A vitória de Jeremy Corbyn como novo líder do Partido Trabalhista no Reino Unido está a ser entusiasticamente aplaudida pelo Bloco de Esquerda, enquanto o seu partido-irmão em Portugal, o PS, reage publicamente com cautelas. Corbyn tem propostas que o PS não subscreve como a saída da NATO e o BCE imprimir dinheiro para emprestar, não a bancos, mas diretamente à sociedade como estímulo à economia.
“Para o melhor ou para o pior, representa uma viragem importante, logo veremos se duradoura”, afirma ao Observador o líder parlamentar do PS, Eduardo Ferro Rodrigues, enquanto que Sérgio Sousa Pinto, presidente da comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros e membro do secretariado nacional socialista, limita-se a dizer: “O PS felicita-o e deseja-lhe os maiores êxitos políticos”.
A eurodeputada Ana Gomes, por seu lado, que não faz parte desta direção de António Costa, vê vantagens apesar dos riscos. Considera ser “muito significativo que o Partido Trabalhista queira ver-se livre de políticas neoliberais dos responsáveis políticos anteriores” pois é um “sinal” importante quer para a União Europeia e para Portugal. “Pessoalmente, tenho muitas dúvidas que seja bom para o Partido Trabalhista e para a Europa a sua agenda anti-europeia. Vai ser negativo”, acrescenta ao Observador.
Jeremy Corbyn é um dos líderes mais à esquerda que o Partido Trabalhista teve nas últimas décadas. No PS, há mesmo quem compare esta viragem ao que sucedeu depois de Margaret Thatcher ter sido eleita primeira-ministra. As eleições de 1983 para a liderança do Partido Trabalhista ficaram conhecidas como “The longest suicide note in history” porque o programa apresentado por Michael Foot era demasiado à esquerda. Chamava-se oficialmente “Uma nova esperança para o Reino Unido” e defendia o desarmamente nuclear unilateral, a saída da CEE, abolição da Câmara dos Lordes e a renacionalização de empresas, à altura, recém-privatizadas como a British Telecom.
Ora, se no PS Corbyn é visto com desconfiança, entre o BE é aplaudido. A eurodeputada Marisa Matias, num vídeo colocado este sábado no Esquerda.net, considera que se trata de “uma notícia muito importante para a Europa”.
“Conhecemos muito bem o seu percurso. Estivemos juntos num conjunto de ações, em várias iniciativas organizadas no Reino Unido contra a austeridade. A nosso convite, [Corbyn] esteve no Porto numa conferência sobre a crise financeira [Conferência O euro e a crise das dívidas, em 2011]. E esteve em Lisboa numa concentração contra a NATO”, lembra, considerando que a sua carreira foi sempre “coerente”.
“Sabemos bem que é do mesmo partido que Tony Blair, que apoiou as privatizações e a guerra do Iraque, mas [Corbyn] teve sempre uma posição crítica e coerente, uma posição que reconhece que as instituições europeias são anti-democráticas e que foi esta Europa que nos trouxe à situação em que vivemos atualmente. Ao contrário do que acontece com o PS, no Partido Trabalhista esse setor crítico e coerente é hoje maioritário mesmo que Jeremy Corbyn tenha que enfrentar os barões do partido”, explica.
O Bloco de Esquerda “congratula-se com a vitória” e deseja que o mandato do novo líder “honre a tradição da esquerda na Europa”. É assim que termina a declaração.