Dizem as estatísticas que a maioria da população portuguesa não sabe o que é o crowdfunding. Estará a passar ao lado dos portugueses uma excelente ferramenta de investimento e financiamento, numa época em que o crédito bancário é difícil de obter e as aplicações financeiras são cada vez mais um jogo de azar? O crowdfunding, que em bom português dá pelo nome de financiamento colaborativo, parece algo complicado e burocrático, certo? Quando pensamos em financiamento, imaginamos logo planos financeiros em catadupa, números e mais dados imersos num mar de papelada e mil e um requisitos e condições a preencher. E o que será isto do colaborativo? Será aqui que está a tónica da diferença?

Vejamos então do que estamos a falar: o crowdfunding é o financiamento angariado através do registo de plataformas eletrónicas especializadas (websites). Estas plataformas, para se registarem como tal, têm de cumprir uma série de obrigações, entre as quais a de deter um seguro de responsabilidade civil que cubra as responsabilidades resultantes de negligência profissional. Estas condições, bem como a supervisão da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e o registo junto da Direção Geral do Consumidor, garantem a segurança do empreendedor.

Assim, um empreendedor expõe a sua ideia ou o seu projeto e, se houver investidores interessados, estes financiam a causa. É o lema do “grão-a-grão enche a galinha o papo” aplicado ao investimento particular. No crowdfunding, um empreendedor vai reunindo parcelas de financiamento de vários investidores, particulares ou empresas, para conseguir desenvolver a sua ideia ou concretizar um projeto. Se não reunir as condições ou se frustrar o cumprimento do seu objetivo… o financiamento é devolvido aos investidores.

Será que o futuro do investimento está neste tipo de financiamento? Deverá ser usado para empreendedorismo? Entre os vários formatos de crowdfunding – donativo, recompensa, capital (equity) e empréstimo – estes dois últimos ganham peso no financiamento e investimento em empreendedorismo. Na modalidade de equity, a remuneração do financiamento obtido é feita através de uma participação no capital social da empresa financiada, distribuição de dividendos ou partilha de lucros. No crowdfunding por empréstimo, a entidade financiada remunera o financiamento através do pagamento de juros fixados no momento da angariação.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Existem casos de crowdfunding de recompensa (no qual é entregue um bem ou prestado um serviço como contrapartida do investimento) para financiar a abertura de um negócio. Recentemente, no Brasil, foi divulgado um caso de uma iniciativa deste tipo que teve de ser cancelada pois não teve a adesão dos investidores que seria necessária. E porquê? Porque a recompensa não era proporcional ao investimento e não cativava os investidores, logo frustrou-se o objetivo. Pelas particularidades e características deste tipo de financiamento, é fundamental a “operação de charme” do empreendedor e o appeal da recompensa. Uma má estratégia em termos de recompensa poderá aniquilar o negócio e o projeto em dois tempos!

É no crowdfunding de equity que está o ganho para empreendedores e investidores. Os pequenos negócios conseguem o financiamento de que tanto precisam. Ao mesmo tempo, revelam-se potenciais casos de sucesso, o que se traduz em lucro futuro para os acionistas que arriscaram ajudar a lançar a empresa. É aqui que está o mote para o investimento e financiamento em Startups.

Como do lado do investidor existem limites aos donativos que não podem exceder 10 vezes o valor global da atividade a financiar, existindo igualmente limites aos valores que cada investidor pode aplicar (três mil euros por oferta se o investidor for uma pessoa singular com rendimento anual inferior a setenta mil euros, totalizando 10.000€ no total de investimentos realizados no período de 12 meses), existe necessariamente uma dispersão do financiamento por vários investidores. Estes valores só podem ser ultrapassados por pessoas singulares cujo rendimento seja igual ou superior aos setenta mil euros ou por investidores qualificados. O limite máximo de angariação para cada oferta, no prazo de um ano, é de um milhão de euros. Com estes limites impostos por lei, evita-se o clima de especulação e o endividamento dos investidores singulares.

A emergência do crowdfunding em Portugal tem se manifestado essencialmente nas artes e na cultura, contudo, numa época em que o empreendedorismo está mais popular do que nunca, é importante conhecer e mostrar esta nova forma de financiamento, que passa por buscar um pouco o espírito de comunidade e a ousadia de acreditar numa boa ideia. Se é certo que essa boa ideia, a perseverança e o trabalho são ingredientes base para uma Startup de sucesso, é também tão certo que o financiamento é o combustível que ira fazer o projeto andar e até voar.

Aliado a uma boa estratégia de comunicação, o crowdfunding veio traduzir-se em mais um meio de abastecimento desse combustível, em que vale a pena apostar, atendendo à simplificação dos procedimentos e à facilidade de chegar a um maior número de investidores, sem descurar, obviamente, a legalidade e a segurança do investimento. Podemos, a final, afirmar que o futuro do investimento está à distância de uns cliques: no crowdfunding.
Rita Trabulo é advogada da CCA ONTIER