Pouco impressionado. O Commerzbank regista o crescimento acima do esperado em Portugal no terceiro trimestre (0,8% em cadeia e 1,6% em termos homólogos) e mostra, também, maior confiança do que anteriormente no cumprimento da meta do défice. Mas é prematuro dizer que Portugal está a sair da crise: “Portugal continua a ser um dos candidatos na crise da zona euro“, em parte porque “o crescimento tem sido totalmente sustentado pela procura externa, a recuperação interna não está à vista” e porque o país vive com uma “crise bancária aguda“, diz o banco alemão.
Os comentários, assinados pelo economista Ralph Solveen, seguiram esta manhã para as caixas de e-mail dos muitos clientes (investidores) do Commerzbank, um dos bancos mais influentes do mercado de dívida europeu e que tem uma visão “cautelosa” para a dívida pública portuguesa. O banco alemão mostra-se mais confiante de que o governo irá conseguir obter a meta do défice (2,2%, pelo menos chegar perto disso), mas deixa um aviso: “um olhar mais cuidado sobre as finanças públicas cria dúvidas sobre a solidez da consolidação das contas públicas“.
A principal preocupação do banco alemão é que “o investimento continua fraco” e “dececionante“.
A estimativa animadora para o crescimento do terceiro trimestre explica-se, provavelmente, por um sucesso esporádico e não pelo início de um período prolongado de crescimento mais robusto. Não temos dúvidas de que não faz sentido falar de uma recuperação auto-sustentada, ou seja, uma melhoria da procura interna que levasse a um arranque no investimento e num aumento do emprego, por sua vez aumentando a procura interna”.
O Commerzbank está muito apreensivo em relação ao investimento (não é o único), lamentando que ele tenha “estagnado ou, mesmo, decrescido ligeiramente”. “A subida clara no investimento em maquinaria e equipamentos verificada em 2013 e 2014 perdeu vapor, claramente, no início de 2015”, escreve o Commerzbank, que inclui no relatório um gráfico que ilustra esta opinião.
O elevado nível de dívida no setor privado também é, acrescenta o Commerzbank, um obstáculo ao investimento. “Os empréstimos às empresas, por exemplo, continuam a cair. Acontece o mesmo com os empréstimos às famílias, o que continua a ter um impacto sobre o consumo privado”, diz o banco alemão.
Banco alemão tem dúvidas sobre “a política económica seguida”
O Commerzbank critica as opções do governo de António Costa. “A linha seguida pelo novo governo tem, numa primeira instância, significado custos muito mais elevados suportados pelas empresas”. Tal como já tinha feito em relatórios anteriores, o Commerzbank recorda o impacto para a produtividade da reposição dos feriados e, também, da subida do salário mínimo — que significa que “toda a estrutura salarial em Portugal será reajustada para um nível mais elevado, tornando o país menos competitivo“.
Neste clima, não é provável que o investimento arranque de forma real nos próximos trimestres, e o crescimento no quarto trimestre deverá ser consideravelmente mais fraco ou menos negativo, dadas as forte flutuações no PIB que são normais numa economia mais pequena, como Portugal”.
O Commerzbank, que coloca em dúvida “quão sustentável é o declínio do défice”, diz que será difícil para o governo atingir a meta de défice de 1,6% prevista para 2017. Por outro lado, “essa tarefa vai ser tornada mais fácil pelo facto de as sondagens indicarem um maior apoio para o PS”, o que confere uma “melhor posição negocial” a António Costa.
Contudo, os problemas no setor bancário “continuam à espera de ser resolvidos”, apesar da entrada do acionista chinês no BCP. A recapitalização da Caixa derrapou para o próximo ano e “a colocação de dívida de qualidade secundária nos investidores privados, no valor de mil milhões de euros, pode tornar-se um problema”.
Outra questão que continua em aberto, para já, é a venda do Novo Banco, que significa “um risco adicional para as finanças públicas e os outros bancos”.
Investir em Portugal é um risco
Conclusão do Commerzbank (e recomendação para os investidores): “Apesar das últimas notícias animadoras, Portugal continua a ser um candidato potencial a um agravamento da crise na zona euro, dado o seu crescimento modesto, a dívida pública muito próxima de 130% do PIB e com poucas perspetivas de cair muito no próximo ano, e os problemas na banca”.
Investir na dívida portuguesa é um risco, diz o banco alemão. “Os juros da dívida pública de Portugal podem ser aqueles que vão sofrer mais à medida que, no próximo ano, se tornar cada vez mais claro que o BCE está a atingir os limites do seu programa de compra de dívida, portanto tendo que reduzir as compras na viragem de 2017 para 2018, no máximo”.
Finalmente, o banco alemão tem muitas dúvidas sobre a capacidade do Tesouro português de emitir os 16 mil milhões de euros previstos no próximo ano, contando apenas com o rating da DBRS (todos os outros em lixo).