Uma das boas notícias dos últimos anos em Portugal é o notável crescimento do turismo. A conjuntura internacional – com problemas graves de instabilidade em outros destinos turísticos tradicionais – tem sido favorável a essa tendência, mas o crescimento do turismo em Portugal a um ritmo significativamente superior ao de Espanha e da média europeia sugere que a geopolítica internacional não explica tudo.

O crescimento do turismo tem sido particularmente visível e importante no Porto. Para uma cidade e uma região que têm vindo ao longo das últimas décadas a perder vigor económico e a marcar passo na maioria das áreas relevantes, o sucesso turístico só pode ser visto como uma boa notícia. A atracção para o aeroporto do Porto de companhias low-cost – com destaque para a Ryanair – certamente contribuiu para este sucesso, mas o maior elogio deve ser dirigido à iniciativa privada portuense. De forma descentralizada e assumindo os próprios riscos, muitos investidores e empreendedores têm lançado novos negócios que simultaneamente tiram partido e incentivam o sucesso turístico da cidade e da região.

Honra lhe seja feita, o secretário de Estado do Turismo Adolfo Mesquita Nunes não se tem cansado de salientar o papel fundamental do sector privado nesse mesmo sucesso, como voltou a fazer recentemente numa entrevista à RTP2. Ao fazê-lo, evita – dando um bom exemplo – ceder à tentação de instrumentalizar esse sucesso para efeitos de auto-promoção. Assim, em Outubro de 2014, numa entrevista conjunta com o anterior secretário de Estado do Turismo do PS Bernardo Trindade, Adolfo Mesquita Nunes salientou: “O turismo vive tempos muitíssimo positivos, os números são excelentes, e penso que isso não seria possível se Portugal não fosse um bom destino turístico. Isso não se constrói em dois anos e meio, e seria quase ridículo, ao analisar os números, tentar ficar com todos os méritos desses resultados.” Em Novembro de 2014, realçou novamente a mesma ideia: “Os resultados significam que há muita gente a fazer muita coisa bem feita: as empresas, os trabalhadores, as autarquias, o governo actual e o anterior. Um destino turístico não se cria em três anos”.

Neste contexto, foi com uma considerável dose de surpresa que li na página de Facebook de Rui Moreira, Presidente da Câmara do Porto, a seguinte reacção à entrevista acima referida (e disponível na íntegra aqui) de Adolfo Mesquita Nunes à RTP2: “AHAHAHAH [sic] Acabámos de saber (estupefactos) por um Secretário de Estado, que o crescimento do turismo no Porto não se deve nem à política de promoção que a cidade tem feito nem ao extraordinário trabalho que os portuenses (empresários e cidadãos) têm feito. A razão para o enorme sucesso do turismo deve-se ao trabalho deste Secretário de Estado e à presença do Porto na imprensa internacional que, por sua exclusiva e enorme competência, tem promovido a cidade no estrangeiro. E é bem verdade, basta olhar para a capa do New York Times, para as centrais da Monocle, para a última página do Libération, para a página 4 do El País para se perceber a presença deste enorme Secretário de Estado e o competente trabalho que o seu Governo tem feito na promoção do Porto. Estão a vê-lo? Reconhecem-no? Chama-se Adolfo Mesquita Nunes… Palavras para quê, é um artista português.”

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Para além do conteúdo notoriamente descabido e deslocado, o estilo deselegante não combina com Rui Moreira que, independentemente da maior ou menor proximidade política que possa merecer a cada momento, é uma personalidade estimável e de bons modos. Prefiro por isso atribuir o sucedido a uma mera reacção pouco ponderada impulsionada pelo carácter hiperbólico que a comunicação nas redes sociais por vezes assume. Ou talvez à nefasta influência exercida por algum assessor mal informado.

No caso do Porto, como no resto do país e como bem tem repetidamente assinalado o actual secretário de Estado do Turismo, a parte maior do mérito pelo sucesso no turismo deve ser atribuído à iniciativa privada. Mas se houvesse que destacar um político, ele não seria certamente nem Adolfo Mesquita Nunes, no cargo há cerca de dois anos, nem Rui Moreira, presidente há pouco mais de um ano. Esse destaque deveria ser direcionado para Rui Rio que, curiosamente, foi demonizado ao longo de todos os seus mandatos pela sua suposta falta de investimento na animação cultural e artística. Lacuna essa que supostamente estaria a matar a atractividade da cidade do Porto com terríveis consequências futuras. Seria Rui Rio que poderia agora vir dizer: os resultados, não obstante as queixas de alguns artistas da cidade, estão à vista.

Pela estima e simpatia pessoal que Rui Moreira suscita de forma generalizada entre os portuenses, assim como pela imagem de independência que foi decisiva para a sua recente vitória eleitoral no Porto, espero sinceramente que este tipo de episódio não se repita. O Porto – e o próprio Rui Moreira – merecem melhor.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa