Estão grávidos, mãe e pai. Passam o tempo na internet à procura de dicas para ajudar a educar a criança que aí vem e já seguem mais 100 sites diferentes. Cada vez que passam numa livraria não resistem a comprar um livro sobre o assunto. A família e os amigos já ofereceram os guias, os diários e os álbuns todos que encontraram. Mas com tantas teorias diferentes, já estão perdidos no mundo da puericultura e a criança ainda nem nasceu.
Os jovens pais vão ter de optar se pegam na criança ao colo quando ela chora ou se esperam que ela resolva o problema sozinha, se a obrigam a comer ou se a deixam sem alimentos até à refeição seguinte, ou se lhe batem, castigam ou ignoram cada vez que ela diz uma asneira. Além dos livros e da internet, ainda vão ter de lidar com as opiniões dos amigos, os conselhos da sogra e as orientações do pediatra.
O pediatra Carlos González, entrevistado pelo Observador esta semana, defende que os pais se devem guiar pelo instinto em vez de comprarem livros que os ensinem a fazê-lo, apesar de ele próprio escrever livros. “É menos contraditório do que parece. Escrevo livros e digo que não é necessário comprá-los ou lê-los para criar um filho.” Escreve-os porque não concorda com os livros que se vendem em Espanha sobre este tema.
Erguem-se forças da oposição
Mas as recomendações que faz sobre a educação das crianças não reúnem consenso. Esta terça-feira, um dia depois da publicação da entrevista, o jornalista e pai de quatro filhos João Miguel Tavares já reagia no blogue Pais de Quatro que gere com a mulher, a médica Teresa Mendonça, onde prometia “verter o ódio” nos dias que se seguiriam. E verteu. Ao Observador disse que não concorda porque “é um discurso muito centrado nas necessidades das crianças.” Este pai, que vê outros pais esgotados à sua volta, diz que: “As crianças estão excessivamente mimadas e os pais passaram a orbitar em torno dos filhos.”
Antes mesmo de João Miguel Tavares continuar a sua saga de quatro post dedicados à entrevista, já se somavam os comentários dos leitores a defender algumas ideias de Carlos González, mesmo sem concordar com tudo. “Eu gostei. Mesmo que não se concorde com tudo, é sempre bom ouvir e ler outras coisas e opiniões diferentes. A mim, fazem-me pensar e ser melhor mãe”, afirma Joana Mendonça. No site do Observador Fia Mac afirmava: “Tenho a sensação que me tiraram quilos e quilo de culpa… Obrigada!”
Alguns dos comentários do blogue Pais de Quatro estão em linha com a opinião de João Miguel Tavares, contra Carlos González, entre eles os do pediatra Mário Cordeiro. “A entrevista é, toda ela, um show-off de ‘anti-sistema’, mas não há uma referência científica que ele invoque para suportar o que tão peremptoriamente afirma”, diz o pediatra. “Mesmo com os nossos erros, inconsistências e incoerências, ainda somos bons pais porque estabelecemos regras, limites, mimo e afecto, prémios e castigos proporcionados, justos e adequados.”
Mas os comentários do pediatra português não se ficaram por aqui. Os comentários jocosos em relação ao pediatra espanhol e trocas de comentários com outros leitores do blogue não foi bem vista por alguns dos seguidores. “Isto não é apenas um blogue, e você não é simplesmente um comentador casual. (…) Um comentário seu tem uma carga de autoridade que outros comentários não têm, seja num blogue, seja numa entrevista, seja num livro”, diz Anacleto, dirigindo-se a Mário Cordeiro.
É preciso impor limites
João Miguel Tavares critica a falta de castigos, porque considera que de outra forma não há limites. Mas Anacleto refere outras maneiras, incluindo o reforço positivo. Para Carlos González os afetos são privilegiados em relação aos castigos, mas não diz que não devem existir limites. “Defendo que devemos tratar os nossos filhos com carinho e respeito. Não penso que algum profissional esteja contra estes princípios. O que se passa é que alguns pensam que podem amar os filhos sem ter de lhes pegar ao colo ou consolá-los quando choram.”
Neste último ponto, o pediatra opõe-se claramente a Eduard Estivill, pediatra e especialista do sono, que defende que os bébes para dormir não precisam de colo, nem ser embalados, e mesmo que chorem os pais não devem tocar neles. Eduard Estivill diz que o método resulta em 95% dos casos. Em entrevista ao Observador, João Miguel Tavares disse também não concordar com este método.
Inês Castel-Branco, amiga de João Miguel Tavares a viver em Barcelona, colocou no Facebook do mesmo uma referência aos dois pediatras espanhóis: “Cá em Barcelona o tema está muito polarizado entre os que são a favor do pediatra Carlos González e os que são a favor do Doctor Estivill (ambos de Barcelona), e os dois grupos odeiam-se a matar. (…) Os extremos nunca são bons, e possivelmente as duas linhas podem dar-nos que pensar!”
A chave é o bom senso
Uma das leitoras do blogue Pais de Quatro cita outro autor que, tal como Carlos González, defende que os bebés podem dormir na cama dos pais. Para Susana V. (como se identifica): “O que eu gostei mais no livro foi o facto de se apelar ao bom senso, inteligência e intuição dos pais no acto de criar os filhos. Para mim isto traduz-se na seguinte regra de ouro: não devemos fazer algo porque lemos num livro, mas que vai contra a nossa sensibilidade.”
Esta parece ser a opinião generalizada dos pais que comentaram os textos de João Miguel Tavares. Pais com mais do que um filho concordam que as crianças são todas diferentes e que o que resulta com um dos irmãos, às vezes, pode não resultar com o outro. O jornalista disse ao Observador que também concorda. “Os miúdos são completamente diferentes uns dos outros. Uns têm de ser repreendidos, outros têm de ser motivados.”
Não acreditando em regras fixas, defende que cada pai deve definir o seu caminho. “Respeito muito a opinião do meu pediatra… na doença! Na saúde, a mãe sou eu! Compete-me a mim e ao meu marido educar o meu filho, não ao meu pediatra”, diz Isabel Dias no blogue e João Miguel Tavares concorda. Também não precisa que um pediatra lhe diga que deve mimar o filho, precisa é de saber como reagir quando ele se porta mal ou faz uma birra.