Durão Barroso não se poupou nos recados à Grécia durante a intervenção que fez esta manhã na sessão de abertura do seminário diplomático, no Museu do Oriente, em Lisboa, e admitiu mesmo a saída da Grécia da zona euro caso o governo helénico não cumpra os seus compromissos. Se esse cenário – “o pior cenário” – se concretizar, a “integração europeia teria condições para continuar a avançar”. “Espero e desejo que tal não aconteça, estou confiante que a Grécia vai cumprir as suas obrigações, mas é evidente que se não cumprir podemos ter um problema e haverá consequências”, afirmou em declarações aos jornalistas.
“Não gostei nada do que li na imprensa alemã sobre a Grécia, e vice-versa”, começou por dizer o ex-presidente da Comissão Europeia durante o discurso que fez esta manhã, referindo-se à notícia da revista Der Spiegel de que o governo alemão estaria disposto a deixar a Grécia sair da zona euro caso o Syriza venha a vencer as eleições de 25 de janeiro. Disse Barroso que o exemplo daquela notícia publicada no domingo, que citava fontes próximas de Angela Merkel, evidencia um dos atuais problemas da União Europeia – a falta de confiança e de solidariedade entre estados-membros, que foi abalada pela crise.
Mas ainda assim, Durão Barroso foi claro ao afirmar a possibilidade de os outros países que integram a comunidade virem a “desistir da Grécia”, admitindo que hoje em dia existe mais margem de manobra para a zona euro ser desmembrada sem prejuízo de o derrame se alastrar para os países vizinhos. “A verdade é que hoje a situação da zona euro é muito melhor do que era há uns anos, hoje em dia não há os riscos em termos de mercados que havia e os países já têm mais mecanismos de defesa”, declarou aos jornalistas no intervalo da sessão.
Ou seja, hoje há outro risco, que é o de os restantes Estados-membros (e a comissão europeia em si mesma) virem a “desistir da Grécia” se este país se mantiver numa situação de “incumprimento”. Como é que se pode evitar esta rutura? Durão Barroso só tem uma solução: “isto só pode ser evitado se a Grécia cumprir os seus compromissos”. Se não cumprir, disse, o projeto europeu não fica comprometido.
“A minha primeira palavra é de solidariedade, não devemos desistir da Grécia. Mas também espero que a Grécia não se coloque numa situação que seria inaceitável para os outros Estados-membros”, disse Barroso.
Questionado sobre o facto de a atual Comissão Europeia ter dito que a adesão da Grécia ao euro era “irrevogável”, Durão Barroso acrescentou uma alínea: “É irrevogável, sim, mas atenção que o euro impõe-se a determinadas regras que, se não forem cumpridas, haverá consequências”.
Durão Barroso falava esta manhã na sessão de abertura do Seminário Diplomático subordinado ao tema “Projetar Portugal”. Durante cerca de 40 minutos, o ex-presidente da Comissão Europeia falou (de improviso) dos desafios que a Europa tem pela frente – nomeadamente em função dos movimentos eurocéticos e nacionalistas que crescem a olhos vistos – mas, em final de ciclo, dedicou-se sobretudo a promover o projeto europeu perante casa cheia no Museu do Oriente, em Lisboa. Mais de uma década depois de ter assumido as rédeas dos destinos comunitários, Barroso não tem dúvidas: a União Europeia passou no teste e é hoje mais forte e mais coesa do que antes.