Afinal experiência governativa e conhecimento das instituições europeias não garantem a aprovação pacífica de uma equipa de comissários. Jean-Claude Juncker, sucessor de Durão Barroso, está a senti-lo na pele. Muitos nomeados ou comissários indigitados estão a ter dificuldades nas suas audições e em convencerem o Parlamento Europeu das suas capacidades. O inglês, o francês, o espanhol, o húngaro e a checa estão com problemas e alguns podem mesmo vir a ser substituídos.
Jonathan Hill, nomeado pelo Reino Unido, foi “vago e inconclusivo” na sua audição para comissário dos Serviços Financeiros e pode vir a protagonizar uma situação rara: ser chamado para uma segunda audição. Pelo menos, é isso que querem os eurodeputados da comissão de Assuntos Económicos e Financeiros. Esta segunda chamada é apelidada de “troca de pontos de vista” e já seguiram algumas questões adicionais para serem respondidas por escrito até à data da nova reunião. Hill, para além de ter ocupado alguns cargos de destaque no partido conservador britânico, tem um passado como lóbista que envolve a defesa de interesses do setor financeiro em Bruxelas. Mas foi também a sua falta de preparação sobre temas como a união bancária e os eurobonds – “não estou particulamente informado sobre esse tema” – que justificaram esta segunda chamada.
Ainda sem decisão está Pierre Moscovici que esta manhã enfrentou esta mesma comissão do Parlamento Europeu como nomeado para chefiar os Assuntos Económicos e Monetários (ECON). “As regras dos orçamentos têm de ser respeitadas e respeitadas por todos os Estados-membros, sem ser mais exigente com uns do que outros”, disse o francês que até há seis meses era ministro das Finanças francês – país que anunciou esta quarta-feira que afinal só vai cumprir o défice acordado de 3% em 2017, em vez de 2015, como está estipulado pelas normas europeias. O francês enfrentou, na sua audição, o ceticismo não só dos alemães, mas também dos restantes países do centro da Europa que querem estabilizar as metas do défice. Os coordenadores da ECON reuniram esta noite e acordaram em pedir novos esclarecimentos, mantendo o processo num impasse.
Já o futuro de Miguel Arias Cañete, o nomeado espanhol com a incumbência da Energia e Clima, depende agora da comissão de Assuntos Jurídicos (JURI), depois de não ter conseguido convencer na quarta-feira os eurodeputados das especificidades da sua declaração de interesses. A venda das suas participações em duas empresas petrolíferas espanholas e o envolvimento da sua família nessas mesmas empresas foi questionado múltiplas vezes, muitas delas sem respostas conclusivas – especialmente no que diz respeito aos interesses de um cunhado no mercado energético. A sua aprovação ou nova chamada para esclarecimentos só vai acontecer quando a JURI se pronunciar.
Também Věra Jourová, ex-ministra checa do Desenvolvimento, também vai ter de prestar declarações adicionais aos eurodeputados. Com a responsabilidade da pasta da Justiça nesta nova Comissão, a checa, que também foi ouvida na quarta-feira, também não convenceu na sua audição. Jourová foi acusada há oito anos de corrupção no seu país e chegou a estar presa.
Outra audição conturbada foi a de Tibor Navracsics, o nomeado húngaro, que ficará com o pelouro da Educação e da Cultura. Disse que ser europeu é “uma coisa boa” e que tem orgulho nisso, mas foi difícil fugir às acusações feitas ao governo de Victor Orbán que já disse publicamente preferir uma “democracia não-liberal”, aumentou os impostos aos meios de comunicação independentes e deixou deliberadamente de financiar algumas organizações não-governamentais. No mandato passado do Parlamento Europeu, Rui Tavares, então eurodeputado dos Verdes, foi autor de um relatório sobre alterações constitucionais no país e concluiu que não estavam a ser respeitados “os valores comuns definidos no Tratado da União Europeia”. A decisão sobre Navracsics será conhecida ainda esta quinta-feira.