Ode ao corpo. À liberdade de expressão das curvas mais e menos acentuadas, do peso em excesso, da celulite ou das cicatrizes. Em suma, é o que o naturismo defende. Tanto a expressão naturismo como nudismo significam o mesmo, embora a última tenha uma conotação negativa associada ao preconceito. Quem o diz é Rui Elvas, presidente da Federação Portuguesa de Naturismo (FPN). Aos 44 anos, o administrador de um centro canino explica que a maioria dos adeptos da prática aposta num estilo de vida onde a ausência de roupa é uma constante. O conceito não está diretamente relacionado com a natureza.

Mas porquê ser-se naturista ou nudista? “Para quem pratica é uma opção de liberdade. A pessoa sente-se desinibida, sem preconceitos”, diz Rui Elvas. Seja ela mais alta ou mais baixa, magra ou gorda, os complexos tendem a desaparecer. O facto de não existirem roupas ajuda a eliminar estratos sociais, no sentido em que não se identificam marcas, e promove a igualdade, garante o presidente da FPN, organização que existe desde 1977.

O conceito aplica-se ao dia a dia, isto é, andar nu em todo o lado, onde seja possível e legal. Rui Elvas fá-lo em casa com a família e garante que o filho Santiago, de 18 meses, foi o naturista mais novo em Portugal — está inscrito no Clube Naturista de Centro desde que nasceu, tal qual um adepto de um clube de futebol.

A prática não tem vantagens ou desvantagens para a saúde. “Não existem problemas em ter mais uns centímetros de pele ao sol e, em termos psicológicos, sentimo-nos melhores connosco próprios. É uma questão de cultura mental ao invés daquela física”, esclarece.

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Bárbara Sousa, 39, nunca teve problemas com o corpo. Talvez por isso a sua entrega ao naturismo tenha acontecido de forma natural. Há cinco anos que a empresária e o marido escolhem andar nus na praia. “Tudo começou quando uns amigos nos convidaram. Da primeira vez que o fizemos não sentimos qualquer vergonha e passámos todo o dia de praia sem qualquer preconceito”, garante ao Observador. A mãe de três crianças não estranhou ver os amigos nus e diz ainda que, em termos gerais, os corpos são todos iguais: “No naturismo não há aquela coisa de ser mais ou menos gorda. Não temos essa preocupação e não há índole sexual associada”.

Hoje em dia, os filhos de Bárbara, de 14, 12 e sete anos, também fazem naturismo. Quando o casal vai de férias são eles que dizem preferir o areal onde é permitido tirar a roupa. Por esse motivo, a família opta pela praia do Meco, nas redondezas de Lisboa, e pela do Barril, quando passam temporadas no Algarve. Bárbara explica ainda que os filhos têm perfeita noção de onde podem andar nus: “Eles sabem que é impossível fazê-lo numa praia têxtil”.

 

Naturismo no verão

Chegado o verão, é a altura de os naturistas saltarem para a praia e despirem-se de preconceitos. Mas nem todos os tapetes de areia destinam-se a receber quem tem por hábito andar, nadar ou apanhar sol nu. Ao todo existem sete praias oficiais no país: Adegas e Alteirinhos, ambas na Costa Vicentina, Barril, na Ilha de Tavira, Bela Vista, no sul da Costa da Caparica, Deserta, em Faro, Meco e a pequena praia do Salto, no litoral alentejano.

Além destas, existem outras 20 que gozam do estatuto “uso e costume naturista”. Algumas são de difícil acesso, desertas e outras ainda estão por concessionar. Em comum têm o facto de serem procuradas para a prática em questão. Como estão espalhadas ao longo da costa portuguesa, Rui Elvas escolhe algumas. A Estela é a única praia a norte do país conotada com o naturismo; no Algarve, as praias Zavial e Ilha da Amora são boas opções e a da Comporta “tem uma extensão muito grande e a parte que usamos é fantástica”.

O que antes do 25 de abril era proibido, agora chega a quase 10 mil praticantes. Há cada vez mais famílias a renderem-se à prática, explica o presidente da FPN, que diz ainda que nos últimos dois anos se tem registado um aumento de adeptos. Mas os números não são exatos, até porque suspeita-se que haja muitos naturistas na “clandestinidade”, com receio de serem criticados pelas pessoas à sua volta e, de um modo geral, pela sociedade. “Muitos dos que o são não o dizem abertamente. Isso deve-se unicamente à questão do preconceito, sobre o que as pessoas vão pensar sobre esta forma de estar”.

Posto isto, são aceites nas praias de naturismo pessoas que não têm por ambição despir-se. “Muitas dizem que preferem as nossas praias por termos um melhor ambiente, mas também há a situação em que apenas um membro do casal faz naturismo e ainda as pessoas que querem ver qual é a sensação”. Caso nenhuma das situações esteja em cima da mesa, Rui Elvas esclarece: “Sabemos que há milhares de praias em todo o país, porquê escolher de entre aquelas sete? É uma falta de respeito. Não gostamos de ver mirones”.