O prazo para o Banco Espírito Santo (BES) entrar em processo de liquidação termina a 3 de agosto de 2016, dois anos após a aplicação da medida de resolução ao que era, então, o terceiro maior banco português. Este prazo ou a venda do Novo Banco eram os limites temporais previstos para o início da liquidação, mas, com o adiamento de um ano dado pela Comissão Europeia para alienar o banco de transição, vale a deadline de 3 de agosto, segundo informação recolhida pelo Observador.

O processo poderá, até, avançar antes dessa data. O pedido já foi feito ao Banco Central Europeu, depois de serem conhecidas as conclusões do relatório independente que fez a simulação aos prejuízos que teriam os credores do BES se o banco tivesse ido para liquidação antes de ser aplicada a medida de resolução.

De acordo com este exercício virtual efetuado pela Deloitte, os credores comuns do Banco Espírito Santo teriam recebido 31,7% dos seus créditos se o banco tivesse sido liquidado com todos os seus ativos e passivos em agosto de 2014. Para os credores comuns cujas responsabilidades ficaram no banco mau, esse será o nível de recuperação mínimo que terá de ser garantido na resolução do BES. Se a recuperação for inferior a 31,7%, têm direito a receber uma compensação do Fundo de Resolução. Dessa forma, fica assegurada a regra segundo o qual uma resolução não pode trazer mais prejuízos aos credores do que uma liquidação.

Mas, para se fazer a conta final à indemnização, será necessário esperar pelo resultado do processo de liquidação, quando ficará determinado não só o nível de recuperação final por credor, mas também quais os créditos que ficaram reconhecidos pelo tribunal.

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Deloitte admite que a venda de ativos em liquidação poderia durar oito anos

Se o prazo para o início da liquidação é claro, já o tempo que vai demorar o processo é uma incógnita. A simulação levada a cabo pela Deloitte parte do pressuposto que o processo de venda de ativos do BES no quadro de uma liquidação para pagar aos credores seria de oito anos. Mas este prazo indicativo está muito exposto a variáveis de natureza jurídica, nomeadamente ações de impugnação por parte de credores, como tem ilustrado a experiência do Banco Privado Português (BPP) que está em liquidação há seis anos.

À incerteza de se saber quando vão receber, junta-se a incógnita sobre quanto irão os credores receber no final do processo. A Deloitte dividiu os credores do BES em quatro categorias: garantidos, privilegiados, comuns e subordinados. As primeiras duas categorias ficariam totalmente garantidas, num cenário de liquidação, tal como ficaram na resolução. Os credores subordinados, onde estão por exemplo os acionistas, não iriam receber nada. Em situação intermédia estão os credores comuns que conseguiriam receber neste exercício 31,7% das dividas reclamadas.

Na realidade virtual da liquidação do Banco Espírito Santo pré-resolução, os ativos do banco seriam suficientes para reembolsar cerca de oito mil milhões de euros a estes credores, mas a fatia mais substancial destes titulares passou para o Novo Banco, ficando, em princípio, salvaguardados. Sobram os credores comuns que ficaram no banco mau, o atual BES. Mas estes só terão direito a uma compensação do Fundo de Resolução se o nível de recuperação efetiva que resultar da liquidação for inferior aos 31,7% determinados pela Deloitte, e se os créditos que reclamam sobre o BES forem reconhecidos em Tribunal.

Uma dessas situações é, por exemplo, a dos detentores do papel comercial do Grupo Espírito Santo. A provisão para reembolsar estes clientes ficou no BES mau, mas para que essa contingência se transforme num crédito reconhecido, é preciso que seja reconhecida via processo judicial que prove má conduta do banco enquanto intermediário financeiro.

Passivos de 3000 milhões para ativos de 160 milhões

Uma consulta às últimas contas conhecidas do Banco Espírito Santo, de 2015, mostra passivos da ordem dos três mil milhões de euros, excluindo provisões, que incluem o empréstimo da Oak Finance, um veículo detido por investidores internacionais, ao BES, e as obrigações subordinadas com um valor nominal de 2.238 milhões de euros que foram transferidas do Novo Banco para o banco mau no final de 2015, por ordem do Banco de Portugal. Do lado dos ativos, a conta era de 160 milhões de euros. Ora para estes credores receberem 31,7%, seria necessário libertar mais de mil milhões de euros, o que dá uma medida para uma possível compensação do Fundo de Resolução, com contas de agora.

Os números são ainda muito provisórios e podem ser substancialmente alterados por via de processos judiciais. A litigância é, aliás, outra das grandes incógnitas que vai marcar o ritmo e o resultado do processo de liquidação do BES. Sendo este um exercício inédito à escala nacional e mesmo europeia, há muita incerteza jurídica que pode alimentar intermináveis processos judiciais. Por exemplo:

  • Se os titulares originais dos créditos antes da resolução tiverem vendido esses direitos a terceiros, estes têm direito a compensação do Fundo de Resolução?
  • Os resultados do relatório independente da Deloitte podem também ser questionados, pelos credores, mas também pelo próprio Banco de Portugal que já deixou a nota de que o teor não reflete necessariamente a posição do supervisor.