Carracedo queixa-se que ganha mil euros e que os cortes e os aumentos de impostos lhe dificultaram a vida nos últimos anos. Carracedo é empregado em Portugal e aparece citado num manifesto de um partido alemão: o Die Linke. Contar as dificuldades na primeira pessoa, ao país que os portugueses escolhem como o culpado das dificuldades, foi uma originalidade do partido da esquerda alemã, mas este não é o único a referir Portugal ou os países do Sul nos manifestos eleitorais para as europeias de dia 25.
Os alemães são, na verdade, os que mais se preocupam com Portugal. No país de Angela Merkel, quatro partidos fazem de Portugal tema de campanha nos seus programas eleitorais. Além do Die Linke, que defende, através das palavras do trabalhador português, que a crise da dívida coloca em causa quer a “democracia, quer o Estado social”, também a CDU se refere a Portugal.
No manifesto eleitoral, o partido da chanceler alemã diz que o fundo de resgate europeu funciona e que prova disso são os vários programas em países como a Irlanda e Espanha, onde há “êxitos significativos”, mas também noutros países que provam que
“reformas estruturais e consolidação orçamental são duas faces da mesma moeda”.
E, neste caso, Portugal, Chipre e Grécia demonstram “melhorias demonstráveis”.
Se Portugal é um bom exemplo para a CDU, o mesmo não acontece no AFD. O partido dos economistas, que foi criado em 2013, reunindo um conjunto de cerca de 300 economistas alemães, chega a pedir aos portugueses que referendem a saída do euro, porque, dizem, são “eurorealistas”.
Dizem os candidatos do AFD que a ideia de uma “Europa democrática e pacífica desmorona” quando se fala de programas de ajustamento que são impostos a países como Portugal, Grécia ou Chipre. Para este partido alemão, as entidades da troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional) que “impõem” os programas têm ainda um problema adicional: não são eleitas, nem são controladas pelos parlamentos nacionais.
Ainda na Alemanha, o FDP, partido que integra o grupo dos liberais e democratas do Parlamento Europeu, tem uma breve referência a Portugal, mas no capítulo da emigração: preocupa-se com a emigração dos jovens, sobretudo “nos países do Sul da Europa”.
Os países do Sul
Fora da Alemanha, as referências diretas a Portugal tornam-se mais raras. Mesmo assim, há países que lembram as dificuldades dos países do Mediterrâneo.
Os conservadores da Dinamarca, do partido Konservative, pertencentes ao Partido Popular Europeu de que fazem parte PSD e CDS, contudo, tratam os portugueses como os grandes culpados pela crise do próprio país. Não têm problemas em apontar o dedo às políticas “irresponsáveis” dos países “endividados” do Sul. Dizem os conservadores dinamarqueses que a União Europeia terá como tarefa principal nos próximos anos promover o crescimento, a criação de postos de trabalho e finanças públicas saudáveis para fazer frente à dívida. Até porque, defendem, “muitas das dificuldades” da UE no crescimento e no emprego residem nesses países do Sul.
Já os sociais-democratas dinamarqueses (Social demokraterne) que, apesar do nome, fazem parte do grupo do Partido Socialista Europeu (PSE), lembram as dificuldades dos jovens em conseguirem emprego. Caracterizam os processos de ajustamento no Sul da Europa como “duros e resistentes” e defendem que, apesar de ser necessário controlo orçamental mais apertado, é necessário pensar no crescimento. Até aqui, tudo igual ao que diz, por exemplo, o manifesto conjunto do PSE, assinado em Roma no início de março e que serviu de guia aos manifestos dos partidos da mesma família.
Este partido dá, ainda, um enfoque social no que tem sido a realidade dos países do Sul dizendo que as “desigualdades sociais ameaçam criar divisões entre leste e oeste, entre norte e sul da Europa”, até porque os jovens dos países mais pobres são tentados a aceitar empregos em situações precárias noutros países. Preocupação idêntica ao DP, do Luxemburgo, mas da outra ala do Parlamento, dos liberais e democratas, que lembra as dificuldades de 50% dos jovens que estão desempregados nos países do sul.
Mais à esquerda, o PCF, Partido Comunista Francês, refere Portugal como exemplo:
“Os cidadãos da Grécia, Espanha e Portugal enfrentaram corajosamente as políticas liberais, enquanto os seus governos responderam com a repressão e criminalização das lutas”.
Na Holanda, também o PvdA, da mesma família europeia, está preocupado com o efeito da crise no emprego no sul da Europa, onde os países “são os mais atingidos”. Sublinha, no entanto, que na Holanda a taxa de desemprego “aumentou mais rápidamente do que o esperado”.
A vantagem do mar e o problema da imigração
O partido de Nicholas Sarkozy, remetido à oposição depois da vitória de François Hollande em França, quer retomar não só o poder em França como na União Europeia. No manifesto, o UMP, critica a “germanização” de Hollande como tática e quer fazer vários acordos sobre imigração, no domínio nuclear e questões marítimas. É neste último ponto que realça a necessidade de alianças com Portugal e Espanha. Ainda no mundo francófono, o PS belga dedica algumas linhas aos países do Mediterrâneo porque deseja acordos sobre imigração. Do ponto de vista financeiro, limita-se a lembrar as divisões políticas criadas entre os Estados-membros por causa da crise.