Portugal já tinha tomado e anunciado publicamente a decisão de sair do programa da ‘troika’ sem programa cautelar, dois jornais internacionais e um nacional já o tinham noticiado nos dias antes, mas a decisão não era assim tão consensual. Na reunião do Eurogrupo de 5 de maio o presidente do fundo de resgate que financia Portugal colocou em dúvida, em frente aos parceiros internacionais, a escolha que Maria Luís Albuquerque defendia junto dos parceiros europeus.
Klaus Regling, presidente do Mecanismo Europeu de Estabilidade, interveio na reunião que juntava os ministros das Finanças da zona euro em Bruxelas, a 05 de maio (um dia depois do primeiro-ministro ter anunciado a decisão ao país) para questionar a escolha que Maria Luís Albuquerque defendia – e que o Governo português apoiava sem dúvidas.
Segundo apurou o Observador, o presidente do MEE sugeriu à ministra das Finanças que um programa cautelar seria melhor para ajudar o país, dada a incerteza.
Maria Luís Albuquerque não terá gostado. Na resposta, deixou o desafio: os parceiros europeus tinham, ou não, confiança em Portugal?
A questão ficou resolvida, mas na mensagem sobre o final do programa de resgate de Portugal publicada pelo MEE, Klaus Regling deixou novo alerta: “É preciso continuar os esforços para ultrapassar os persistentes níveis elevados de dívida púbica e privada, para garantir a sustentabilidade orçamental e para reduzir os atualmente altos níveis de desemprego”.
Reservas dos parceiros
A ministra das Finanças não gostou da relutância de Regling. E olhou para ela, sabe o Observador, como vinda de alguém que comanda um fundo que só tem relevância no plano europeu se estiver a financiar países em dificuldades.
Mas tudo indica que nem todos os parceiros estavam convencidos da opção de Portugal não era propriamente um segredo, e a Comissão Europeia fez questão de o afirmar mais que uma vez: era preferível um programa cautelar dada a incerteza.
O vice-presidente da Comissão Europeia, Olli Rehn, disse-o em Atenas mais uma vez, na reunião do Eurogrupo de abril, antes de suspender funções para seguir em campanha eleitoral.
As próprias reações de alguns dos líderes das finanças dos países do euro à chegada à reunião do Eurogrupo de 05 de maio, em Bruxelas, fizeram notar que a questão não era assim tão clara.
O presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, disse que tomava nota do “otimismo do Governo português” e que o apoiava, mas era preciso ter atenção às finanças públicas e não se podiam voltar a gastar o que não se tinha.
A decisão da saída limpa pareceu a certa altura o segredo mais mal guardado. O The Wall Street Journal noticiava a 25 de abril isso mesmo, a que se juntou o Financial Times a 30 de abril e ainda na semana antes o Diário Económico.
O Governo continuava a garantir que a decisão seria tomada na reunião do Conselho de Ministros convocada para esse fim-de-semana, mas já ninguém tinha dúvidas sobre qual seria a opção de saída. Dois motivos justificavam a saída limpa: em primeiro lugar, a relutância da Alemanha e mais alguns países em dar a Portugal novo apoio financeiro; por outro lado, a almofada de financiamento que o Estado esteve a construir ao longo do último ano.
A relutância alemã em aceder a um programa cautelar, especialmente tão perto das eleições europeias, voltou a fazer lembrar o caso da Irlanda. Quando Dublin abandonou o programa, estava inclinado para aceitar um cautelar, mas à última hora a Alemanha exigiu que isso fosse negociado só depois de se formar Governo na Alemanha e exigiu fortes condicionalidades no último minuto. A Irlanda não gostou e rejeitou.
No caso de Portugal, o Observador sabe que meses antes de Portugal sair do programa, altos responsáveis alemães já passavam a mensagem que Portugal não iria precisar de um programa. Mesmo quando questionados com o que se aconteceria se Portugal o pedisse, a mensagem era a mesma: isso nunca iria acontecer.
Por outro lado, desde a parte inicial do ano que o Estado tinha traçado um plano para conseguir financiamento suficiente para aguentar pelo menos um ano sem ir ao mercado, o equivalente à duração de um programa cautelar.