Nos últimos anos aconteceu de um tudo um pouco no Cais do Sodré, em Lisboa. Pintou-se uma rua, abriram-se bares, mudaram-se horários, houve protestos, abriram-se mais bares e a zona da cidade anteriormente conhecida como Cata que Farás (um topónimo que continua, oficialmente, por explicar) foi tomando o lugar do Bairro Alto como destino noturno de eleição de boa parte dos turistas e locais. Esquecida, no meio deste nouveau rebuliço, parece ter ficado a raiz libertina daquela zona, que, durante boa parte do século XX serviu de abrigo a marinheiros em trânsito pela capital e, consequentemente, de negócio a um conjunto considerável de prostitutas — algumas, poucas, ainda vão resistindo à supracitada transformação do bairro.

Vem este enquadramento histórico a propósito d’A Viagem, o mais recente (ou um dos mais recentes, que isto no Cais do Sodré nunca se sabe) projeto a abrir portas em plena Travessa da Ribeira Nova, junto à Praça de São Paulo. Este bar, que também é petisqueira, não esquece o que o Cais do Sodré foi. Daí que a viagem de que fala o nome seja uma forma de homenagear a época em que pelas ruas do bairro passeavam (e não só) marinheiros de diversas latitudes.

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Ao leme d’A Viagem — e a expressão não podia ser outra — estão Nuno Ventura e Sebastião Braga, dois amigos com backgrounds completamente distintos: design e filosofia, respetivamente. “Vim viver para o Cais do Sodré há cinco anos e desde essa altura que tenho vontade de abrir algo aqui”, conta Nuno, que foi espalhando por quem lhe estava próximo a demanda por um sócio que se quisesse juntar à expedição. Sebastião, que até já tinha experiência na área da restauração, acedeu ao desafio e subiu a bordo.

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O arranque não foi tão imediato quanto desejariam. “Estivemos um ano até conseguir abrir”, dizem. O espaço, um antigo armazém que guarda histórias mirabolantes (e impublicáveis) do antigo Cais do Sodré, foi decorado com elementos desencantados em locais tão improváveis como um cemitério de barcos. Mas não é tudo. “Temos o nosso próprio wonder cabinet, onde juntamos algumas coisas que recolhemos em viagens e outras que amigos nossos nos trazem de diversos países”, conta Sebastião. São as três prateleiras à esquerda de quem entra, fica a saber, caso a curiosidade aperte.

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A ideia d’A Viagem é marcar a diferença em relação aos vizinhos do bairro, não só ao evocar a memória de outros tempos mas também por permitir — mantendo a linguagem náutica — navegar em águas mais calmas do que noutras portas. Ou seja, é possível sentar, conversar, ouvir música — que pode ser ao vivo ou vir da seleção de vinis da casa –e fazer tudo isso sem descurar o estômago. Para tal, a carta inclui uma série de conservas (muxama, cavala ou lulas recheadas, entre outras), tostas, tibornas e tábuas de queijos e enchidos. Já a sede mata-se de todas as maneiras possíveis: vinho da pipa (que não é da pipa, mas quase), cerveja, sem esquecer, claro, as bebidas favoritas de quem costuma lançar âncora, como o rum ou o gin.

Quando a embarcação estiver em alto mar e atingir velocidade de cruzeiro — que é como quem diz, quando estiver tudo estabilizado, depois das primeiras semanas em funcionamento — será normal assistir a noites temáticas, dedicadas a diversos países. Para que A Viagem (passe a redundância) seja constante e variada e os viajantes se esqueçam, por momentos, que estão no Cais do Sodré. Sem nunca esquecerem, contudo, que estão no Cais do Sodré.

Nome: A Viagem
Morada: Travessa da Ribeira Nova, 30 (Cais do Sodré), Lisboa
Telefone: 96 006 9906 / 91 6078080
Horário: De terça a sábado, das 12h00 às 02h00