Depois de três anos de resgate, a Irlanda saiu pelo seu próprio pé, vai aos mercados financiar-se sozinha, sem rede, e aponta baterias ao futuro. Apesar do elevado nível de endividamento público e privado e de uma taxa de desemprego elevada, existe espaço para crescer. Nos próximos 20 anos, a Irlanda quer ser “o melhor pequeno país do mundo” para se investir.
No documento “Estratégia para o Crescimento”, elaborado pelo Governo de Dublin, o epicentro da economia é a competitividade fiscal. Embora a troika ainda tivesse tentado, o Governo irlandês bateu o pé e garante que a taxas de IRC para as empresas é para manter nos 12,5%. “Está decidido e a política não vai mudar”, lê-se no documento, assinado a duas mãos por Enda Kenny, primeiro-ministro, e Eamon Gilmore, vice-primeiro-ministro.
Esta é a base de toda a estratégia desenhada para “atrair investimento direto estrangeiro”, criar emprego e ajudar a economia da ilha. A par dos impostos baixos, o Governo irlandês acredita que as exportações são outro dos motores da economia. Embora o sucesso do setor exportador esteja dependente do desenvolvimento das economias americana, europeia e britânica, a Irlanda olha com atenção para os mercados emergentes e quer apostar, também, nos investimentos de irlandeses no país. Além destes núcleos de ação, aquele que já foi considerado o “Tigre Celta” pisca o olho a novas oportunidades de negócio na economia verde, nas indústrias criativas e nos serviços de saúde.
O setor agro-alimentar e das pescas é considerado “uma importante indústria” e reconhecida no documento estratégico da Irlanda como “um fator-chave de recuperação das exportações”. O setor agroalimentar aumentou as vendas ao exterior em 28% em 2013 e está aos níveis de 2009. A venda de laticínios, carne, bebidas, carne de suíno e marisco vale já nove mil milhões de euros, representando mais de metade das exportações das empresas irlandesas para cerca de 170 destinos.
Atraindo investimento nesta áreas, mas também na área da inovação e da tecnologia, bem como no turismo, nas artes e na cultura, o Governo irlandês espera aumentar o emprego até 2020 e, na tentativa de cumprimento desta meta, pode ter uma vantagem. A mão-de-obra é “relativamente jovem, flexível e bem-educada”.
Governo português define estratégia, mas só até 2015
Portugal também apresentou uma estratégia para o crescimento da economia. No dia em que se assinalou a saída simbólica da troika, a 17 de maio, o Governo da coligação PSD-CDS apresentou o “Caminho para o Crescimento”. O documento inclui uma estratégia de reforma a médio prazo que não vai muito além de 2015, ano em que se realizam eleições legislativas. Sintetiza as medidas já estabelecidas no Documento de Estratégia Orçamental (DEO) e no Guião da Reforma do Estado.
Tal como a Irlanda, o caminho para o crescimento português passa pelo setor exportador. Antes da crise, segundo o documento do Governo, o valor das exportações, em percentagem do PIB, era inferior a 30%. Em 2013, subiu acima de 40%, mas o Executivo quer mais: “o objetivo é aumentar o peso das exportações para, pelo menos, 52% do PIB até 2020 e continuar a aumentar este rácio a longo prazo”. O Governo português considera uma “meta alcançável, se o ritmo das reformas se mantiver”.
A tónica é colocada no fomento da competitividade. Reconhece a necessidade de “eliminar as restrições excessivas” e as “barreiras burocráticas à atividade económica” e considera que só assim o ambiente de negócios será mais competitivo. Por outro lado, prossegue o documento, é crucial ter uma justiça mais “eficiente e eficaz”.
Portugal quer promover o investimento e uma das peças chave é a reforma em curso do IRC. Prevê-se que a taxa do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas desça progressivamente “de 25% para 23% já em 2014”. O objetivo é que possa descer até 17% em 2018.
O plano português reconhece que não há investimento sem financiamento. Para ajudar as empresas a ter acesso a dinheiro, o Governo elenca algumas medidas, nomeadamente várias linhas de crédito já lançadas no valor de cinco mil milhões de euros. E acrescenta terem sido criadas linhas de crédito específicas para favorecer a criação de novas empresas, no valor de 100 milhões, a par do programa Revitalizar, criado para reestruturar as empresas, no valor de 220 milhões.
Portugal espera crescer não só através das exportações, mas também através da chamada economia verde e do mar. As metas são ambiciosas. Portugal quer aumentar a contribuição do setor para o PIB em 50% até 2020, quando atualmente representa apenas 2% do Produto Interno Bruto.
O documento português aponta igualmente como prioridade o setor marítimo-portuário, que “é da maior relevância para a competitividade das exportações”. Neste ponto, sublinha-se a necessidade de cortar nos custos portuários. O setor das águas e as privatizações são igualmente sublinhados como essenciais para fomentar a competitividade.
No final do documento para o crescimento português, o Governo recupera o tema das exportações e das conquistas alcançadas no equilíbrio do défice da balança corrente, ou seja, a dívida externa. Tradicionalmente, a economia portuguesa compra mais ao estrangeiro do que vende e o Governo puxa dos louros para dizer que “a correção deste desequilíbrio revelou-se mais rápida do que o previsto”.
Em 2013, “o saldo da balança corrente portuguesa apresentou um superavit de 0,5% do PIB”, devendo atingir os 0,8% do PIB” este ano, espera o Governo. “Estes resultados devem-se, em parte, à redução da procura interna e, por conseguinte, à redução das importações, mas principalmente ao aumento das exportações”, justifica. Continuar a fazer subir as vendas ao exterior e cumprir a meta inscrita no documento “Caminho para o Crescimento” é que poderá já não depender do atual Governo.