O presidente do BCP diz que é “fundamental” que Portugal apresente um Orçamento do Estado que contribua para que o país mantenha o rating da agência DBRS. “Mais vale não testarmos esse cenário”, diz o banco.

Nuno Amado foi mais longe do que Fernando Ulrich, do BPI, e António Vieira Monteiro, do Santander Totta, no comentário às negociações sobre o plano do Orçamento do Estado, apesar de dizer que não conhece o documento proposto.

“Há que cumprir com os compromissos internacionais que temos, há que garantir que é um Orçamento executável, que possa ser executado com precisão, e há que garantir que se possa manter o rating da DBRS, que é muito importante para todos”, afirmou Nuno Amado durante a apresentação dos resultados anuais do BCP.

Nuno Amado chama a atenção para a necessidade de haver “estabilidade” e previsibilidade. “Os impostos podem ser maiores ou menores, mas que sejam previsíveis”, afirmou o presidente do BCP.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Nuno Amado acrescentou que “do ponto de vista de curto prazo, o BCP tem um nível de folga de colaterais não utilizados que não têm a ver com o risco de Portugal”. “Mas é fundamental mantermos o rating”, acrescentou o presidente do BCP.

O administrador financeiro, Miguel de Bragança, acrescentou que o banco está “razoavelmente preparado para esse cenário mas não podemos entrar nesse cenário”. Isto porque, apesar de o banco dizer que tem mais de 9 mil milhões de euros em ativos não utilizados (que podem ser utilizados para obter liquidez), “poderia haver efeitos de segunda e terceira ordem. Mais vale não testar esse cenário”.

Ainda assim, numa questão subsequente dos jornalistas, Nuno Amado afirmou que está tranquilo perante a negociação em curso: “mais vale um bom orçamento após negociação do que um mau orçamento sem negociação”.

Amado critica legislação do governo de esquerda nas contas base

O presidente do BCP comentou, ainda, outro aspeto da atualidade política, que diz respeito à atividade bancária. O governo aprovou na generalidade e passará à discussão na especialidade uma proposta que quer “alargar” os serviços prestados pelos bancos em contas sem custos para o cliente.

Nuno Amado, que durante a apresentação de resultados disse que as comissões líquidas aumentaram 3,5% em Portugal, garantiu que “não é graças às comissões” que o banco está a gerar melhores resultados.

Projeto de Lei n.º 83/XIII/1.ª (BE) e Projeto de Lei n.º 92/XIII/1.ª (PCP) –Obrigam os Bancos a disponibilizar uma conta base gratuita, alargando os serviços por esta prestados e consagram a obrigatoriedade de as instituições de crédito disponibilizarem uma conta de depósito à ordem padronizada, sem custos.

Num comentário pedido pelo Observador a esta legislação já aprovada na generalidade, Nuno Amado disse que “o que for decidido os bancos irão cumprir”. Mas deixou uma farpa à legislação em análise.

“É um tema que tem de preocupar a banca, de forma clara, por muitas razões. Deve ser ponderado o efeito que pode ter na economia. Temos um mercado concorrencial que é relativamente claro e, como mercado concorrencial, condicionar a concorrência não me parece ser um bom caminho”, afirmou Nuno Amado.

Lembrando um estudo da Associação Portuguesa de Bancos (APB) que afirmou que os custos associados às contas bancárias “são menores do que a média europeia”, Nuno Amado recordou que, havendo concorrência e tendo o Estado um banco público, “se a Caixa Geral de Depósitos quiser ter política mais agressiva, que tenha”.

“Os resultados da banca na parte portuguesa têm sido negativos ou ligeiramente positivos. Se vamos fazer um conjunto de medidas no sentido de maior estatização, em vez de maior concorrência, se pusermos em causa a rentabilidade do setor, será mais difícil para os bancos servirem a economia se não tiverem uma rentabilidade adequada. Este equilíbrio deve ser ponderado, e como defensor da concorrência supervisionada, a minha opinião é que há, aqui, espaço para poder haver uma otimização da legislação que está a ser discutida”.

Críticas aos processos do Novo Banco e do Banif

Nuno Amado foi, ainda, questionado pelos jornalistas sobre os dois temas quentes da banca nacional nos últimos meses: o Novo Banco e o Banif.

Quanto ao primeiro, que o BCP “neste momento, não tem planos” de ponderar participar na compra porque ainda não devolveu todo o empréstimo estatal que recebeu e está sob um plano de reestruturação, Nuno Amado comentou a decisão de retransferir algumas obrigações senior de volta para o BES:

Obviamente que (a decisão, que penalizou a perceção de risco sobre Portugal) pode afetar as condições mas, sem entrar em detalhes, o que não podia acontecer – perante a necessidade de melhorar o processo de resolução com cerca de dois mil milhões – é que esses dois mil milhões de euros fossem encargo para os concorrentes, que já têm um risco grande com um processo que não geriram e não controlam.

Ainda assim, o presidente do BCP diz que “a decisão é da responsabilidade de quem a tomou”, ou seja, o Banco de Portugal. Mas deixou uma crítica: “O problema está na decisão original que fez com que, agora, houvesse poucas hipóteses de escolha numa resolução de um banco tão grande quanto este”.

Quanto ao Banif, Nuno Amado diz ter “pena” de, por causa do plano de reestruturação, não ter podido concorrer a esse negócio – um negócio que acabou por ser “bom” para o Santander Totta.

O Santander fez uma boa operação, nao tenho nada a comentar. A questão é porque é que, com todo o tempo que houve, com a discussão que houve, chegámos a um custo de cerca de 400 milhões para o setor e dois mil milhões para o contribuinte. Porquê (um processo) nestas condições, porquê à pressa? Estas coisas não se fazem à pressa. Quem tem de vender uma casa à pressa, vende pior. Porque é que não teve um custo diferente?

Nuno Amado concluiu lembrando que o caso Banif “está a ser analisado e é importante que haja conclusões”.

O preço baixo da ação “preocupa-me, claro”

O presidente do BCP teve, ainda, tempo para comentar a queda recente em bolsa da ação do banco, para a casa dos 3 cêntimos.

“As ações preocupam-me, claro, gostava de ter um preço da ação diferente. Mas o que o banco tem de fazer é mostrar que consegue manter os resultados recorrentes elevados”.

Nuno Amado diz que “vai demorar um par de trimestres, seguramente, mas estamos confiantes de que a ação terá uma normalização à medida que temas como o pagamento do empréstimo estatal, o Banif e o Novo Banco forem passando”. O responsável excluiu qualquer intenção de fazer aumentos de capital “em qualquer uma das unidades”, um receio que os analistas têm dito que está a penalizar a ação do BCP.