Quando se olha para o mais recente livro de Jamie Oliver, percebe-se logo que alguma coisa está diferente: é a primeira vez, em muitos anos, que o chef não aparece na capa. Também não há pratos apetitosos em loiças bonitas — só sete palavras num fundo liso, como nos velhos livros de cozinha.
As Receitas de Natal do Jamie Oliver deve ser encarado assim — um livro que não esconde a sua inspiração nos velhos manuais de família que passam de geração em geração e onde a ideia é regressar todos os anos, depois de preencher devidamente a linha “este livro pertence a…”. Oliver chama-lhe “o culminar de 17 anos a aperfeiçoar as mais fabulosas receitas, truques e dicas infalíveis que o ajudarão a tornar única esta época do ano tão especial“. E garante: “Como só farei este livro uma vez, a preparação foi longa.”
Dezassete livros e 17 programas de televisão depois, desde novembro aí está então o livro de Natal do chef britânico, com mais de 400 páginas e cerca de 100 receitas ideais para esta altura do ano. E se não há fotografias na capa, o mesmo não se pode dizer do recheio. Para além dos pratos que ocupam uma página inteira e dos enfeites natalícios que acompanham cada capítulo, há retratos de Jamie Oliver e da família em diferentes Natais espalhados pelo livro — “tesourinhos” que levam o chef a escrever, já nos agradecimentos: “Encontrarão neste livro muitos dos tresloucados cortes de cabelo que exibi ao longo dos anos”.
Passando à comida, o livro reúne propostas natalícias que o chef foi partilhando ao longo da sua carreira, pratos que se tornaram famosos nos seus restaurantes (como os espinafres cremosos com cobertura crocante de cheddar e aveia, do Barbecoa, em Londres), favoritos da família Oliver e receitas inéditas. Tudo isto dividido em diferentes capítulos, das “esplêndidas entradas” às “sobremesas festivas e espetaculares“, sem esquecer os “deliciosos legumes“, “os molhos e acompanhamentos” — com um capítulo inteiramente dedicado ao “maravilhoso mundo das batatas” –, as “iguarias para picar“, as “saladas superfantásticas“, as “bebidas perfeitas” ou “o grande acontecimento” (onde o peru está em destaque e, spoiler alert, não há sinal de bacalhau, polvo ou cabrito). E se é verdade que no final há um guia só para assar carnes, também é verdade que o chef não se esquece dos seus variados leitores e inclui inúmeras opções vegetarianas e vegan. Exemplos: carpaccio de beterraba, tarte de queijo, assado de frutos secos e até recheio vegetariano com abóbora caramelizada, cebola roxa, salva, arandos e pistácios.
Como manda a época, a tendência saudável que o chef retratou no livro anterior fica desta vez na gaveta para dar lugar a alguns “excessos e gulodices à antiga”. Isso não impede, no entanto, que todas as receitas estejam acompanhadas de um quadro onde estão discriminadas as calorias, gorduras, proteínas, hidratos de carbono, açúcar, sal e fibras — talvez seja apenas melhor não olhar para os valores em propostas como a Bomba de Inverno, na secção de sobremesas.
Outra coisa constante são as dicas e sugestões para ter um Natal sem stress, a pensar sobretudo em quem tem mesas grandes para encher e amigos e família a dormir em casa. Como? Com destaques intitulados “esteja preparado” e “ganhe tempo”, onde o chef identifica as coisas que dão para preparar com antecedência e ter no frigorífico. E se é daqueles que torce o nariz à ideia de passar três dias a comer os restos do peru, o chef dedica um capítulo inteiro àquilo a que chama “as abençoadas sobras”, onde transforma a ave em empadas, risoto e falafel, por exemplo, e apresenta outras propostas como pudim yorkshire recheado com o que há e caril verde tailandês.
Todas as receitas estão ainda acompanhadas de um pequeno comentário do chef. O cocktail de gambas, logo a abrir, é um bom exemplo:
“Um clássico associado à Lei Seca americana, nos anos 80 fiz milhares no pub dos meus pais. O cocktail de gambas é nostálgico, retro e um pouco antiquado, mas brilhante. As pessoas adoram-no e, se for bem feito, é memorável.”
Se descontar as renas em cima de chocolate, os pais natais brilhantes e demais parafernália deliciosa da época, a maior parte das receitas dá, na verdade, para qualquer época festiva ou de convívio. Um motivo ainda melhor para voltar ao livro não só ano após ano, mas sempre que for preciso.