governativa. Costumo dizer que, mesmo um governante que não seja um grande exemplo de competência, só a dedicação que tem de ter ao cargo já merece um enorme respeito. Quem passa por essas funções sabe que é uma vida muito exigente. Não se tem fins de semana, trabalha-se 12 ou 14 horas e a família paga essa fatura.

Sentiu isso…
Extraordinária foi a minha mulher. Ela é que merece uma estátua não sou eu. Foi mãe, pai e mais sei lá o quê durante anos a fio. Digo isto sem orgulho e mesmo com alguma mágoa: não vi sobretudo os meus dois filhos mais velhos crescer. De repente, quando saio do Governo e tenho um bocadinho mais de tempo já tinham oito, nove ou 10 anos. Isto já não se recupera. Dois meses depois de entrar para o Governo, aos 28 anos, estava a nascer o meu filho mais velho. Pensava que estaria um ano e meio e três anos no Governo — que eram de curtíssima duração — e apanhei um ciclo de 10 anos. Fui das cinco pessoas que estiveram do primeiro ao último dia com Cavaco Silva no Governo.

"Digo isto sem orgulho e mesmo com alguma mágoa: não vi sobretudo os meus dois filhos mais velhos crescer."

Em relação aos seus filhos, o que é que isso lhes causou?
Não causou nada. Não foi nenhum drama, mas por causa da minha mulher. Ela supriu em grande medida a lacuna da minha ausência. Não poder ter tempo para ir à escola quando há a festa de fim de ano ou quando há a festa do Natal e noutros momentos, ela supriu tudo isto. Não mereço estátua nenhuma. Reconheço que a minha era baratinha face à minha estatura, portanto, não era um grande investimento, mas não mereço. De outra forma, os meus filhos teriam sido muito marcados negativamente. Claro que sentiram a ausência do pai, que viam muito a correr, e queixavam-se.

lmm-e-filhos-2_770x433_acf_cropped

Marques Mendes no final do cavaquismo, em meados dos anos 90, com Sofia, a mulher, e os três filhos: João Pedro, Ana e Miguel. Nasceu um em cada Governo de Cavaco Silva

O que fazem eles?
Estão todos a trabalhar. O mais velho é advogado. Isto é uma família de advogados. A minha filha que é a segunda, é educadora de infância. No início pensava em ir para Arquitetura, ainda fez um ano, e era uma belíssima aluna, mas tem uma grande queda para as crianças. O mais novo é economista e vai começar a trabalhar agora em setembro. Já acabou a licenciatura e o mestrado. Estão todos com a vida orientada. Esta já é uma fase para mim bastante mais tranquila do que foi no passado.

Os bastidores do cavaquismo e o mito da rodagem do Citroen

Acompanhou as cartas abertas de Eurico de Melo a Cavaco Silva contra Balsemão no início dos anos 80, a pedirem que se demitisse do Governo?
Acompanhei e até de muito perto, neste caso do lado de Eurico de Melo porque tive uma grande ligação a ele desde muito cedo…

Era o seu padrinho político.
Foi. Estava na JSD, e o primeiro cargo que tive foi junto dele, com 18 anos, no Governo Civil em Braga. Ficou uma grande relação pessoal, de amizade. Depois, quando fui para o Governo, não fui Secretário de Estado dele, mas continuei a manter uma grande relação.

“Não foi a rodagem do carro que fez Cavaco Silva ascender à liderança do partido. É uma imagem interessante, mas tudo isso foi meticulosamente preparado.”

Nessas cartas, pediam a demissão do Governo de Balsemão.
Estamos a falar do período de 1981-82, do Governo de Pinto Balsemão. E havia uma espécie de movimento liderado por Cavaco Silva e Eurico de Melo, que era minoritário…

Apoiado na distrital de Lisboa por Santana Lopes e Helena Roseta…
Sim. Essas cartas tinham uma grande visibilidade, com críticas a Balsemão. Também acompanhei, e um dia espero contar isso em pormenor, tudo aquilo que foram os bastidores que antecederam a subida de Cavaco Silva à liderança do partido no Congresso da Figueira da Foz [em 1985].

A história da rodagem do Citroen?
Admito que a rodagem do carro também tenha existido. Mas não foi a rodagem que o fez ascender à liderança do partido. É uma imagem interessante para nos recordarmos desse momento, mas tudo isso foi meticulosamente preparado. Como vice-presidente da distrital de Braga, participei em várias reuniões distritais do partido, realizadas em vários pontos do país, uma das quais foi em Braga, outra foi em Coimbra, uma outra em Lisboa. Nessas reuniões, pensava-se em como resolver a liderança no Congresso que estava marcado para a Figueira da Foz. Num primeiro momento, ainda em vida de Carlos Mota Pinto. Depois, as reuniões que tiveram que ser aceleradas por causa da sua morte, que ocorreu muito em cima do Congresso. De facto, o nome que mobilizava várias dessas estruturas era Cavaco Silva…

CavacoFalaCongressoPSD1986

Marques Mendes participou na preparação “meticulosa” da eleição de Cavaco no Congresso da Figueira da Foz em 1985

Cavaco Silva estava perfeitamente informado sobre quem eram as tropas que iam estar lá ao lado dele…
Admito que sim, mas não posso provar. Nessa altura, mal o conhecia. Não tive com ele nenhum contacto. Admito que outros tenham tido. Mas sei muito bem o que se passava nas reuniões. Sei muito bem o que se discutia. Fui testemunha presencial desses momentos. Sei como foi.

Para a eleição de Cavaco na Figueira da Foz foi fundamental a viragem de Fernando Nogueira e da Distrital de Coimbra. E da Nova Esperança de Marcelo Rebelo de Sousa…
Juntaram-se dois ou três fatores. Tudo se resolveu, apesar de já haver um ambiente que enquadrava favoravelmente uma eventual candidatura de Cavaco Silva à liderança do partido. Mas tudo se decidiu no Congresso. O principal fator foi o mérito da intervenção de Cavaco Silva. Chegou ao Congresso e fez uma intervenção como o partido aprecia. Sabe que o PSD é um partido especial? O PSD aprecia gente de coragem. O PSD não gosta de gente de “meias tintas”, não há volta a dar. Depois podem ser mais liberais, menos liberais, mais de centro-esquerda, mais de centro-direita, mais políticos, mais ligados à economia. Mas há uma coisa que o PSD aprecia, independentemente destas características: gente corajosa, gente que corta a direito, gente que fala com convicção. Cavaco Silva chegou ao Congresso, disse coisas até à época politicamente incorretas.

"Para grande parte das bases do partido aquilo era uma espécie de segundo Sá Carneiro: na forma de agir, de comunicar, de romper. O discurso foi o primeiro grande momento que catapultou Cavaco Silva para a liderança."

Como o apoio a Freitas do Amaral como candidato presidencial…
Exatamente. Mas com uma coragem, uma convicção e uma determinação que na cabeça de uma parte grande dos congressistas passou a ideia de termos ali o segundo Sá Carneiro. Para uma grande parte das bases do partido, aquilo era uma espécie de segundo Sá Carneiro: na forma de agir, de comunicar, de romper. Este foi o primeiro grande momento que catapultou Cavaco Silva para a liderança. Foi uma condição necessária, mas talvez não fosse suficiente. Houve outro elemento decisivo: a negociação em pleno congresso com o chamado grupo de Mota Pinto…

Os “mota-pintistas” de Coimbra.
Sim. Liderados em grande medida por Fernando Nogueira, que estava relativamente não-alinhado, e que no inicio do congresso talvez tivesse mais virado para apoiar João Salgueiro [o concorrente de Cavaco Silva, balsemista, dado como vencedor antecipado]. A negociação que existiu fez com que o grupo apoiasse Cavaco Silva. Isso foi decisivo: Cavaco Silva poderia não ganhar sem isto.

A consciência de uma imagem “péssima” no cavaquismo

Gostava de ouvir a descrever a imagem pública que tinha durante o cavaquismo.
A imagem que eu tinha? Ah, a imagem que tinha era péssima. Pensa que não sei fazer a minha autocrítica? Sei, era péssima. Era um pouco a imagem, do “Yes, Minister?”. Era a imagem de quem não tinha voz própria, pensamento próprio, que pensava, agia, falava, comunicava tudo em função do líder, que era quase uma marioneta.

Correspondia à verdade?
No essencial, era uma mentira pegada. Alguns alimentaram essa ideia e também não tive muito mérito a desfazê-la. Portanto, tenho imensa culpa nisso. Também nunca me incomodou particularmente.

“O Independente” tinha uma especial implicância consigo. Tinha a ver com o facto de ser um advogado de província. Isso incomodava-o?
Não. Essas coisas nunca me incomodaram muito. O poder gera ciúme e a capacidade de estar próximo do chefe e do líder gera ciúme e inveja, e depois a circunstância de ser ligado ao chamado grupo nogueirista, não era o exemplo mais politicamente correto. E algumas pessoas passavam mais tempo nessa intriga, do que propriamente a trabalhar dentro do Governo. Poucos meses depois do fim do cavaquismo, alguém escreveu um artigo a dizer que o Marques Mendes tinha acabado. Ainda fui líder parlamentar, candidato à liderança, e a seguir, apesar de ser adversário de Durão Barroso fui convidado para ir para o Governo dele, coisa que para mim foi estranhíssima.

"Pensa que não sei fazer a minha autocritica? Era um pouco a imagem, do "Yes, Minister?”. De que não tinha voz própria, pensamento próprio, que pensava, agia, falava, comunicava tudo em função do líder, que era quase uma marioneta."

A propósito dos seus atrasos crónicos, conta-se a história de que mandava a sua secretária pôr o casaco na cadeira do Conselho de Ministros para quando Cavaco Silva chegasse dar a ideia de que já lá tinha estado.
Essa história é inventada. Conta-se, mas essa não é é verdadeira.

Os seus atrasos eram míticos, pelo menos isso é verdade?
Sim, a parte de verdade são os meus atrasos. Não é uma coisa de que me orgulhe. Mas não era um grande cumpridor de horários. Depois, mais tarde, fui-me corrigindo.

O professor Cavaco Silva não achava muita graça a isso…
Ah, imagino que não. Mas mesmo assim, nunca me remodelou e estive lá com ele do principio ao fim.

Nunca o avisou?
Não, nunca me disse nada. Julgo que ele não gostava de duas coisas: a pontualidade e o tabaco. Agora já não fumo, como toda a gente sabe. Mas na altura fumava imenso. Isso significava que tinha outras qualidades. Corrigi-me quando passei a ser líder parlamentar. Quem dirige reuniões tem de dar o exemplo de chegar a horas.

Nessa época fumava imenso e tinha de sair do Conselho de Ministros para ir fumar. Era nesse momento que havia os famosos telefonemas para “O Independente”…
Ah, isso não sei. Você é que saberá. Não tinha esse hábito.

Percebia de quem eram as fugas de informação?
Não é preciso tirar um curso. Basta ver quais eram os membros altamente elogiados e quais eram as vítimas. Tem de se saber viver com isso. Os políticos falam com os jornalistas. Uns passam informação verdadeira, outros passam informação menos verdadeira…

A certa altura, Cavaco Silva mandou marcar as páginas da agenda do Conselho de Ministros para aquilo deixar de aparecer no jornal.
Acho que sim. Ma sabe, acho que isso já não foi comigo. Foi quando deixei de ser secretário de Estado. As fugas de informação de um Conselho de Ministros nunca são uma coisa fantástica para um Governo. Acho que um Conselho de Ministros deve funcionar sem que de facto haja fugas de informação, se não as coisas não correm bem e o líder fica, evidentemente, preocupado, porque há uma perda de autoridade. Mas julgo que, tentar resolver problemas políticos de forma administrativa, não dá. Isto é um problema político. Se começa a haver fugas de informação, por alguma razão tem que ser. E se é de natureza política, resolve-se politicamente. Não se resolve por via administrativa. Por isso é que essas questões nunca resolveram nada. O professor Cavaco Silva tem imensas qualidades, acho que foi um grande primeiro-ministro, mas também não acertou sempre.

"O episódio da ponte [25 de abril] não é uma causa, é consequência do desgaste que gera, a dada altura, picos de arrogância, picos de algum distanciamento em relação às pessoas."

Quando é que percebe que o cavaquismo está a começar a ruir?
Acho que se percebe em 1993. Esse já foi um ano difícil. As autárquicas foram muito complicadas. Ainda não tinha acontecido o episódio da ponte, que se dá no ano seguinte. O episódio da ponte não é uma causa, é consequência do desgaste que gera, a dada altura, picos de arrogância, picos de algum distanciamento em relação às pessoas.

Quem estava lá dentro percebia isso?
Diria que nem todos. Aqueles que estavam mais ligados, digamos assim, à componente política do Governo, sim.

No seu caso, portanto…
Não direi apenas o meu caso. Seria eu mais quatro ou cinco. Aqueles que estavam em áreas setoriais talvez não se tenham apercebido da mesma forma, mas isto é sempre assim. Havia sinais enormes de esgotamento normal. Tinham passado oito anos de uma intensidade enorme, profundamente reformistas. Muitos portugueses até podem discordar do sentido de muitas das reformas, mas é difícil ignorar que elas existiram. Os grandes sinais de esgotamento são as fugas de informação, que retratam intrigas, problemas entre membros do Governo. O segundo sinal são gestos de arrogância e de autoritarismo, um sinal claríssimo de esgotamento. Quando se começa a ver um político a queixar-se dos comentadores e da comunicação social, está no principio do fim. São, na minha opinião, de uma forma claríssima os três grandes sinais de esgotamento. Quando está a dizer mal dos comentadores ou da comunicação social, um líder acha que está a fazer um grande número. Claro que se ele quer os aplausos dos “tiffosi”, está garantido. Mas esse é o número de maior fraqueza, que conheço.

"Quando está a dizer mal dos comentadores ou da comunicação social, um líder acha que está a fazer um grande número. Claro que se ele quer os aplausos dos "tiffosi" está garantido. Mas esse é o número de maior fraqueza, que conheço."

O sinal de “fraqueza” de Passos Coelho e como ele o aproximou de Marcelo

Sabe que Passos Coelho, na última reunião do Conselho Nacional, fez uma crítica aos comentadores….
Acho que ele já fez “n” vezes…

Mas agora voltou a fazer. Terá dito que as pessoas do partido deviam era defender o partido e não estar sistematicamente a apontar os erros do PSD. Encaixa no seu perfil. Isso é o sinal de alguma coisa?
Passos Coelho já faz isso há tanto tempo que já acho completamente banal. Ele próprio já banalizou isso. Já vem de há tanto tempo…

"Todo o político que sente necessidade de dizer mal dos comentadores e da comunicação social exibe um sinal de fraqueza. Só faz isso, quando está em dificuldades. É um enorme sinal de fraqueza, mas Passos Coelho já faz isso há bastante tempo.”

Esse é um sinal de fraqueza política?
Isso aplica-se a Passos Coelho como a toda a gente na política. Todo o dirigente político que sente necessidade de dizer mal dos comentadores e da comunicação social exibe um sinal de fraqueza. Só faz isso quando está em dificuldades, que é para agradar aos “tiffosi”. Os seus “tiffosi” do aparelho, em vez de o criticarem pelas falhas que tem, aplaudem por ele criticar os outros. É sempre a questão da mensagem e do mensageiro. É um enorme sinal de fraqueza, mas Passos Coelho já faz isso há bastante tempo. Ele julga ficar forte, mas pronto, é a vida.

Foi Passos Coelho que o aproximou de Marcelo Rebelo de Sousa. Vocês não se conheciam muito bem, aliás tratam-se formalmente por doutor, professor…
Sim, foi. Mas já conhecia o professor Marcelo Rebelo de Sousa, embora deva dizer que, no caso da família Rebelo Sousa, conheci primeiro o pai Baltazar e depois o filho, por causa da relação com Braga, e com Fafe em particular. Conheci-o quando estive na Câmara e fiz uma deslocação ao Brasil e ele estava exilado. Devo dizer que o achei uma pessoa encantadora. Quando estava no Governo e o pai Baltazar já tinha regressado do Brasil, convidava-me para almoçar de forma periódica. Só mais tarde, só quase a partir do fim do cavaquismo, é que começo a conhecer melhor o professor Marcelo.

Como é que Passos Coelho vos aproximou?
Na altura havia uma grande relação, veja-se bem — em função do que acontece hoje –, entre Marcelo Rebelo Sousa e Passos Coelho. E havia uma péssima relação entre Passos Coelho e Cavaco Silva. Veja bem as voltas que o mundo dá. Eu ao menos tento manter uma certa, linha para não andar a fazer permanentes desvios. Nessa altura, Pedro Passos Coelho era muito ligado a Marcelo Rebelo de Sousa. Quando se dá o início da preparação do Congresso de Santa Maria da Feira, de facto, Pedro Passos Coelho fala várias vezes do professor Marcelo e aproxima-nos. É a partir daí que começa a existir uma relação mais intensa entre nós que depois se aprofunda muito, muito, no período em que fui líder parlamentar.

A seguir, iniciam uma relação feliz, sobretudo nas horas que passam a falar e a conspirar, a partir das duas da manhã ao telefone.
Sim. Conhecíamo-nos muito mal. O professor Marcelo conhecia-me pessimamente e eu também o conhecia mal. Julgo que ambos tínhamos reservas em relação ao outro, embora, diplomaticamente, não o disséssemos. Ao fim de poucos meses, ambos percebemos que a imagem que tínhamos um do outro não correspondia exatamente à verdade. E fizemos uma grande relação de amizade que dura até hoje. Em pouco tempo, forjámos uma grande relação de amizade. Devo dizer que foi talvez o cargo que mais gostei de exercer.

"Nessa altura havia uma grande relação, veja-se bem -- em função do que acontece hoje --, entre Marcelo Rebelo Sousa e Passos Coelho. E havia uma péssima relação entre Passos Coelho e Cavaco Silva. Veja bem as voltas que o mundo dá.”

Outra das suas funções na liderança de Marcelo Rebelo de Sousa era o papel de travão dos excessos do líder.
Essa é a componente da intriga…

Do excesso do voluntarismo do líder, vamos dizer isto assim.
Não, acho que não. Não vou entrar em pormenores, mas acho que temos uma relação fantástica.

Houve uma fase em que as coisas não correram bem.
Fase difícil não houve propriamente. Mas não estivemos de acordo em tudo, como é evidente, como também não estive com Cavaco Silva ou com Durão Barroso. Eu tinha convivido muito com um líder muito diferente e gostei imenso de trabalhar com Marcelo.

Cavaco Silva não telefonava às 3 nem às 4 da manhã.
Não, não, isso não. Acho que à noite, de um modo geral, não falava. Como se sabe, sou noctívago, sempre fui.

Com um olhar lúdico sobre a politica, os dois juntos…
Nesse plano, tinha características mais próximas de Marcelo porque sou noctívago, sempre me habituei a estudar à noite, ainda hoje textos de responsabilidade gosto de escrever à noite. Depois, tenho o lado lúdico da política. Chegámos a combinar coisas importantes de madrugada, enquanto o engenheiro Guterres dormia. Nem ele imaginava que, enquanto ele dormia, tranquilamente o sono dos justos…

…Vocês estavam a planear tudo taticamente para o dia seguinte.
Sim, sim. Claro era o nosso papel. O nosso papel não era descansar, era trabalhar num combate.

É verdade que a revisão Constitucional foi fechada assim de madrugada? Já a desgastar fisicamente o adversário para conseguir…
Também teve importância. O último ato é uma reunião que começa às três da tarde e acaba às cinco da madrugada, com um pequeníssimo intervalo de uma hora para jantar. É uma violência, como imagina. Mas devo dizer que, na vida política — isso é outra lição que também se tira — é preciso ter uma resistência física enorme. Não é só psicológica ou moral. É também física. Se numa reunião uma pessoa está mais fresca que a outra a capacidade negocial é ligeiramente melhor.

Se a outra pessoa for alérgica a tabaco, como Jorge Lacão, e se a pessoa tiver consigo a fumar durante essas horas todas também desgasta.
Claro, também ajuda. Mas devo dizer que fiquei com uma enorme estima e admiração por duas pessoas que foram dois adversários firmes, exigentes: Jorge Lacão e António Vitorino. Duas pessoas radicalmente diferentes, mas que foram adversários de grande qualidade e de grande lealdade. E valeu a pena. Sabe por que sublinho isto? Por uma coisa que hoje em dia está muito atual: a ideia dos consensos. Neste caso, da falta deles. Elogiei Balsemão há dias porque, na homenagem a Mário Soares, ele falou muito dos conflitos que ambos tiveram enquanto líderes partidários, mas tiveram capacidade de fazer a revisão da Constituição de 1982, a do fim do Conselho de Revolução.

“[Eu e Marcelo] chegámos a combinar coisas importantes de madrugada, enquanto o engenheiro Guterres dormia. Nem ele imaginava que enquanto ele dormia tranquilamente o sono dos justos…"

E Soares fez isso contra o ex-secretariado…
Exatamente. Modéstia à parte, fiz isso quando fui líder do PSD. O último grande pacto de regime foi feito há 11 anos. Fiz com o engenheiro Sócrates três entendimentos que considero estratégicos: um pacto para a justiça, a lei de limitação dos mandatos autárquicos — que há mais de 15 anos se prometia — e uma mexida pontual na Constituição para permitir referendos europeus. Toda a gente sabe que a minha relação com o engenheiro Sócrates era péssima no plano pessoal. Mas fomos capazes de nos entender em três matérias essenciais. O mérito é dos dois. Acho que isso se perdeu e é muito mau.

Tem mais a ver com as personalidades dos líderes ou com o contexto atual?
Tem muito a ver com a personalidade. Os contextos são todos eles diferentes. Tem a ver com as personalidades, com os ecos. Tem a ver com os ecos, tem a ver com a circunstância de os políticos hoje terem só a dimensão tática da política, não terem a dimensão, de um modo geral, estratégica. Acho que as duas são essenciais.

Está a falar mais de António Costa ou de Passos Coelho?
Não, nesse plano estou a falar dos dois. Quer dizer, António Costa fez os acordos à esquerda, mas noutros planos não fez. Passos Coelho também podia ter dado passos maiores nesse sentido. Acho que Passos Coelho tem responsabilidades em não ter havido mais diálogo e mais entendimentos no passado. António José Seguro, que lá esteve, tem enormes responsabilidades e António Costa também. Sobretudo, estão a habituar o país a uma ideia que parece normal, mas que é anormal. O que seria normal era os líderes divergirem, mas ao mesmo tempo serem capazes de salvaguardar espaços e pontos de entendimento. A política é convergência e divergência. Nuns momentos, a coragem é mais importante para acentuar a divergência, mas noutros a coragem é sobretudo importante para marcar a convergência. Acho que se está transformar em normalidade a anormalidade de estar sempre a dizer mal dos outros.

Marques Mendes admite pensar nas Presidenciais daqui a oito anos

Passou longas horas a conspirar com Pedro Passos Coelho no restaurante Comilão contra Durão Barroso, a quem fazia oposição interna. Acha que Pedro Passos Coelho mudou muito com o poder?
Ah, isso é natural. As pessoas, evidentemente, mudam, e ele também mudou. Mas isso não me parece que seja um defeito. Numas coisas terá mudado para melhor, noutras terá mudado para pior. Sou amigo há trinta anos de Pedro Passos Coelho e isso mantém-se. Já disse que ele fez um trabalho altamente patriótico nas condições que teve. Independentemente do que acontecer no futuro, aquele período granjeou-lhe um lugar na história, ponto! Quanto a isso não tenho dúvidas. Pode-se depois concordar, discordar, achar que devia ter sido mais assim ou mais assado… Mas não sou obrigado a concordar com ele em tudo. Como nunca concordei com tudo relativamente a nenhum líder.

Ele também não concordou consigo em tudo, tanto que se demitiu da sua direção a certa altura.
Exatamente. É tudo assim perfeitamente natural, as pessoas pensam pela sua cabeça ponto final parágrafo e ainda bem.

Em 2000, candidata-se à liderança do partido contra Durão Barroso e Pedro Santana Lopes. Desde quando é que tinha essa ideia de querer ser líder do PSD?
Não sei, até lhe devo dizer o seguinte: era uma questão muito recente porque, quando saí, cinco anos antes, do Governo de Cavaco Silva, isso nem me passava pela cabeça nem tinha sequer condições para isso.

Só depois de ser líder parlamentar…
Foi um conjunto de circunstâncias. Não sei, nem sei precisar no tempo. Aconteceu em função dos factos. Aquelas eleições de 1999 foram muito traumatizantes para o partido. O partido não estava bem e a prova é que teve três candidatos à liderança. Durão Barroso iniciou o Congresso [de Viseu, em 2000] quase com 70% ou mais e acabou ali no limiar dos 50%. Não estava bem.

Ficou surpreendido quando Durão Barroso o convidou para ministro?
Muito.

“Ele [Durão Barroso] disse-me uma coisa com graça, tenho que lhe tirar o chapéu: 'Se eu consigo fazer um acordo com Paulo Portas que é de outro partido e com quem me guerreei bastante nos últimos tempos, como é que eu não consigo fazer um acordo consigo que apesar de tudo somos do mesmo partido?'"

Como dizem os manuais: vá buscar o adversário interno para o obrigar a estar todos os dias a dizer bem de si no Parlamento, como ministro dos Assuntos Parlamentares.
Não me parece que tenha sido essa a razão. Primeiro, não sei se alguém o influenciou, pela razão simples de que não houve intermediário. Foi ele diretamente que me falou. Também devo dizer que se repetiu a cena de uns anos antes: disse-lhe que não uma vez, disse-lhe que não segunda vez e só aceitei à terceira, num dia de Páscoa. Lembro-me bem.

É o homem que nunca diz “não” três vezes.
Ou é o homem que nunca diz que sim à primeira ou à segunda… Não gosto de dizer que sim logo. A questão não é essa. Fiquei sensibilizado pelo convite. Mas disse ao Durão Barroso que o partido e o país podiam não perceber muito bem como é que duas pessoas que tinham sido adversárias até há pouco tempo de repente se juntavam no Governo. Ele disse-me uma coisa com graça, tenho que lhe tirar o chapéu: “Se eu consigo fazer um acordo com Paulo Portas que é de outro partido e com quem me guerreei bastante nos últimos tempos, como é que eu não consigo fazer um acordo consigo que apesar de tudo somos do mesmo partido?” Tenho que reconhecer que o argumento foi inteligente e apelativo e aceitei. Devo dizer que gostei de trabalhar com ele. Não concordo com ele em muitas coisas e temos formas de agir muito diferentes, mas fiquei com uma enorme estima e consideração, respeito e amizade por ele.

Desiludiu-o pela forma como saiu do Governo para ir para a Comissão Europeia?
Essa parte já é pública. Não é uma parte que goste de abordar, porque foi talvez o único momento menos simpático que tivemos.

"Fui talvez o único membro do Governo que disse a Durão Barroso, em Conselho de Ministros, que não achava bem a ida dele para Bruxelas."

Durão Barroso não foi leal?
Não. Foi lealíssimo. Eu é que discordei abertamente. Devo ter sido o único membro do Governo que discordou em público. Então há duas coisas distintas: uma é a saída dele para Bruxelas, outra é a forma como ele promoveu a sucessão. Discordei de ambas. Achava mesmo que ele não devia ter ido para Bruxelas. Quando me diziam que ser presidente da Comissão Europeia era muito importante, eu dizia que ser primeiro-ministro de Portugal também era. Depois, discordei da forma da sucessão, porque um líder deve ser escolhido em Congresso e o líder que se sucedeu a Durão Barroso não foi escolhido em Congresso. Não tenho nada contra Santana Lopes, tenho quanto ao método. Não acho que um líder deva ser escolhido em Conselho Nacional. Fui talvez o único membro do Governo que disse a Durão Barroso, em Conselho de Ministros, que não achava bem a ida dele para Bruxelas. Não era nada pessoal. Não foi um momento fácil, mas não tenho o hábito de mandar recados pelos jornais.

A seguir à queda de Santana Lopes, segue-se a sua liderança. A sua maior frustração é nunca ter sido primeiro-ministro?
Ah, não tenho frustração nenhuma. Sim, claro gostava de ter sido. Alguém que quer ser líder do PSD…

O seu maior desgosto na sua vida partidária…
Não, não, estou de muitíssimo bem com a vida.

No fundo, não chegou lá.
Não cheguei, paciência. Já fui um privilegiado. Exerci quase todos os cargos possíveis em Portugal. No partido, exerci todos os cargos possíveis da base ao topo. No país, praticamente todos. Não ter sido primeiro-ministro… ah gostava. Gostava no sentido de que um líder do PSD, evidentemente, ambiciona isso. Mas acha que fico traumatizado? Não fico traumatizado com nada. Saí da vida política tranquilo e bem-disposto. Só não sou otimista “irritante” só para marcar a diferença. Sou um otimista sempre tranquilo, bem-disposto.

"Ah, não tenho frustração nenhuma. Sim, claro gostava de ter sido [primeiro-ministro]. Alguém que quer ser líder do PSD…"

Nunca se deprimiu?
Não, nunca. Um grande amigo meu já falecido…

O comandante Azevedo Soares?
Sim. Costumava dizer que era a única pessoa na vida que tinha encontrado que nunca tinha angústias. Nunca vivo angustiado com nada.

Foi por causa dele que deixou de fumar?
Foi, mas não queria falar disso. Marcou-me muito a morte dele. Era uma pessoa encantadora, fantástica, como pessoa, como político. Aquele desenlace marcou-me muito, sim.

Foi aí que deixou de fumar?
Foi no dia seguinte.

Mas ainda fuma um charuto de vez em quando.
Sim, de vez em quando. Mas não considero isso propriamente um vício porque se tiver que não fumar, não fumo. Portanto, nunca mais peguei num cigarro e fumava três maços por dia. Não era propriamente uma pessoa muito prudente.

Hoje ganha muito dinheiro? Está a recuperar o que perdeu quando teve a vida política?
Não. Tudo é relativo. Comparado com a vida política ganha-se bastante mais. Que eu ganhe de forma exagerada, um milionário, isso nem pensar. É da ficção científica. Agora, comparada com os péssimos vencimentos da vida política, com certeza que não me queixo.

marques mendes,

Luís Marques Mendes, 58 anos, é consultor da Abreu Advogados. Esta entrevista decorreu no escritório de advocacia, em frente à sede do PCP

O que faz? É jurista, advogado, facilitador?
Não, não. Jurista, sempre. Fui advogado antes de entrar na política. Voltei à advocacia depois da política. Não fui para nenhum cargo, nem para o Estado nem fora do Estado. Tirando uma passagem episódica por uma pequenina empresa, voltei à minha atividade. Foi para isso que me reformei.

O centro do seu trabalho é como jurista ou é como pessoa que conhece toda a gente e que tem todos os contactos e que faz lobby?
Não, não faço lobby coisíssima nenhuma. Essa ideia dava para outra entrevista. Acho muito interessante: é quase como também dizer que os jornalistas são isto e aquilo. Essas coisas não se podem generalizar. Sou jurista, com muito gosto.

Não tem uma componente de ir sabendo o que se passa, antecipando…
Não. Essa parte do saber o que se passa tem mais a ver com o meu hobby no comentário político. Hoje divido a minha vida por três coisas: sou advogado, faço comentário político e faço aquilo que considero uma atividade cívica de cidadania, com imensas conferências e palestras pelo país sobretudo em instituições e escolas. Até lhe posso dizer o seguinte: justamente por causa de manter alguns critérios da minha vida e evitar algumas incompatibilidades com os comentários, já recusei um ou outro emprego e esses sim, é que eram empregos de qualidade. Mas poderia trazer alguma incompatibilidade com os meus comentários.

Está a falar de quê?
Não, não são públicos.

Cargos em empresas?
Sim, e nunca os irei divulgar. Só meia dúzia de amigos é que sabem. Isso poderia introduzir incompatibilidades com os meus comentários, não é com o passado da minha vida política. Gosto de estar livre para fazer comentários.

Quando ou em que circunstância é que voltará à politica?
Nun…

Ia dizer “nunca” mas arrependeu-se…
Só não digo nunca, porque nunca uso essa expressão. Mas não acho minimamente provável voltar.

Nem uma eleição para deputado para vir a ser presidente da Assembleia da República?
Já fui convidado e já disse que não, nem pensar. Não é provável. Já tive esse convite e já recusei e devo dizer que não é minimamente provável. Quase diria que aí podia escrever garantidamente que não.

E ser Presidente da República?
Então um presidente acaba de iniciar mandato e você já está à espera de sucessor?

Ainda é novo… Vai fazer 60 anos para o ano.
Ah sim, isso sou. Vou fazer 59 anos. Não me esteja a fazer mais velho. Não sei, um dia daqui a oito anos talvez pense nisso. O Presidente em princípio faz 10 anos e, portanto, começa-se a pensar nisso dois anos antes. Um dia poderei pensar nisso, apenas e só. Não mais que isso. Não está nada nos meus horizontes. Estou lindamente com a vida que tenho. Acho que basta conversar comigo para perceber que estou feliz com aquilo que faço.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.