Há certos alimentos que desencadeiam em nós um apetite de tal ordem que se torna impossível resistir-lhes. É o caso das pipocas para algumas pessoas, do chocolate para outras ou até das pastilhas e tremoços. Mas de onde vem esta espécie de gula?
Segundo o El País, a maior parte dos estudos sugere que estes alimentos têm semelhanças com as drogas: um estudo produzido pela Universidade do Connecticut, por exemplo, deu-se conta de que as bolachas podem ser tão viciantes quanto a morfina ou a cocaína. Nos ratos utilizado na experiência, as bolachas Oreo conseguiram ativar com maior intensidade o centro de prazer do que as drogas. Esta pode, aliás ser a origem dos números alarmantes de obesidade nos Estados Unidos.
Os alimentos mais viciantes são…
Tabela 1 – Os alimentos mais viciantes, segundo o estudo “Que alimentos podem ser viciantes?“ | |||||
Alimento | Frequência de vício* | Processado | Nível glicémico | Gordura (g) | |
1 | Chocolate | 27.60 | Sim | 14 | 13 |
2 | Gelado | 27.02 | Sim | 14 | 15 |
3 | Batatas fritas | 26.94 | Sim | 21 | 19 |
4 | Pizza | 26.73 | Sim | 22 | 10 |
5 | Bolachas | 26.72 | Sim | 7 | 4 |
6 | Batatas de pacote | 25.38 | Sim | 12 | 10 |
7 | Bolos | 24.84 | Sim | 24 | 10 |
8 | Pipocas | 23.39 | Sim | 26 | 30 |
9 | Hambúrguer simples | 21.26 | Sim | 17 | 28 |
10 | Queques de chocolate | 20.81 | Sim | 29 | 19 |
* “média de vício” de acordo com a classificação dada pelos entrevistados do estudo
Este fenómeno acontece principalmente com alimentos processados, que contém altos níveis de açúcares e gordura. Por norma são esses que despertam mais a nossa gula: os primeiros quinze lugares da tabela dos mais viciantes são todos de alimentos que sofreram processamento, sendo o primeiro alimento natural viciante o queijo.
Porque é que nos viciamos na comida?
Fernando Rodríguez de Fonseca é coordenador da Rede de Transtornos Aditivos do Instituto de Saúde Carlos III. O cientista explicou que a comida com muito açúcar e gordura atua no sistema de reforço do organismo e isso faz com que tentemos mais intensivamente realizar as nossas necessidades. Trata-se de um processo muito semelhante ao que acontece com as drogas.
É através do sistema de reforço que buscamos saciar as necessidades de alimentação, de sexo e até posição social. No que toca à comida, o sistema de reforço leva-nos a procurar alimentos mais calóricos porque satisfazem mais e com mais intensidade num menor espaço de tempo. Durante o processamento da comida são introduzidos elementos que ativam esse sistema de reforço. E assim se tornam um vício, num círculo semelhante ao que acontece com os toxicodependentes.
Outro aspeto que influencia o nosso apetite exacerbado por certos alimentos é a concentração das substâncias que provocam uma reação de recompensa no organismo. Quando a comida é processada potencia-se o efeito das substâncias aditivas da comida ou acrescentam-se elementos capazes de proporcionar essa reação de recompensa. Quanto maior a concentração desses elementos, maior o vício que provocam.
Ainda mais um motivo para a nossa gula: os alimentos viciantes são absorvidos mais rapidamente pelo organismo e os seus componentes entram mais depressa na corrente sanguínea. Os alimentos processados produzem um pico de açúcar no sangue: e quanto maior a concentração de glucose na circulação, maior é a ativação da parte do cérebro responsável pelo vício.
Para provar estes argumentos, os cientistas estudaram o efeito de uma folha de coca e compararam-no com o que acontece com a cocaína. Descobriram que a folha da planta é muito menos viciante do que o alcaloide, porque este último é tratado em laboratório. Ou seja, os produtos naturais são menos viciantes que os processados.
Um problema sério
Parece exagerado comparar o efeito da comida com o da droga. De facto, os químicos existentes nas substâncias aditivas atuam diretamente no sistema de recompensa, sendo portanto mais perigosos. Já a comida necessita de hormonas como a leptina para produzir algum efeito no cérebro e o perigo é bem menor. Mas nem por isso menos sério.
O vício por comida pode ter consequências sérias no corpo humano. Conforme explica a Authority Nutrition, quando deixamos de controlar o impulso para comer certos alimentos – principalmente fast food – o resultado é uma adição realmente parecida com a toxicodependência. E isto acontece porque ambas as adições envolvem as mesmas áreas cerebrais, os mesmos neurotransmissores e até sintomas semelhantes.
As consequências físicas são obesidade, diabetes, doenças de coração, cancro, problemas de artrite, Alzheimer ou depressão. Além disso, têm repercussões psicológicos, como problemas de autoestima e uma constante sensação de infelicidade e insatisfação.
Os sintomas
A Authority Nutrition lista oito sintomas que podem indicar que está viciado em comida e que deve procurar ajuda para moderar a adição.
- Sente desejos frequentes por certos alimentos, mesmo quando está satisfeito depois de uma refeição.
- Começa a comer alguma coisa e, quando dá por si, ingeriu quantidades muito superiores à prevista.
- Sente-se excessivamente cheio depois de comer.
- Sente-se culpado depois de comer certos alimentos, mas cai no vício rapidamente de novo.
- Procura justificações para comer determinada comida.
- Já experimentou seguir um novo regime alimentar, mas nunca consegue levá-lo avante.
- Tenta comer às escondidas, para que os outros não reparem nos seus hábitos alimentares.
- Tem noção do perigo do fast food e mesmo assim não a consegue desprezar.
Identificou-se com pelo menos quatro destes tópicos? Então está a tornar-se viciado em comida e pode necessitar de ajuda dos especialistas.
Para tal, existem algumas entidades especializadas no assunto: Overeaters Anonymous, Greysheeters Anonymous ou a Food Addicts in Recovery Anonymous são alguns deles.