Jorge Sampaio está “muito apreensivo com o que se passa em Portugal”. O ex-Presidente da República escusou-se a comentar a prisão preventiva de José Sócrates, mas, em 2006, ainda enquanto líder do país, defendeu o princípio da inversão do ónus da prova em matéria fiscal — que, em fevereiro de 2012, constava num projeto lei aprovado pelo PSD e CDS no Parlamento (contra a vontade do PS) e que acabou chumbado pelo Tribunal Constitucional (TC). O mesmo que, se hoje estivesse em vigor, obrigaria o antigo primeiro-ministro a provar a origem de bens e gastos de valor superior aos rendimentos declarados.

Na sessão solene do 5 de outubro de 2006, Jorge Sampaio defendeu que a inversão do ónus da prova deveria ser aplicada a “medidas de natureza fiscal e de natureza penal”, no âmbito do “combate à corrupção”. No entender do antigo chefe de Estado, que exerceu o cargo entre 1996 e 2006, a “moralidade mais elementar e o sentimento de justiça continuarão gravemente diminuídos [enquanto] for possível exibir altos padrões de vida, luxos, e até reprováveis desperdícios, e, ao mesmo tempo, apresentar declarações fiscais de indigência”.

José Sócrates à data primeiro-ministro está hoje indiciado por sete tipos de crimes: quatro de corrupção e um de branqueamento de capitais, sendo os restantes fraude fiscal e fraude fiscal qualificada.

A inversão do ónus da prova, em suma, implicaria que um suspeito ou arguido tivesse que demonstrar que não cometeu um determinado crime, pelo qual fora indiciado ou acusado.

Logo, se a proposta de lei não tivesse sido chumbada pelo TC, a 4 de abril de 2012, o ex-governante, juntamente com Carlos Santos Silva, teria que provar eventuais rendimentos ilícitos dos quais tivesse usufruído a partir de 2012 — ano em que o diploma, uma vez aprovado, entraria em vigor. O projeto lei, aliás, estipulava que, caso o culpado desempenhasse um cargo político ou “alto cargo público” e, durante o seu exercício, fosse provado que enriquecera ilicitamente, era punido com pena de prisão de um a oito anos.

Na altura, a maioria PSD/CDS aprovou em Assembleia da República o projeto lei — o PS foi o único partido a votar contra — que, depois, Aníbal Cavaco Silva enviaria para o Tribunal Constitucional. O atual Presidente da República justificou que tinha dúvidas quanto a “eventuais riscos de lesão dos direitos fundamentais de todos os cidadãos” do diplomava que visava “a criminalização do enriquecimento ilícito”.

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