Yanis Varoufakis diz que Alexis Tsipras foi “forçado à submissão” pela troika apesar de o governo integrado pelos dois – eleito na Grécia em janeiro – sempre ter tido “a lógica do [seu] lado”. Em entrevista ao Público, o antigo ministro das Finanças da Grécia, que estará este sábado em Coimbra para dar uma palestra sobre Democratização da zona euro, diz que “Portugal está tão falido quando a Grécia” mas avisa que “nenhum país pode ter um plano de saída do euro credível”.

“Nós tínhamos a lógica do nosso lado e se houvesse um fórum em que pudéssemos realmente apresentar a nossa lógica a outros ministros das Finanças, aos parlamentos, à opinião pública, não tenho dúvidas que a nossa lógica prevaleceria. O problema é que no secretismo que domina o processo de decisão na Europa não há espaço para a lógica prosperar”, lamenta Yanis Varoufakis, que abandonou o governo grego em julho, no dia seguinte ao referendo contra as condições exigidas para o terceiro resgate.

Apesar do resultado desse referendo, o governo grego viria a aceitar condições duras para receber mais financiamento da troika – o terceiro resgate. Mas Varoufakis não concorda que o governo que liderou com Alexis Tsipras tenha cometido “erros substanciais”. “Se tivesse sabido em Janeiro aquilo que sei agora, claro que tomaria vários passos diferentes daqueles que tomei, mas aquilo onde a sua questão quer chegar, suspeito, é a de saber se eu acho que cometemos erros substanciais na nossa táctica de negociação. E aí a resposta é um enfático não”.

“Verdadeiramente não houve negociações. Do outro lado, a troika, posso confirmar agora, simplesmente não estava interessada em negociar. E tinha um único objectivo em mente, que era o de derrotar um governo que foi eleito para desafiar a lógica de um programa que foi imposto à Grécia durante cinco anos”, acusa o economista.

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Ainda assim, Varoufakis arrepende-se do primeiro acordo assinado a 20 de fevereiro com a troika, para a extensão do segundo resgate. “A decisão de pedir uma extensão do programa no final de Fevereiro, com base no acordo de 20 de Fevereiro no Eurogrupo foi feita em boa fé pela nossa parte, mas não do outro lado. No dia 20 de Fevereiro houve um acordo que dizia que o novo programa seria baseado na lista de reformas que nós apresentaríamos. Alguns dias depois, o outro lado abandonou esse acordo e tentaram empurrar-nos de volta para o memorando. Aquilo que me arrependo é de ter aceite esse acordo”, diz Varoufakis.

Portugal está tão falido como a Grécia”

Varoufakis aproveitou, ainda, para recusar a ideia de que as economias do Sul da Europa, incluindo Portugal, estejam a recuperar. “Em Portugal, pode haver quem celebre a recuperação. Mas não há uma recuperação em Portugal. É inimaginável caracterizar aquilo que acontece no último ano e meio em Portugal como uma recuperação”.

Porquê? Porque “a dívida portuguesa agregada, pública e privada, é insustentável. Por isso, Portugal está tão falido como a Grécia. Na Grécia temos mais dívida pública do que privada. Em Portugal é o inverso. Mas os dois países estão presos a um equilíbrio de taxas de juro e inflação muito baixas que torna o crescimento real que é preciso para sairmos da crise totalmente impossível, a não ser que a Europa mude substancialmente”.

Ainda assim, Varoufakis diz que “nenhum país pode ter um plano de saída do euro credível”. “Assim que se está dentro da união monetária, qualquer tentativa de sair está repleta de enormes perigos e custos gigantescos. Estamos todos presos numa zona euro que temos a obrigação de melhorar. A ameaça credível que nós tínhamos e que todos têm na zona euro é o default. É a única coisa que se pode fazer na zona euro por forma para mostrar rejeição das políticas que estão a ser impostas”.

A estratégia não resultou, reconhece Varoufakis. E como ficou a relação com Tsipras?

O economista grego prefere não fazer comentários pessoais sobre outros ministros das Finanças com quem participou no Eurogrupo, nem mesmo Maria Luís Albuquerque, que se sabe ter sido uma dos vários ministros – a certa altura, todos, que manifestaram um pensamento divergente de Varoufakis. “Porque é que Alexis Tsipras foi forçado à submissão? Porque é que fomos forçados a aceitar um programa que, com precisão matemática, vai conduzir a uma deterioração da crise económica? Tudo isto serviu para que líderes como o sr. Rajoy pudessem depois virar-se para as suas populações e dizer: “veem? É isto que acontece se se atreverem a eleger um governo que desafia a lógica da troika”.

Varoufakis diz que “esta crise que começou em 2010 criou uma avalanche de idiotice e fragmentação”. “Os irlandeses dizem que não são como os portugueses, os portugueses dizem que não são como os gregos, os franceses dizem que não são nada como os espanhóis, os alemães dizem que não são nada como os franceses. Isto é um reflexo claro da fragmentação por que a Europa está a passar”.

“A verdade é que fomos todos apanhados na mesma crise. A Grécia e Portugal são muito semelhantes em muitas coisas importantes e bastante diferentes noutras. Mas a semelhança em que Portugal precisa de se concentrar é que ambos as economias foram apanhadas numa armadilha de deflação e dívida da qual não conseguimos sair, simplesmente por via de uma melhor governação ao nível do Estado”.

E como ficou a relação com Alexis Tsipras? “É simples: não temos relação”, diz Yanis Varoufakis. “Desde as nossas discordâncias, os nossos caminhos divergiram, mas nunca existiu uma troca azeda de palavras entre nós e nunca houve nenhum momento desagradável, o que me deixa satisfeito, porque tenho um grande afecto por ele, mas a partir do momento em que saí do governo em Julho, os nossos caminhos políticos tornaram-se tão divergentes, que não posso dizer que exista uma relação”.