O Orçamento do Estado para 2017 esclarece que as 35 horas na função pública, em vigor desde julho deste ano, vão custar, em 2017, 25 milhões de euros ao Estado. O Presidente da República tinha avisado, quando promulgou o decreto de lei, que não podia haver aumento daquela despesa em 2016, e António Costa sempre prometeu que o faria sem que isso “implicasse aumento dos custos globais com pessoal”. Feitas as contas, não ao que custou em 2016 mas ao que se prevê que vai custar em 2017, são mais 25 milhões de euros. Que podem ou não ser compensados noutras rubricas.

Este foi um dos temas quentes do anterior Orçamento do Estado (para 2016) e que levou à primeira desafinação entre o primeiro-ministro e o ministro das Finanças. Logo em fevereiro, durante a discussão do OE para este ano, Mário Centeno disse em entrevista ao semanário Expresso que a medida só avançaria com garantias de que não iria aumentar a despesa, não garantindo o calendário para a aplicação da medida. Mas a reposição das 35 horas estava escrita a letras gordas dos acordos assinados com o Bloco de Esquerda e o PCP, e, por isso, a afirmação de Centeno agitou as águas na “geringonça”. Seria preciso aparecer António Costa a garantir que sim, que ficassem descansados que as 35 horas entrariam em vigor a 1 de julho. Com ou sem aumentos de despesa.

Esta era a questão sensível. No programa de Governo do PS, a promessa apontava para o “regresso ao regime das 35 horas semanais de período normal de trabalho para os trabalhadores em funções públicas sem implicar aumento dos custos globais com pessoal”. Mário Centeno receava que a redução do horário de trabalho tivesse custos significativos, por causa das horas extraordinárias, que poderiam vir a comprometer as metas.

Foi por isso necessário um ajustamento: na lei que foi aprovada no início de junho na Assembleia da República, Costa salvaguardou que, “em 2016, as despesas com pessoal (…) não podiam exceder os montantes relativos à execução de 2015”. Nada dizia sobre as despesas para os anos seguintes.

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Por essa altura já os ministros — das Finanças e da Saúde — estavam alinhados na ideia de que haveria custos adicionais para suportar a redução de horário no setor da Saúde (um dos mais afetados por esta mudança em função dos turnos e das horas extraordinárias). No debate do Orçamento para 2016 na especialidade Mário Centeno admitia mesmo que o serviço nacional de saúde teria de suportar um custo adicional de 28 a 40 milhões de euros em despesas com pessoal, confirmando a estimativa do ministro Adalberto Campos Fernandes. A ideia era que, apesar deste aumento de despesa na Saúde, outros setores teriam de compensar nos gastos para que não se verificasse “um aumento global da despesa com pessoal” — era esse o acordo.

Em junho, depois de a lei ser aprovada, Centeno voltava a reforçar a ideia: “O custo global, no conjunto das despesas com a administração pública, tem de ser nulo”, dizia. “A estimativa para a área em que os custos serão mais significativos, em algumas profissões na saúde, é de 27 milhões de euros no semestre que temos pela frente. Esses 27 milhões de euros têm de ser encontrados no quadro das despesas com o pessoal na administração publica e também no setor da saúde”, explicava Centeno.

Sempre houve dúvidas sobre se isso seria possível e sobre quais os custos efetivos que o regresso às 35 horas teriam nas contas do Estado. Quando promulgou o diploma, o Presidente da República deu o “benefício da dúvida” ao Governo mas notou que permanecia a dúvida sobre se “esta reversão vai ou não aumentar a despesa pública, num contexto em que tal é negativo e mesmo arriscado”.

Só o futuro imediato confirmará se as normas preventivas são suficientes para impedir efeitos orçamentais que urge evitar“, escrevia Marcelo, atendendo a uma válvula de salvaguarda na lei para compensar o aumento dos encargos. O Presidente esclarecia que, se houvesse um aumento de despesa derivado daquela medida, em 2016, teria de considerar a medida inconstitucional, por não respeitar a norma-travão da lei fundamental (proibição de alterações ao Orçamento do Estado, envolvendo acréscimo de despesas, por iniciativa parlamentar).

Não terá acontecido mas, no Orçamento para 2017, conhecido esta sexta-feira, o Governo estima uma despesa de 25 milhões que, juntamente com os custos associados ao efeito líquido direto da reposição salarial (257 milhões), à atualização das pensões (187 milhões) ou à nova prestação social única para deficientes (60 milhões) dá um total previsto de despesa de 331 milhões de euros.