O secretário de Estado norte-americano estará na sexta-feira em Cuba para uma visita histórica que pretende reforçar o diálogo diplomático recentemente iniciado com Havana, mas que também mostra os grandes assuntos que continuam pendentes entre os dois países.

Quando chegar a Havana, no próximo dia 14 de agosto, John Kerry irá tornar-se no primeiro chefe da diplomacia norte-americana a visitar a ilha caribenha em 70 anos, desde 1945.

Durante a breve visita à capital cubana — o secretário de Estado norte-americano vai e regressa no mesmo dia -, Kerry irá presidir à cerimónia do içar da bandeira da embaixada dos Estados Unidos, algo que não acontece há 56 anos.

“A cerimónia de 14 de agosto não significa o fim das diferenças que separam os dois governos, mas reflete a realidade de que a Guerra Fria acabou há muito tempo e que o diálogo é melhor que o distanciamento”, afirmou, citado pela agência espanhola EFE, o porta-voz adjunto do Departamento de Estado, Mark Toner.

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O próprio John Kerry afirmou, em julho último, que os EUA desejam manter “relações de boa vizinhança” com Cuba, tendo admitido, na mesma ocasião, que a normalização total das relações entre os dois países será “longa e complexa”.

A visita de Kerry a Havana é o culminar de um processo que deu os primeiros passos a 17 de dezembro de 2014, dia em que os Presidentes norte-americano e cubano, Barack Obama e Raul Castro, respetivamente, anunciaram ao mundo, em simultâneo, que os dois países iam iniciar negociações para o restabelecimento de relações diplomáticas, que estavam suspensas desde 1961.

Após vários meses de conversações, Obama e Castro confirmaram, a 01 de julho deste ano, o restabelecimento das relações diplomáticas e a abertura de embaixadas, medida que seria uma realidade alguns dias mais tarde.

A 20 de julho, a bandeira cubana é colocada no átrio do edifício do Departamento de Estado norte-americano, local onde estão as bandeiras de todos os países com relações diplomáticas com os Estados Unidos, e as secções de interesses nas respetivas capitais assumem o estatuto de embaixadas.

Até ao momento, o Departamento de Estado apenas indicou, sem especificar, que Kerry terá em Havana encontros com altos responsáveis do governo cubano.

É expectável que um desses encontros seja com o seu homólogo cubano, Bruno Rodriguez, que esteve em Washington a 20 de julho.

Pouco provável será um eventual encontro com o líder cubano, Raul Castro, uma vez que Rodriguez não foi recebido em julho por Obama e “o tratamento igualitário é um princípio importante para os cubanos”, referiu William LeoGrande, um especialista em questões cubanas da American University, também citado pela EFE.

Para outro especialista, Michael Shifter, presidente do centro de estudos Diálogo Interamericano, a visita de Kerry será “principalmente diplomática” e estará centrada “no protocolo e no trabalho com o homólogo Bruno Rodriguez”.

Uma das hipóteses colocada pelos especialistas é um eventual encontro entre Kerry e dissidentes cubanos.

“Se Kerry reunir-se com alguns dissidentes, é provável que o faça em privado, e tendo em conta a reação nos EUA. Mas [Kerry] está consciente que é uma questão sensível e terá cuidado para não gerar tensões ou estragar o objetivo de alcançar uma normalização completa das relações”, sublinhou Shifter, que também acredita que o chefe da diplomacia norte-americana poderá mencionar “de forma diplomática” e “num tom positivo”, no discurso na embaixada, os desafios que Havana ainda enfrenta em matéria de Direitos Humanos.

Mas, os Direitos Humanos não são os únicos temas sensíveis da relação Washington/Havana.

Tanto os Estados Unidos como Cuba reconhecem que o processo de normalização só poderá ser finalizado com a total eliminação do embargo económico e financeiro norte-americano, algo que depende do Congresso norte-americano.

Decretado em fevereiro de 1962, e severamente reforçado pela lei Helms-Burton de 1996, o embargo norte-americano é frequentemente denunciado pelo regime de Havana como um obstáculo ao desenvolvimento da ilha caribenha, com prejuízos estimados superiores a 100 mil milhões de dólares (cerca de 89 mil milhões de euros).

Havana também reclama a restituição do território onde se encontra a base norte-americana de Guantánamo, localizada no sul da ilha de Cuba.

Sobre este assunto, John Kerry afirmou, em julho passado, que “neste momento, não existe a intenção por parte dos EUA de alterar o tratado de localização” de Guantánamo.

Outras questões pendentes na relação dos dois países passam por áreas como o tráfico de seres humanos ou as telecomunicações, mas também pelos diversos pedidos de indemnização feitos pelos dois lados.