As campainhas vão soar nas escolas a partir desta sexta-feira para dar início oficial ao novo ano letivo, embora a maioria dos alunos só comece as aulas na próxima semana. Há várias novidades à espera dos alunos e os diretores antecipam um arranque tranquilo, à semelhança do que já aconteceu no ano passado.
“Prevejo um princípio de ano letivo tranquilo porque os recursos humanos já chegaram às escolas. Este ano pudemos reconduzir os assistentes operacionais. E embora haja escassez ficámos muito animados com a promessa do senhor ministro de mais 1.500 assistentes. Em relação aos professores, temos todos os que têm horário anual colocados”, resumiu ao Observador Filinto Lima da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas (ANDAEP).
Uma visão menos colorida tem João Dias da Silva, da FNE, que se foca no “acentuar da precariedade”, com “milhares de professores contratados a suportarem o funcionamento do sistema educativo” e “professores dos quadros a serem empurrados para 200 ou 300 quilómetros de distância”.
Recursos humanos à parte, há muitas outras novidades que se vão sentir nas salas de aula e o Observador destaca algumas das principais medidas.
Menos alunos por turma
Tal como o Ministério se tinha comprometido, e como a esquerda defende há anos, o número máximo de alunos por turma vai baixar este ano letivo, para níveis pré-troika. Para já, a redução avançará nas turmas de 1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos em perto de mil escolas dos territórios de intervenção prioritária (TEIP), onde estudam cerca de 200 mil estudantes, segundo números avançados pelo próprio ministro da Educação. A ideia é estender depois esta medida a mais anos letivos e a mais escolas.
Na prática, nestas escolas localizadas em territórios económica e socialmente desfavorecidos, marcados pela pobreza e exclusão social, as turmas do 1.º ano passarão a ter um limite máximo de alunos por turma fixado nos 24, ao invés dos atuais 26, e nos restantes anos de ensino esse teto baixará dos 30 para os 28.
O próprio primeiro-ministro, António Costa, presente na sessão de antecipação do arranque do ano letivo, esta quarta-feira, em Matosinhos, lamentou que só seja possível avançar com a redução de alunos para já em 20% dos agrupamentos de escolas públicas. “Gostávamos obviamente de poder fazer já em todas as turmas, mas não podemos, não temos meios para isso. E é por isso que começámos por onde era prioritário”, justificou.
João Dias da Silva, da Federação Nacional de Educação (FNE), disse ao Observador que esta é uma medida “muito curta” por só se aplicar às turmas em início de ciclo das escolas TEIP.
E Filinto Lima, da ANDAEP, adjetivou a medida de “medrosa”. “Entendo até que possa não haver dinheiro para mais, mas achamos que podiam ser mais acutilantes.”
Manuais gratuitos para todos os alunos do 1.º ciclo
Tal como está inscrito no programa de Governo, e no Orçamento do Estado para 2017, a gratuitidade dos manuais escolares será alargada este ano letivo a todos os alunos do 1.º ciclo que frequentem escolas públicas ou colégios privados em turmas com contrato de associação. Ao todo serão abrangidos 380 mil alunos, num custo previsto de 12 milhões para o Estado. A ideia é ir alargando a medida a toda a escolaridade obrigatória. No ano letivo 2016/17, cerca de 80 mil alunos do 1.º ano receberam gratuitamente os manuais escolares.
Sempre numa lógica de reutilização, os pais estão obrigados a devolver às escolas, no final do ano letivo, os manuais em bom estado, estando previstas penalizações (como pagamento dos manuais na íntegra e exclusão do programa de gratuitidade no ano seguinte) para quem não entregue ou entregue em muito mau estado, resultado do mau uso.
Por ter sido o primeiro ano em que a medida avançou, o Ministério da Educação determinou algumas atenuantes para quem devolvesse os manuais em mau estado, evitando assim eventuais penalizações para os pais. A grande maioria desses livros devolvidos acabaram mesmo por não poder ser reutilizados por estarem muito usados, escritos e desenhados, fruto de uma utilização normal.
Visitas de estudo voltam a ser gratuitas para os alunos mais pobres
Neste ano letivo, e retomando a prática que vigorava até dezembro de 2013, os alunos mais carenciados do 5º ao 12º anos de escolaridade vão voltar a ter direito a viagens de estudo pagas pelas escolas.
Os alunos do escalão A não pagarão nada pelas visitas, já os alunos do escalão B terão metade da visita paga. A medida já constava do Orçamento para 2017, mas a alteração ao despacho da ação social escolar afinal só vai produzir efeitos no ano letivo que arrancará nos próximos dias.
Quando pôs fim a este apoio, Nuno Crato justificou com as “limitações orçamentais”, expressão que viria a apagar do despacho logo depois . Desde então cada diretor passou a decidir se usava dinheiro do orçamento próprio para suportar essas viagens aos alunos com ação social escolar.
Refeições durante as férias do Natal e da Páscoa nas escolas TEIP
Também no Orçamento do Estado para 2017 ficou definido que “durante as interrupções escolares do Natal e da Páscoa, os estabelecimentos de educação e ensino públicos integrados no Programa dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) mantêm em funcionamento os serviços de refeições escolares, com as mesmas condições de pagamento do restante ano letivo, para os alunos beneficiários da ação social escolar“.
Esta medida, assim como a do financiamento das visitas de estudo, foi referida esta quarta-feira, numa sessão de apresentação de medidas para o próximo ano letivo, pelo ministro da Educação, que focou o reforço de 3,8% da ação social escolar, destacando ainda a criação de um terceiro escalão do abono de família que permite o apoio para a aquisição de manuais. Esse auxílio corresponde a 25 % do escalão A da ação social escolar: 29,5 euros para alunos do 2.º ciclo do ensino básico, 44 euros para os alunos do 7.º ano, 33,5 euros para os alunos que frequentem o 8.º e 9.º anos e 36,75 euros para alunos do ensino secundário.
236 escolas vão testar flexibilidade curricular
O projeto-piloto de flexibilização curricular vai avançar, este ano letivo, em 236 escolas (171 públicas, 61 privadas e quatro escolas portuguesas no estrangeiro), que poderão gerir 25% do currículo. Mas mesmo nestas escolas, apenas será implementado em turmas do primeiro ano de cada ciclo de escolaridade (1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos), ficando ao critério de cada um dos diretores de escola decidir em quantas turmas avançará e de que forma avançará.
O Ministério da Educação deu às escolas várias sugestões, sem qualquer critério de obrigatoriedade. Assim, as escolas podem optar por fundir disciplinas. Por exemplo: os professores de História e Português podem juntar-se para ensinar, em conjunto, o tema dos Descobrimentos. Também pode acontecer que os professores de Físico-Química e Ciências Naturais ou de História e Geografia trabalhem em equipa, articulando-se de forma a que os alunos durante uma semana tenham apenas uma das disciplinas e, na semana seguinte, a outra.
Das opções apresentadas pelo secretário de Estado João Costa, em março deste ano, consta também a possibilidade de a meio de um período interromper a rotina e dedicar uma semana ao estudo e discussão de um tema interdisciplinar, de preferência da atualidade, como por exemplo, a questão da Coreia do Norte. Ou ainda a possibilidade de organizar as disciplinas por trimestres ou semestres.
É o que acontecerá, por exemplo, no Agrupamento de Escolas que Filinto Lima dirige, em Gaia. “No caso das duas turmas de 7.º ano, as disciplinas de história e geografia vão transformar-se em disciplinas semestrais. Uma turma tem história no primeiro semestre enquanto a outra tem geografia e depois trocam. O primeiro semestre dura de 13 de setembro a 26 de janeiro”, explicou, ao Observador o diretor de escola, lembrando que é o que já se costuma fazer na disciplina de Tecnologias de Informação e Educação Tecnológica. “Cada turma vai ter, por ano, menos uma disciplina. O sétimo ano é uma tolice de disciplinas. E os professores passam também a ter menos alunos durante o ano.”
Esta escola escolheu ainda uma turma do 5.º ano para desenvolver um projeto que envolverá o professor de História e o de Português. “Uma vez por semana estarão com aquela turma a trabalhar em conjunto um projeto que irão acordar. Os professores serão os coordenadores dos alunos e vão encaminhá-los. No final do ano, apresentarão o trabalho final à comunidade educativa.”
E tudo isto avançará sem alteração de programas, nem novos manuais escolares, mas com um emagrecimento de currículos, com foco nas “aprendizagens essenciais”, e tendo como orientação o novo perfil do aluno à saída do secundário, que estabelece competências que os alunos têm que ir adquirindo ao longo da escolaridade obrigatória.
Regresso da Área Projeto e da Educação para a Cidadania
Com o emagrecimento dos currículos, vai ser possível, este ano, reintroduzir nos currículos a Área Projeto e a Educação para a Cidadania, extintas pelo ministro Nuno Crato nos anos de 2012 e 2013.
Serão abordados temas como a literacia financeira, os órgãos de comunicação social, a segurança, a defesa do consumidor ou a saúde, mas não só. O ministro adjunto Eduardo Cabrita anunciou, no início de setembro, que este ano letivo será lançado, no âmbito da Educação para a Cidadania, um projeto-piloto em cerca de 200 escolas onde serão abordadas questões da discriminação racial. Sem adiantar mais informações, disse apenas que “terá uma componente letiva nos primeiros anos de cada ciclo educativo”.
Será ainda reintroduzida a disciplina de Tecnologias de Informação no 2.º e 3.º ciclos e haverá mais tempo para a educação física.
Mais 1.500 assistentes operacionais
Este ano letivo vão chegar às escolas mais 1.500 assistentes operacionais, além dos 250 já anunciados. O número foi revelado, esta quarta-feira, pelo ministro Tiago Brandão Rodrigues, numa sessão de antecipação do arranque do novo ano letivo, em Matosinhos.
O acréscimo de funcionários resulta da nova portaria dos rácios, que aguarda apenas publicação, e que vem atualizar a que está atualmente em vigor, baixando de 40 para 30 o número de alunos por funcionário, o que faz com que subam as necessidades de pessoal, há anos denunciadas pelos diretores de escolas.
Depois de publicado o diploma, os diretores poderão proceder à contratação de pessoal, o que ainda levará tempo, pelo que esses 1.500 assistentes não chegarão às escolas logo no início do ano letivo. A esses somam-se os 250 já anunciados pelo Ministério da Educação, em agosto.
Os diretores estão satisfeitos com a medida, mas pedem rapidez no processo, frisando que o processo de contratação é muito burocrático e poderá demorar meses até estes funcionários chegarem às escolas. “Ficámos muito animados com a promessa do senhor ministro, mas queremos que seja concretizada rapidamente. O problema é que vai demorar tempo por causa do ‘calvário concursal'”, atirou Filinto Lima, apontando para o final do primeiro período a chegada desses funcionários.
Já João Dias da Silva, da FNE, mostrou-se irritado porque essa portaria da alteração dos rácios “só nos foi remetida esta quinta-feira para darmos um parecer até à próxima segunda-feira”. “Isto é ridículo”, completou o sindicalista, criticando o facto de o Ministério da Educação não ter reunido nem negociado a portaria com os sindicatos. “O Ministério adivinha o número 1.500 com base numa portaria ainda em discussão. Se o fizer é ótimo, é uma boa notícia. Simplesmente vamos ver quando os vai admitir.”
70 novas salas para o pré-escolar
Ao nível do pré-escolar, além da harmonização do calendário escolar com o do primeiro ciclo — que implica que o ano acabe uma semana mais cedo e que volte a haver férias de Natal, Carnaval e Páscoa –, o Governo anunciou a abertura de 70 novas salas, sobretudo na Grande Lisboa.
Segundo o Diário de Notícias, que cita o Ministério da Educação, estas novas salas permitirão abrir vaga para 1.750 crianças. O Governo já disse que o objetivo é garantir a oferta universal de pré-escolar a todas as crianças a partir dos três anos de idade durante a atual legislatura, ou seja até ao fim de 2019.
Mais centros Qualifica e obras nas escolas
As novidades não se ficam por aqui. Haverá também uma maior aposta na formação de adultos, com um reforço do Programa Qualifica, criando 42 novos centros, a somar aos 260 existentes. Este programa veio substituir as Novas Oportunidades e destina-se a adultos ou jovens “nem, nem” — que nem estudam, nem trabalham. Haverá um reforço da Oferta Formativa também ao nível do ensino profissional e introdução de critérios na gestão da rede (relevância, desempenho, empregabilidade e encaminhamento).
E prosseguirão ainda obras nas escolas, num investimento total global de 350 milhões de euros. Serão abrangidas 500 escolas — 300 do pré-escolar e do primeiro ciclo e 200 dos restantes ciclos de ensino. Nuns casos serão finalizadas obras interrompidas, noutros iniciados novos projetos.