O DocLisboa está de regresso com a sua 14ª edição, entre os dias 20 e 30. Vai exibir 259 filmes (46 deles são portugueses, 13 em competição), entre longas e curtas-metragens, distribuídos pelas suas várias secções, uma delas em estreia este ano, Da Terra à Lua, que dará um panorama sobre o nosso mundo em filmes de realizadores consagrados. À programação anunciada veio entretanto juntar-se a estreia nacional da curta “Take Me Home”, último filme do realizador iraniano Abbas Kiarostami, que morreu em julho. Será no dia 29, às 19.00, no Cinema São Jorge, quando também se verá o filme “76 Minutes and 15 Seconds with Abbas Kiarostami”, do fotógrafo Seifollah Samadian, amigo e colaborador de longa data de Kiarostami. De entre a vasta e variadíssima programação deste DocLisboa 2016, selecionámos dez filmes essenciais.

“Culloden”, de Peter Watkins

A retrospetiva dedicada ao documentarista inglês Peter Watkins é um dos grandes acontecimentos deste DocLisboa 2016, e é por ela que começamos, com o filme que o deu a conhecer. Rodado para a BBC em 1964, “Culloden” contém a matriz formal e ideológica do cinema que Watkins iria fazer futuramente. É uma recriação anti-convencional, em estilo de “direto” noticioso moderno, com depoimentos dos participantes para as câmaras e acompanhamento “ao vivo”, da batalha que em 1746 opôs, na Escócia, as forças católicas que queriam repor a dinastia dos Stuart no trono, e as forças protestantes do rei George II, da casa de Hanover. (Dia 20, Cinemateca, 19.00 / Dia 21, São Jorge 3, 14.00)

“Exile”, de Rithy Panh

O cineasta cambodjano Rithy Panh, que viveu na pele, e sobreviveu para o documentar, o genocídio levado a cabo nos anos 70 pelos Khmers Vermelhos no seu país, em filmes como “S 21, la Machine de Mort Khmère Rouge” ou “A Imagem que Falta”, continua, em “Exile”, a trabalhar sobre a memória individual e desses tempos de horror comunista e extermínio em massa. Aqui, trata-se de recordar os tempos do exílio e os mortos, entre família e amigos, que ficaram para trás, recorrendo a imagens de arquivo, a uma componente onírica e a recursos plásticos afins aos bonecos de barro de “A Imagem que Falta”. (Dia 21, São Jorge, 16.00 / Dia 28, Culturgest, 19.00)

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https://youtu.be/bhUgsICOTbY

“Ama-San”, de Cláudia Varejão

Há mais de dois mil anos que, no Japão, as “ama-san” (“mulheres do mar”), mergulham no oceano, para procurar pérolas ou apanhar polvos, ouriços-do-mar e outros animais marinhos. A realizadora Cláudia Varejão viajou até Wagu, uma pequena comunidade piscatória nipónica, para filmar o dia-a-dia, em terra e nas águas, de três destas “ama-san”, que continuam a exercer a sua atividade milenar sem recorrer a qualquer tipo de equipamento de mergulho. São avós e mães que cuidam dos netos e dos filhos, fazem compras, vão ao cabeleireiro e falam de frivolidades, mas que em vez de ganharem a vida na secretária de um escritório ou ao balcão de um comércio, fazem-no no fundo do mar. (Dia 22, São Jorge-Sala Manoel de Oliveira, 18.45 / Dia 24, Culturgest, 10.30)

“Lo and Behold: Reveries of the Connected World”, de Werner Herzog

O infatigável e sempre imprevisível Werner Herzog dedica-se neste documentário a refletir sobre o papel e a crescente importância da Internet, do digital e da robótica na nossa vida, e sobre a forma como todas estas realidades estão a alterar o modo como as pessoas se relacionam e percecionam o mundo. Entre outros, Herzog foi falar com personalidades tão diversas como Elon Musk, Lawrence Krauss ou Kevin Mitnick, tendo dividido o filme em 10 segmentos, cada um dos quais dedicado a um aspeto específico do atual desenvolvimento tecnológico, começando nos primórdios da Net. (Dia 22, Culturgest, 19.00)

“Bowie, L’Homme Cent Visages ou le Fantôme d’Hérouville”, de Gaëtan Chataigner e Christophe Conte

Tinha obrigatoriamente que haver um filme sobre David Bowie no DocLisboa deste ano, e a escolha recaiu neste documentário feito originalmente para a televisão francesa. Gaëtan Chataigner e Christophe Conte exploram a figura de David Bowie e a sua influência sobre os seus contemporâneos, através de uma combinação de imagens de arquivo, de fragmentos de concertos, de depoimentos de colaboradores seus, de “covers” por artistas franceses e de reconstituições no Castelo de Hérouville, em cujos célebres estúdios Bowie gravou, em 1974, o álbum Pin Ups, e dois anos depois, parte de Low, em colaboração com Brain Eno e Tony Visconti. (Dia 22, São Jorge 3, 14.00 / Dia 30, Culturgest, 16.15)

https://youtu.be/ew2X5aWoSfk

“O Espectador Espantado”, de Edgar Pêra

O realizador português Edgar Pêra volta a lançar mão do 3D neste filme-ensaio-manifesto bem à sua maneira, onde analisa, questiona e procura explicar o sentimento de espanto do espectador ante aquilo que está a ver na tela, bem como detetar as pulsões mais profundas que estão na sua origem, recorrendo a depoimentos de pensadores, críticos de cinema, ensaístas, neurólogos ou realizadores como Eduardo Lourenço, Guy Maddin, Augusto M. Seabra ou Laura Mulvey. O filme acaba também por falar sobre as novas formas de ver cinema, e o seu significado em termos da alteração da experiência clássica de apreciar um filme numa sala escura. (Dia 24, São Jorge-Sala Manoel de Oliveira, 22.00)

“Ta’ ang”, de Wang Bing

O maior documentarista chinês da atualidade, já premiado no DocLisboa, está de regresso este ano com um filme sobre os refugiados da minoria étnica “ta’ang”, da Birmânia, que fogem dos combates entre o exército do seu país e forças rebeldes, e se instalam, precariamente, em território da China, onde são alvo da hostilidade das autoridades locais. Wang Bing segue um grupo desses refugiados “ta’ang” no seu lento e forçado regresso a casa, sem qualquer apoio e com escassos recursos, para depois ir filmar um segundo grupo, também completamente à toa e que escolheu instalar-se no meio de nenhures. Para o realizador, os “ta’ang” são os refugiados esquecidos do nosso tempo. (Dia 24, Culturgest, 16.00 / Dia 30, São Jorge 3, 19.15)

“I Am the Blues”, de Daniel Cross

Bobby Rush, Barbara Lynn, Carol Fran, Lazy Lester, Little Freddy King ou Jimmy “Duck” Holmes são alguns dos veteranos músicos de “blues” que ainda dão entusiásticos concertos em pequenas salas, restaurantes e bares do “Deep South” dos Estados Unidos, e fazem digressões pelo delta do Mississippi e pelas regiões pantanosas da Louisiana. Vários deles andam pela casa dos 80, e todos viram já muita estrada, fizeram muita música e têm muitas histórias para contar. São eles e elas, desconhecidos do grande público, que Daniel Cross foi filmar, e sobretudo ouvir, neste documentário musical. (Dia 24, São Jorge 3, 18.30 / Dia 25, Culturgest, 16.00)

“Between Fences”, de Avi Mograbi

O israelita Avi Mograbi é um dos realizadores mais ferozmente independentes, individualistas e contestatários do seu país, bem como dos mais criativos do ponto de vista cinematográfico. Também ele está de volta ao DocLisboa com um novo filme sobre as arbitrariedades do governo israelita. Em “Between Fences”, Mograbi denuncia o tratamento dado aos refugiados africanos que acorreram a Israel na última década, a maior parte deles da Eritreia e do Sudão. O cineasta colaborou aqui com o encenador Chen Alon, servindo-se de técnicas do Teatro do Oprimido para pôr os refugiados de um centro de detenção no deserto do Negev a interpretar o seu próprio drama. (Dia 26, Culturgest, 21.30 / Dia 28, Culturgest, 10.30)

“Nos Interstícios da Realidade ou o Cinema de António de Macedo”, de João Monteiro

António de Macedo realizou filmes marcantes do Cinema Novo português, como “Domingo à Tarde” ou “Nojo aos Cães”. Mas foi também um dos raros a fazer cinema de género em Portugal, com “Sete Balas para Selma” ou “A Promessa”, e especialmente filmes fantásticos e de FC, caso de “Os Abismos da Meia-Noite”, “Os Emissários de Khalom” ou “Chá Forte com Limão”. Por essa heresia, Macedo foi vilipendiado e ostracizado pelos seus pares e, finalmente, barrado de receber apoios estatais desde os anos 90, num caso óbvio de censura de gosto em democracia. João Monteiro, um dos diretores do MOTELX, põe tudo em pratos limpos neste documentário biográfico, que fecha o DocLisboa. (Dia 29, Culturgest, 21.00)