Estão acabados de regressar do relvado. O aquecimento já foi, é hora de concentrar, à séria. Uns trocam de meias, ajustam as caneleiras e prendem-nas à perna. Todos vão vestindo a camisola e há sempre quem reze ou faça um qualquer ritual, enquanto uns quantos se cumprimentam e desejam sorte a quem vai jogar. Dali a minutos estão todos fora do balneário, alinhados para voltarem ao campo. Há treinadores que neste lusco-fusco de minutos entre o aquecimento e o jogo não diriam nada. Podiam preferir omitir, ficar mudos, sem dizerem quanto ficou o jogo dos outros para os seus pensarem apenas no jogo deles. Sabem que a mente é tramada e prega partidas na concentração, nos nervos e na ansiedade. Mas Julen Lopetegui não terá ficado calado: “Vamos, chicos!”
Mal soube que, na Madeira, não houvera nevoeiro que escondesse o golo que o União marcou e Sporting sofreu, o treinador terá logo aberto a boca. Usar as palavras como uma seringa para injetar pica, confiança e motivação nos em quem estava prestes a ir a jogo: se ganhassem, o FC Porto ficaria com mais um ponto que os leões e fecharia o ano como campeão de inverno. Ou protagonistas, como o espanhol tanto diz e rediz quando fala sobre o que viu ou quer ver a equipa a fazer. Os dragões queriam tanto sê-lo que se fartaram de correr, mexer e pressionar os adversários no arranque. Não havia estudante que ficasse com a bola mais que um segundo e muito menos algum que, até aos 25’, a conseguisse levar para lá da linha do meio campo. O protagonismo era portista.
Ou da pressão que a equipa fazia, montando cercos tão rápidos que a Académia perdeu éne vezes a bola longe da baliza dos dragões e bem perto da sua. Ou de Danilo e Rúben Neves, que não davam descanso às pernas dos adversário por nunca pararem de dar corda à bola, passando-a rápido e bem. Ou Maxi Pereira e Miguel Layún, que deram mais vida às laterais que Brahimi e Corona, ambos passando a correr nas costas dos extremos cada vez que eles recebiam a bola. O ritmo cansava só de ver e só abrandou no momento em que o señor assistência foi à esquerda bater um canto. O cruzamento foi o sexto passe do mexicano para alguém fazer do golo, porque a cabeça de Danilo Pereira, perto do primeiro poste, disparou um míssil a um metro de Pedro Trigueira, guarda-redes que nem tempo teve para reagir. “Entrámos forte, como sempre”, dizia Lopetegui, no final.
E fortes os dragões ficaram até ao intervalo, apenas deixando a Académica ter algum protagonismo aos 40’, quando um mau passe de Herrera deu a bola com que a trivela de Ivanildo lançou um sprint de Pedro Nuno, que correu até à área para rematar e deixar Casillas fazer uma defesa. Até aí houve muito de Danilo Pereira, cuja pujança combinada com pés de veludo andou bem mais à frente no relvado que o costume. O protagonista foi ele e não o foi mais porque, aos 21’, a bola que recebeu e com a qual se virou para a baliza, à entrada da área, rasou o poste da baliza quando o português a bateu com o pé esquerdo. Danilo corria tanto para roubar e receber a bola que fazia com que houvesse espaço para os dragões jogarem, mesmo com os onze estudantes comprimidos nos 25-30 metros à frente da sua baliza.
Não há quem aguente um ritmo frenético durante hora e meio e o de Danilo e da equipa, abrandou na segunda parte. A ganhar e com a liderança do campeonato à vista, o FC Porto quis ganhar calma. Passo a fazer tudo com mais pausa e a guardar os safanões no jogo para quando fizesse a bola chegar perto da área da Académica. Nem assim o estudantes saíram mais da toca. Quando a rapidez é menor a passar a bola o risco que se põe nos passes tem que ser maior para a fazer chegar a algum lado lá na frente e, por isso, os três médios portistas tiveram que arriscar mais. Mais passes de primeira, de toca-e-foge, se viram de Herrera e mais bolas foram levantadas por Rúben Neves para a fazer viajar para o extremo que estava do outro lado do campo, enquanto Danilo continuava a ser o que mais corria.
Uma das corridas do médio fê-lo receber a bola junto à linha e ser derrubado por Fernando Alexandre, demasiado lento para antever o truque com que Danilo o fintou. A falta deu em livre para cruzar a bola para a área e lá foi Layún pegar-lhe, à procura do buraco onde se enche a redonda de ar (há muitos jogadores fazem questão de bater a bola nesse sítio), colocá-la na relva e cruzar para outra cabeça, a de Vincent Aboubakar. Três jornadas depois, o camaronês sorria com um golo (o sexto) no campeonato. O mexicano ria-se com ele (sétima assistência) e a equipa também, porque a liderança ficava perto. E mais ficou quando, aos 73’, decidiu atacar como pouco tinha feito até ali: Danilo, perto da linha do meio campo, atirou um passe longo para as costas de Ofori, onde caiu a bola que Jesús Corona dominou com a ponta do pé direito e desviou logo a seguir com o esquerdo.
Com estes dois toques o mexicano roubou um rim ao ganês e deixou-o com espaço para cruzar. O passe saiu rasteiro e tanto Herrera correra até à área que ficou de costas da baliza quando a bola o encontrou — por isso, o médio tocou-a de calcanhar e fez com que o 3-0 inventado pelos muchachos mexicano ficasse bonito. O protagonismo era deles. Mas parte ainda foi para dois graúdos que foram foram propriedade portista (de 2007 a 2011, na equipa principal) em miúdos, quando Rui Pedro recuperou uma bola mal aliviada na área do FC Porto e desencantou espaço para a tocar em Rabiola e receber mais à frente o passe que o avançado lhe devolveu de calcanhar. O médio, nas barbas de Casillas, picou depois a bola para os dragões sofrerem o sétimo golo no campeonato.
Era a consolação na derrota que manteve os estudantes como penúltimos na liga e um beliscão na vitória que subiu os dragões à liderança. E a serem protagonistas como nunca Julen Lopetegui conseguira ser com eles — esta foi a 42.ª jornada que o FC Porto jogou com o espanhol como treinador e só agora a equipa consegue estar sozinha no primeiro lugar. Os portistas são campeões de inverno e vão fechar o ano a sorrirem e a terem o que o técnico quer que tenham: protagonismo.