Afinal, emigração rima com quê? Com “vontade”, “prazer” e “valorização” ou com “indignação” e “frustração”? A pergunta foi feita pelo deputado do PS Miguel Laranjeiro ao ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, que esteve esta terça-feira a ser ouvido pelos deputados da comissão parlamentar competente, naquela que foi a sua última audição da legislatura. Mas a resposta não foi consensual. Governo e maioria procuraram distinguir emigração por razões económicas, fruto da crise, da “emigração por vontade e não por necessidade”, enquanto oposição acusou o Governo de “aflorar” o drama da emigração.
Negando estar a “menosprezar” o fenómeno, Miguel Poiares Maduro foi à comissão parlamentar de Ética, Cidadania e Comunicação “tratar os dados da emigração com frieza”. “A realidade é que houve um aumento da emigração durante os últimos anos, que era inevitável em função da situação profunda de crise que o país atingiu em 2011, mas que não é o aumento que tem sido frequentemente referido de forma demagógica”, disse, avançando um número: 13 mil novos emigrantes, em média, ao longo dos três anos da crise, em comparação com os três anos anteriores a 2008.
“Durante o auge da crise, entre 2011 e 2013, emigraram em média anual 95 mil portugueses, e nos três anos que antecederam a crise de 2008 emigraram em media anual 82 mil”, disse.
Segundo Poiares Maduro, o aumento “continua a ser problemático” mas não se refere apenas a saídas do país “por necessidade”, mas também a algumas “por vontade e por escolha”. “Há uma parte da emigração que é motivada por razões económicas, mas também há outra que é por razões estruturais de pertença a um espaço de mobilidade como é a União Europeia”, disse, sublinhando que a “melhor forma” de combater a emigração por necessidade é “continuar a pôr o país na senda da recuperação económica”, mas incitando também os deputados da oposição a pensar no fenómeno da emigração com base em “todos os restantes pontos de vista”.
Nessa base, o ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional avançou que uma das medidas que está prevista no novo Plano Estratégico para as Migrações é o alargamento dos fundos comunitários aos cidadãos portugueses não residentes, nomeadamente no que diz respeito ao acesso a projetos de empreendedorismo, “com vista a tirar partido dos portugueses que vivem lá fora, que se integraram no país estrangeiro muitos deles já não por necessidade económica, mas por uma questão de escolha”, explicou. Uma das propostas passa por exemplo por, acrescentou, disponibilizar ações de formação para aqueles que se querem candidatar a projetos de empreendedorismo com fundos comunitários nacionais.
O discurso, no entanto, não colheu junto da oposição, que acusou o Governo de ser “insensível” e de ver o “drama da emigração” de forma diferente consoante esteja no Governo ou na oposição. E que contestou os números. “Quando o PSD estava na oposição a emigração era um drama muito grande, agora tentam aflorar um bocadinho a coisa”, atirou o deputado comunista João Ramos. Antes, já o deputado do PS Miguel Laranjeiro tinha afirmado que, enquanto que para o Governo, “emigração rima com prazer, com vontade, com demagogia e valorização, para o país rima com indignação, frustração e sobrevivência”.
“As centenas de jovens que são vistos diariamente nos aeroportos a sair do país estão a sair da sua zona de conforto, estão a emigrar não para fazer turismo, mas para sobreviver. O que tem a dizer a estas pessoas que saem não por prazer mas por necessidade?”, questionou o deputado socialista Miguel Laranjeiro depois de classificar as afirmações do Governo e da maioria de “intervenções de aço” e “insensíveis”.
Acusando o ministro de pôr “tudo no mesmo saco”, desde mobilidade por Erasmus a emigração por razões económicas, a deputada socialista Inês de Medeiros acusou ainda a intervenção de Poiares Maduro de ser “no mínimo insultuosa para aqueles que, depois de terem feito os Erasmus todos, tiveram de emigrar não por gosto mas por necessidade”. Inês de Medeiros ainda mostrou outros dados diferentes da emigração, mas o ministro recusou-se a fazer comparações “de ano para ano” porque isso não seria discutir de forma “séria”. “Para isso também dizia que a emigração foi maior no último ano em que António Costa esteve no Governo do que no primeiro ano do atual Governo”, atirou.
* atualizado às 15h00