Paulo Portas prometeu-o no domingo pela hora de almoço, e cumpriu-o logo à hora de jantar. “Vou ter sempre uma palavrinha para o líder da oposição no início das minhas intervenções”, avisou aos jornalistas e aos militantes que o ouviam num comício na Malveira. E assim foi: o discurso da coligação contra o PS de António Costa endureceu, com Portas a acusar os socialistas de serem “ultra-liberais” e Passos a dirigir-se ao líder da oposição para lhe pedir que “repensasse” e se sentasse à mesa, depois da eleições, para pensar uma reforma para a Segurança Social. No dia em que arrancou oficialmente a campanha, o discurso da coligação focou-se no PS – quase não há espaço para promessas.
“Olhando para o programa do PS para a segurança social, apetece-me dizer: os socialistas foram tomados de assalto por um grupo de ultra-liberais com folhas de Excel e, pimba, sai um corte de seis mil milhões na sustentabilidade das atuais pensões e a incógnita do corte de 1020 milhões que vai afetar os apoios aos mais desfavorecidos. Como sociais-democratas e democratas-cristãos tenho de concluir que um grupo de ultra-liberais apanhou um avião em Harvard, aterrou no largo do Rato e tomou conta deles”. Foi assim, desta forma direta, que Portas atirou contra os socialistas no dia de arranque oficial da campanha, dando o mote à coligação.
Domingo à noite, cumprindo o que tinha prometido no que à “palavrinha” a António Costa diz respeito, Portas voltou a pegar no líder do PS para iniciar a sua intervenção em Torres Vedras. Desta vez por causa da promessa de Costa de reavaliar as portagens do interior. Costa prometeu, e Portas não perdoou, lembrando que Passos foi recentemente à região centro prometer uma discriminação positiva nas regiões do interior e, “achando que tinha de ir mais longe, o dr. António Costa foi dizer que ia acabar com as portagens. Então não tinha dito que ia usar o dinheiro das portagens para financiar a Segurança Social?”, atirou.
A ideia é estar atento a todos os deslizes do líder socialista e não os largar. Aconteceu com a recusa de Costa em viabilizar o Orçamento do Estado em caso de derrota eleitoral, com o corte de 1.020 milhões de euros nas prestações sociais não contributivas que vem escrito no programa socialista e com a recusa do PS de negociar uma reforma da Segurança Social. Temas que continuam firmes nos discursos da coligação. E voltou a acontecer esta noite, com a promessa de Costa de reavaliar as portagens no interior.
Passos tenta falar de futuro
Se Portas atira a Costa, Passos procura centrar o discurso no day after, ao jeito do famoso “que se lixem as eleições” que soltou em vésperas de europeias. Dado o tiro de partida da campanha, está claro que a coligação vai querer tirar proveito da recusa de Costa em dialogar e é ai que entra o presidente do PSD e ainda primeiro-ministro. Depois de ter dado a entender que viabilizaria um orçamento da oposição porque “não faz oposição ao país”, Passos viria depois a deixar um apelo ao adversário: para “repensar” o que disse em relação à reforma da Segurança Social e para se sentar à mesa a negociar. “Já que não o fez antes das eleições, que o faça depois”. “Ainda há tempo”, afirmou Passos.
“Nós não andamos a correr atrás de foguetes nem de cada eleição, não passamos estes anos a pensar como seríamos vistos pela comunicação social a cada da ou a casa mês. O país vale mais do que isso”, disse em Torres Vedras, repetindo o que já tem vindo a dizer nos últimos dias: que o que importa é o interesse do país e não tanto o resultado eleitoral.
A divisão da campanha eleitoral da coligação é, portanto, mais ou menos assim: Paulo Portas encarrega-se de criticar Costa e o programa do PS, Passos Coelho fica com o futuro e a vida para lá das eleições. Portas diz o nome de António Costa repetidas vezes, Passos prefere substituí-lo por “eles” ou pelo “partido da oposição” enquanto puxa dos galões para mostrar o que o Governo fez nas áreas sociais, nomeadamente na escola pública e no Serviço Nacional de Saúde. Um Estado social em contraposição com um Estado falido, como notou a dada altura o líder centrista.
O objetivo, esse, é o mesmo: mostrar que o Estado social está melhor e que o PS, com as suas “aventuras“, nomeadamente na Segurança Social, é que o está a pôr em causa. É certo que o Estado social é tradicionalmente uma bandeira da esquerda, e o rótulo de neo-liberal é tradicionalmente colado à direita, mas enquanto a campanha dura, Passos e Portas estão determinados em inverter esses papéis.