A realizadora e jornalista Laura Poitras moveu um processo judicial contra os Estados Unidos após seis anos de “perseguição kafkiana”. A autora de “Citizenfour”, filme sobre Edward Snowden que lhe valeu este ano o Óscar de Melhor Documentário, queixa-se de mais de 50 revistas e interrogatórios indevidos nos aeroportos americanos, e material aprendido sucessivamente, sem qualquer explicação oficial.
Não se pode dizer que o governo americano seja fã de Laura Poitras. Americana a residir em Berlim, entre 2006 e 2014 a realizadora produziu três documentários relacionados com o ataque às Torres Gémeas de 11 de Setembro de 2001 e a “guerra ao terror” iniciada pelos EUA. “My Country, My Country”, de 2006, e “The Oath”, de 2010, ficaram completos com “Citizenfour”, este centrado em Edward Snowden, que denunciou o sistema global de vigilância eletrónica da espionagem americana, via Agência de Segurança Nacional (NSA).
Por “Citizenfour”, Laura Poitras venceu um Pulitzer, o BAFTA e o Óscar de Melhor Documentário. Mas entre 2006 e 2012, foi retida na fronteira “de cada vez que entrou no país” para trabalhar nos documentários. O material eletrónico era confiscado, copiado e por vezes retido durante 41 dias. O calvário só terminou quando o jornalista Glenn Greenwald publicou um artigo sobre o caso.
Três anos depois da última paragem forçada, Laura Poitras não desiste de obter uma explicação e quer saber porque é que, sem qualquer cadastro criminal ou acusação, teve de ser sujeita a tratamento abusivo por parte das autoridades. Por isso, acionou uma providência cautelar, ao abrigo da Lei da Liberdade de Informação, pode ler-se na ação, disponibilizada na página da organização Electronic Frontier Foundation, que está a representar a realizadora.
“Movo este processo porque o governo usa a fronteira americana para contornar a lei“, justificou a também jornalista. “Isto simplesmente não deveria ser tolerado em democracia”, disse, acrescentando que também está a mover este processo em nome de todos os anónimos que também são submetidos a anos de “perseguição kafkiana”. “Temos o direito de saber como é que este sistema funciona e porque somos alvos”.
Para David Sobel, da Electronic Frontier Foundation, o governo “usou o poder que tem para reter pessoas nos aeroportos em nome da segurança nacional para atingir uma jornalista cujo trabalho se tem focado nos efeitos da ‘guerra ao terror’ americana”. Foi inserida nessa estratégia pós-11 de Setembro que o presidente George W. Bush aprovou, em 2001, o polémico “Patriot Act”, que, entre outras medidas, passou a permitir uma vasta recolha de dados sem autorização da Justiça.