Hazard, Lukaku, De Bruyne, Kompany, Mertens, Fellaini, Vertonghen e Courtois. Conhece estes nomes? Se nunca tiver ouvido falar de nenhum, é porque anda distraído. Ou então não chegou a apanhar a curiosidade que, nos últimos dois anos, tem aparecido em torno da seleção belga. A campainha já deverá soar se falarmos em Axel Witsel e Steven Defour, o nome que já andou e o outro que ainda anda aos pontapé à bola na liga portuguesa. Junta-se tudo e, em talento bruto e novato (média de idades de 25,7 anos, a segunda mais jovem da prova), fica-se com a equipa que mais coisas bonitas prometia fazer no Brasil.

Bélgica: Courtois; Alderweireld, Kompany, Van Buyten e Vertoghen; Witsel, Dembele e De Bruyne; Chadli, Hazard e Lukaku

Argélia: Rais; Bouguerra, Ghoulam, Halliche e Medjani; Bentaleb, Taider e Feghouli; Soudani, Mostefa e Mahrez.

Com a bola, é certo que o fizeram. Pentearam-na com a sola do pé. Trocaram passes longos para meterem Harzard ou De Bruyne a mostrarem  grandes controlos de bola. Até Dembélé e Witsel davam lições práticas de como usar o corpo para proteger o bem precioso, enquanto driblavam por entre argelinos. Tudo bonito. E infrutífero. Com tanta coisa que prometiam fazer, o que mais se viu foram as debilidades que uma Argélia montada para estar fechada e defender conseguia destacar no estilo de jogo belga.

Ter Harzard e De Bruyne — ou Chadli, quando decidiam trocar — é bom. É mesmo ótimo. Mas, quando a bola lhes chegava, tinham sempre um ou dois argelinos a desafiá-los para que tentassem passar por ali. Um contra dois, já se sabe, é difícil. E foi quase sempre assim porque a Bélgica tem um problema crónico: só há um defesa lateral de raiz entre os 23 jogadores que levou para o Brasil. É ele Anthony Vanden Borre, que ficou no banco para Alderweireld, à direita, e Vertoghen, à esquerda, poderem jogar. Dois defesas grandes, corpulentos e habituados a estar ao centro. Ou seja, a atacar, nem se lembram de desatarem a correr para apoiarem os extremos e criarem superioridade numérica contra os argelinos.

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Resumindo, a atacar, pelas alas, a coisa emperrava. E só aos 21 minutos é que um belga se fartou de tanto bater no muro argelino. Foi Witsel, ao rematar a 30 metros da baliza, com força, para as mãos de Rais. De resto, nada. Mas a defender, pelo menos, havia segurança de sobra. Afinal, os quatro defesas foram caçados no Atlético de Madrid, Bayern de Munique, Arsenal e Tottenham. Equipas com pinta. Ou não.

Aos 24′, Vertonghen, o central dos spurs de Londres, não teve pernas para correr ao lado de Feghouli num contra-ataque argelino e, assim que chegaram à área belga, o defesa do Tottenham derrubou o médio do Valência. Penálti e 1-0 para a Argélia. Mais de 500 minutos depois, os africanos voltavam a marcar um golo no Mundial (não o faziam desde 1986). Um golo aparecia mas o jogo não se alterava. Para quê mudar? Os argelinos mantinham a fórmula. Uniam-se a defender e os médios acudiam aos laterais para impedir que as setas belgas tivessem espaço.

A estratégia resultava. E bem. Só que, de vez em quando, os belgas percebiam e conseguiam tirar a bola das alas rapidamente para a fazer chegar ao meio, onde, lá está, faltavam os argelinos que iam fazer de bombeiros às laterais. Aos 34 minutos, Witsel aproveitava e disparava o seu segundo remate perigoso, praticamente do mesmo sítio. Esta era a única fechadura argelina na qual os belgas conseguiam espreitar.

O intervalo chegava e Marc Wilmots tinha muita conversa para meter em dia. Quinze minutos de pausa parecia pouco. Se calhar foi mesmo. Do balneário saiu apenas uma alteração e Merterns trocava com Chadli para se colar à direita do ataque. Para o meio foi De Bruyne, o belga a quem cinco minutos de corrida bastam para ficar com a pele vermelha que nem um tomate. A Bélgica, agora sim, passava a ter dois rapidíssimos extremos encostados à linha. Os problemas, contudo, não mudavam.

Aos 50′, Witsel ainda cabeceou com perigo num canto favorável à Bélgica mas, aos 57′, um canto do outro lado do campo quase via Medjani a dar o 2-0 à Argélia. Um minuto depois, Wilmots farta-se de Lukaku e tira-o do relvado. Entra Origi, avançado mais virada para fintar e correr do que cabecear. É ele que aos 66′ se isola mas brinca ao tiro ao boneco com o guardião argelino. A velocidade extra no ataque belga começava a funcionar. Antes, aos 65′, Wilmots pára, pensa e apercebe-se que cometera um erro — era preciso alguém alto, com cabeça, para aproveitar tanto cruzamento que estava a ir parar à área africana. Vinham aí os 1,94m de Marrouane Fellaini.

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E, no minuto seguinte, entravam também os 1,86m de Islam Slimani. Num duelo de gigantes, só um pode vencer e foi o belga que fez questão de provar esta regra quando, aos 70′, saltou para desviar um cruzamento de De Bruyne para a área. Era o 9.º golo do médio ao 51.º encontro pela Bélgica e o remendo de Marc Wilmots resistia ao primeiro puxão. 1-1, mas nem assim os argelinos arriscaram. Com Slimani em campo, a prioridade ainda era esperar pelo erro belga, recuperar a bola e atirá-la para o avançado, que a segurava até os restantes argelinos se aproximarem de si.

A Bélgica, com o golo, mudava. E arriscava. Fellaini mostrara que o muro argelino poderia ruir e dera gás às pequenas motas que os europeus tinham no ataque. Hazard, Mertens e De Bruyne iam agitando mais as coisas. Origi também ajudava e, para a Argélia, a hipótese de perder a bola no ataque e deixar estes quatro contra-atacarem era um cenário a evitar. Mas Feghouli esqueceu-se do aviso. O argelino perdeu uma bola a meio campo, Hazard disparou com ela e, ao ver Mertens sem companhia do outro lado, à direita, endereçou-lhe a bola para o extremo do Nápoles a transformar numa seta que tinha a baliza como alvo. 2-1 e festa belga em Belo Horizonte.

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De repente, a Argélia arriscava-se a ser a sexta seleção do Mundial a marcar primeiro e a terminar um jogo a perder. Por outras palavras, juntava-se a este legado de sofrer remontadas. Confirmou-se. Os dez minutos que restavam para o final do encontro não serviram para nada que se parecesse com uma reação, enquanto os belgas iam guardando a bola e gastando o tempo como podia. Para isto havia talento de sobra nos pés e não havia nada que os africanos pudessem fazer. E apenas pela segunda vez em 22 jogos em Mundiais a Bélgica conseguia ganhar uma partida em que começara a perder. Houve progresso.

E terá de haver mais. A Bélgica tinha melhores jogadores, mais técnica nos pés e armas mais variadas para disparar do que a Argélia. Isso chegou-lhe para inverter as coisas. Mas a seleção africana mostrou como se pode anular o ímpeto da equipa europeia. Quando chegar a altura de enfrentar a matreirice e sapiência de Fabio Capello, por exemplo, os russos deverão ser bem mais eficazes a aproveitar o coxo jogo lateral belga. A não ser que Vertonghen e Alderweireld, os centrais que se mascaram de alas, aprendam a melhorar o seu disfarce.

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