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Educação. Mais "rigor" e avaliações para alunos e professores valem chumbo ao ministro

Este artigo tem mais de 5 anos

As palavras "rigor" e "exigência" têm dominado o discurso de Crato, servindo de mote para muitas das medidas ao longo do mandato. A polémica estalou várias vezes e valeu nota negativa ao matemático.

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MARIO CALDEIRA/LUSA

MARIO CALDEIRA/LUSA

Não se pode acusar Nuno Crato de não ter feito nada na educação. As medidas foram-se multiplicando ao longo do mandato e as novidades tocaram a todos: alunos, professores e diretores escolares. O matemático introduziu exames novos, para alunos e professores, alterou as metas e os programas escolares, dificultando a matéria, deu mais autonomia às escolas (ou tentou) e cometeu erros. Um deles fê-lo apresentar a demissão. E com o mandato a chegar ao fim, as desavenças, as críticas e insultos continuam.

Ana Benavente, deputada pelo Partido Socialista até 2005, e ex-secretária de Estado da Educação de Marçal Grilo, não poupa críticas à atuação deste Executivo. “Não houve nada de bom. A pobreza sente-se brutalmente nas escolas, os meninos entram em competição uns com os outros desde os seis anos, houve um retrocesso à escola do passado como nunca imaginei ser possível. As escolas estão exaustas e mais pobres, sem professores e todos os mais vulneráveis – incluindo os meninos da educação especial, os mais pobres, claro – foram quem mais sofreu.”

A investigadora apontou, ao Observador, outras medidas levadas a cabo a pensar na poupança. “Desde o aumento do número de alunos por turma, ao aumento das horas de trabalho dos docentes, à dispensa de milhares de professores (com o desaparecimento das áreas curriculares não disciplinares e do apoio escolar aos alunos), à criação sistemática de uma gestão dos mega-agrupamentos”, elencou.

Ana Benavente, que integrou um Governo de António Guterres, não está sozinha nas críticas, mas Nuno Crato tem resistido a todas elas, respondendo algumas vezes. “Não é escola do passado. É uma escola mais moderna! Olhe para o que se passa nos países mais avançados do mundo, em Singapura, nos EUA, em Inglaterra. Olhe para as recomendações da OCDE e elas vão todas neste sentido: dar atenção às disciplinas fundamentais, haver avaliação externa, poder haver transdisciplinaridade mas sem esquecer aquilo que é essencial”, justificou-se o governante, citado pelo Público.

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Já Joaquim Azevedo, ex-secretário de Estado dos Ensino Básico e Secundário do ministro Couto dos Santos, reconhece alguns progressos nomeadamente ao nível do “número de alunos do nível secundário e, em particular, dos que frequentam o ensino profissional” e da “racionalização da rede, com a concentração vertical das escolas, o que facilitou, em muitos casos, uma melhor gestão dos recursos ao serviço da qualidade de ensino e das aprendizagens”. Ainda que admita que, em alguns casos, a concentração vertical tenha resultado na incorporação de “demasiadas unidades de ensino, sem qualquer possibilidade de, a curto e médio prazo, ser feita uma coordenação e gestão eficientes e eficazes”.

Avaliação, avaliação e mais avaliação

Além da conclusão do processo de agrupamento de escolas, Nuno Crato aumentou de 21 para 212 o número de escolas com contrato de autonomia – ainda que os diretores continuem a pedir mais autonomia – e deu maior liberdade na definição do tempo de cada unidade letiva e da carga horária anual de cada disciplina, e assegurou disciplinas como o Português e a Matemática com mais horas e mais matéria.

A par de tudo isto introduziu exames no 4.º e no 6º anos a português e a matemática. A ex-secretária de Estado manifestou-se ainda contra “a introdução de exames finais em todos os finais de ciclo”, pois, segundo ela, “este modo de avaliação influencia e modela as práticas de ensino-aprendizagem e está na base da exclusão e do fracasso escolar de muitos alunos, como há poucos meses referia o Conselho Nacional de Educação.

“Não temos uma escola democrática, temos sim, uma escola meritocrática em que só os “melhores”, vindos de meios sociais com melhores condições de vida “merecem” aprender”, resumiu Ana Benavente.

Também para Joaquim Azevedo, “a prática generalizada de exames nacionais, como bastião central de uma política pública de educação, tem sido perversa para a qualidade do ensino e das aprendizagens”.

Taxa de abandono precoce em queda. Adultos sem uma “política clara”

A taxa de abandono escolar precoce – percentagem de jovens dos 18 aos 24 anos que não estão a estudar nem acabaram pelo menos o secundário – tem caído em flecha na última década e nestes últimos anos não desviou a trajetória. Em 2014, a taxa em Portugal rondava os 17,4%, menos de metade da taxa registada em 2004.

Ainda recentemente, a propósito da evolução positiva deste indicador, o Ministério da Educação sublinhou que o apoio prestado a alunos que demonstram as primeiras dificuldades “e sobretudo a existência” de um período de acompanhamento extraordinário, disponível para os alunos que chumbam nas provas finais, terá contribuído para a descida do abandono e retenção.

Mas apesar deste comportamento exemplar da taxa, Portugal tinha ainda em 2014 a quarta maior taxa de abandono escolar precoce da União Europeia (UE), segundo o Eurostat.

Ainda os mesmos números do Eurostat confirmam que o país tem sido consistentemente o Estado membro da União a 28 que melhor desempenho tem registado no combate a este indicador negativo.

Outro dos indicadores que tem evoluído também positivamente é o da cobertura do pré-escolar. Em 2013, 90,6% das crianças a partir dos cinco anos estavam inscritas.

E em 2016/2017 o pré-escolar será gratuito também para crianças a partir dos quatro anos e o objetivo para a próxima legislatura, caso o PSD e o CDS/PP vençam, “será a universalização do pré-escolar a partir dos três anos”.

Mas se a verdade é que para as crianças as medidas se vão multiplicando, e com resultados à vista, o mesmo não acontece no que diz respeito aos adultos.

“Continuamos a não ter uma política clara e duradoura para a educação dos adultos, apesar de termos uma população com uma muito baixa escolarização e uma oferta escolar instalada que está e estará sobredimensionada”, afirma Joaquim Azevedo.

Também a investigadora Ana Benavente destaca o erro que foi ter eliminado os “Centros de Novas Oportunidades, bem como qualquer outro modo de recuperação da escolaridade, estando hoje mais de 100.000 adultos sem qualquer resposta educativa”.

Mais professores nos quadros não trava contestação

Um dos aspetos que Nuno Crato tem sublinhado sempre que é acusado de “despedir” docentes, tem a ver com os concursos de vinculação extraordinária levados a cabo nos últimos anos, por forma a dar cumprimento a uma exigência da Comissão Europeia, com o objetivo de dar estabilidade aos docentes que trabalham há vários anos nas escolas públicas. Em toda a legislatura foram vinculados 4.197 docentes.

O Ministério de Nuno Crato começou por colocar nos quadros, através de um concurso de vinculação extraordinário, 603 docentes, em 2013, e logo no ano seguinte, em 2014, vinculou 1.954 educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário.

Este ano entrou em vigor a chamada “norma-travão”. Todos os professores que tenham trabalhado cinco ou mais anos letivos seguidos com horários completos e anuais numa escola e no mesmo grupo de recrutamento passam para os quadros de zona pedagógica. Acontece que as regras estabelecidas têm resultado em “injustiças”, com professores com menos anos de serviço a passarem à frente de outros com mais anos, que os sindicatos têm denunciado.

Reorganização da rede de ensino continua por fazer

No que diz respeito ao ensino superior, foi mais o que ficou por fazer. “Era mesmo preciso promover uma revisão inteligente da rede do ensino superior, envolvendo politécnicos e universidades, tendo por base a validade de ambos os modelos”, defendeu Joaquim Azevedo.

A reorganização da rede do ensino superior, a par da revisão do modelo de financiamento, eram, aliás, bandeiras deste governante que, em 2014, chegou a apresentar um plano de “ataque”, que continua por discutir e implementar, à semelhança do que aconteceu com governos anteriores. O modelo de financiamento também está para ser apresentado. Tirando algumas iniciativas pontuais que partiram de instituições de ensino superior, no sentido de cooperarem entre si, e a criação dos cursos técnicos superiores de dois anos nos institutos politécnicos, pouco ou nada foi feito.

Com o número de diplomados no Ensino Superior em crescendo, embora o de candidatos esteja com o travão acionado, uma das matérias que mereceu a atenção deste governo foi a das bolsas de ação social. Entre as medidas mais importantes estão o fim do critério de indeferimento relacionado com as dívidas contributivas ou fiscais do agregado familiar, em janeiro de 2014, e que permitiu a atribuição de mais cerca de 5.000 bolsas.

E, mais recentemente, o aumento do limiar de elegibilidade em cerca de 420 euros, aumentando desta forma o universo de candidatos com bolsa de estudo no próximo ano letivo, bem como a atribuição do complemento de alojamento aos bolseiros deslocados durante 11 meses, e não 10.

O que se verifica nos dados relativos à despesa com esta rubrica é que depois de uma grande quebra entre 2010 e 2012, a verba voltou a subir.

Mais do que os resultados, as polémicas

Mas mais do que resultados, as várias medidas implementadas por Nuno Crato valeram sim verdadeiras polémicas e confrontos, sobretudo com os sindicatos dos professores.

Desde logo, a Prova de Avaliação de Capacidades e Conhecimentos (PACC), para professores contratados com menos de cinco anos de serviço, que só entrou em pleno vigor em dezembro de 2014, depois de em dezembro de 2013 ter decorrido a meio gás, por causa da greve levada a cabo pela Fenprof e das providências cautelares interpostas por este sindicato e aceites pelo tribunal numa primeira instância, que impediram a realização da componente específica nesse ano.

Mas o momento, provavelmente, mais difícil de Nuno Crato enquanto ministro foi no início do ano letivo que agora terminou. A polémica está bem presente na memória de todos. Um erro na fórmula de cálculo de ordenação dos docentes na Bolsa de Contratação de Escola (utilizada por escolas com autonomia e em territórios de intervenção prioritária) levou a um atraso sem paralelo no arranque das aulas em cerca de um terço das escolas públicas. Houve alunos que ficaram sem aulas mais de um mês e por causa disso foram dadas aulas de compensação em várias escolas ao longo do ano letivo.

Nessa altura Nuno Crato chegou a desabafar publicamente que não tinha um trabalho “confortável” e pediu desculpa à comunidade educativa. Em privado, apresentou a demissão ao primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, que reforçou a confiança no governante.

Texto: Marlene Carriço

Infografia: Milton Cappelletti

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