Na passada quinta-feira (24) a Kering, S.A., dona da Gucci, anunciou que as vendas de artigos da marca decresceram 1,6% em relação ao mesmo período do ano anterior, contrariando a tendência das vendas gerais do grupo, que atingiram os 3,29 mil milhões de euros.

A desaceleração da venda de produtos Gucci é um fenómeno crescente: se em 2012 a marca teve um crescimento de vendas na ordem dos 16%, em 2013 as vendas cresceram apenas 7%. Este ano, de acordo com a consultora Bain, citada pelo The Wall Street Journal, as vendas da Gucci não deverão crescer mais do que 5%.

“A Gucci, neste momento, tem demasiados produtos, muitas lojas e o espetro de preços é muito alargado, quando comparado com outras marcas (…) Os produtos [da Gucci] não são mais únicos como eram antes”, considera Pierre Francois Le Louet, diretor da consultora francesa Nelly Roddi, em declarações ao jornal americano.

Mas a quebra nas vendas parece não estar a afetar apenas a Gucci. A Louis Vuitton e a Prada, igualmente especializadas em produtos de vestuário e acessórios de luxo, estão a enfrentar o mesmo problema. A empresa do grupo LVMH Moët Hennessy registou, em 2013, um crescimento praticamente nulo, quando nos dez anos anteriores crescia 10% ou mais. As vendas da marca Prada, por sua vez, também não aumentaram na primeira metade deste ano, quando no fim dos 12 meses de 2013 a marca tinha conseguido um crescimento das vendas de 32%.

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A explicação para o crescente desinteresse pelos artigos luxuosos destas marcas, não se explica apenas com a crise económica e financeira que afetou milhões de pessoas na Europa. A par da crise europeia, a redução da procura no mercado chinês foi um golpe duro nas ambições da Gucci – o governo chinês proibiu os funcionários de usarem dinheiro do Estado para comprarem bens luxuosos, muitas vezes usados como presentes para fechar negócios entre empresários. As sanções económicas impostas à Rússia, decorrentes da crise da Crimeia, também prejudicaram as vendas.

Todavia, não foram estes os principais responsáveis pelo abrandamento nas vendas da marca. Ou pelo menos, não foram eles os principais catalisadores deste fenómeno. O motivo é mais subtil.

“Eu não quero ser rotulada”, explica Paula Nonini ao The Wall Street Journal. A executiva italiana em Milão, de 35 anos, diz mesmo que “não quero que alguém na rua olhe para mim e saiba de imediato quem desenhou a minha mala e quanto eu paguei por ela”.

É identidade visual das marcas que está em causa. Os logótipos exageradamente grandes ou facilmente identificáveis estão a afastar consumidores que preferem extravagâncias mais discretas. Além disso, marcas como a Delvaux e a Celine, igualmente luxuosas, mas menos ostensivas, estão a conquistar o terreno que antes pertencia a marcas como a Gucci e a Louis Vuitton.

Valeria Battaglia, residente em Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos), partilha a opinião de Paula Nonini: “Eu penso sempre: este produto é fantástico porque eu nunca o tinha visto antes”, disse a italiana de 38 anos ao jornal norte-americano. Para consumidores como Paula Nonini e Valeria Battaglia o verdadeiro valor do produto reside no facto de ele ser luxuoso, exclusivo e único.

É nessa direção que marcas como a Gucci e a Louis Vuitton parecem querer caminhar. Quando em 2008 Patrizio di Marco foi nomeado presidente e chefe executivo da Gucci definiu uma nova visão para a marca: acabar com grande parte dos produtos de gama média e os produtos com excesso de logótipos. Em sentido inverso, a Gucci vai apostar na produção de produtos com preços mais elevados.

A Louis Vuitton, por sua vez, tem uma estratégia semelhante de valorização da gama de produtos mais cara. O objetivo é transmitir ao cliente a sensação de exclusividade quando compra um produto da marca. As edições limitadas são o reflexo dessa aposta: nomes como a fotógrafa Cindy Sherman e o arquiteto Frank Gehry já desenharam produtos para a marca, que chegam a custar 20 mil dólares (16 mil euros). Reduzir o número de lojas foi também mais um passo nesse sentido.

No entanto, recuperar o prestígio de marcas como a Gucci, a Prada e Louis Vuitton, agora algo esbatido pela sua democratização, é um desafio, como admite Patrizio di Marco: “É preciso um grande esforço para recuperar a posição de um gigante como a Gucci e continuar a crescer”.

Até porque a maior batalha destas marcas é mesmo essa: conquistar o segmento de mercado que perderam, e que inclui todos aqueles que querem ter a sensação de poder e de estatuto que estes produtos devem oferecer, sem hostilizarem os clientes de gama média-baixa. “Vai demorar tempo até conseguirmos gerir os vários tipos de consumidor”, conclui o presidente e chefe executivo da Gucci.