Em Nova Iorque via a meteorologia, em Hong Kong vê os índices de poluição. Mathilde Thomas está preocupada com dois dos grandes problemas da era contemporânea — o stress e as partículas nocivas no ar — e por isso resolveu levar o tema do burnout para a cosmética. Fundadora da Caudalie e incluída na lista dos franceses mais influentes do mundo, divulgada em 2015 pela Vanity Fair, a empresária de 45 anos lança agora em Portugal uma nova linha dedicada às “super-mulheres” nos trintas, que querem fazer tudo e acabam por ser a faixa etária mais afetada pelo burnout.
Originalmente o termo define o esgotamento físico e mental provocado pelo excesso de trabalho, mas aqui é usado para falar também de destruição celular, pois é a partir dos 30 que o sistema de defesas naturais da pele começa a entrar em falência. Juntando o que é genético e acontece naturalmente às agressões exteriores provocadas pelo stress, o estilo de vida apressado, os raios UV e a poluição, o stock de antioxidantes começa a entrar em falência.
“A poluição também envelhece”, diz Mathilde Thomas, que em Hong Kong passou a limpar o rosto duas vezes por dia, de manhã e à noite. “Quem vive numa grande cidade é, infelizmente, confrontado com isso. Há cada vez mais partículas no ar, dióxido de carbono e gases que são nocivos para o ambiente e também para a pele, e que podem levar ao burnout das células. Nós somos especialistas em antioxidantes, por isso quisemos dar um passo em frente e criar antioxidantes que são também anti-poluição e acabam por funcionar como um escudo de proteção da pele”, diz ao Observador numa entrevista feita por Skype a partir de Hong Kong.
Batizada de Vine [Activ] e assente na vinoterapia, como tudo o que a marca produz, a nova gama de cuidados de rosto tem como lema “demasiado jovem para ter de repousar, demasiado jovem para ter um ar cansado” e chega às farmácias portuguesas em março.
Esteve cinco anos em Nova Iorque e está há dois em Hong Kong. Porquê estas temporadas longe de França e em pontos tão opostos do mundo?
Porque estamos a tentar fazer crescer a marca internacionalmente mas queremos continuar a ser uma empresa familiar e independente. E para isso precisamos de entender o mundo, porque acredito que hoje em dia nenhuma companhia de cuidados de pele pode ser regional. Na altura, em 2010, a nossa subsidiária nos Estados Unidos estava a atravessar algumas dificuldades e em vez de a fecharmos decidimos mudar-nos para lá, encontrar as pessoas certas, pô-la a funcionar. E foi isso que fizemos.
Foi para Hong Kong pelas mesmas razões?
Sim. Depois de cinco anos em Nova Iorque sentimos que já percebíamos o mercado, as mulheres, que já tínhamos uma boa equipa montada, e quisemos vir para a Ásia. É verdade que na Ásia o maior mercado está na China, mas Pequim e Xangai são cidades muito poluídas e o estilo de vida em Hong Kong é mais fácil para uma ocidental como eu.
O que é que Hong Kong lhe tem ensinado?
Muitas coisas. Fiquei sobretudo impressionada com as coreanas e a K-beauty [termo que designa toda a indústria cosmética vinda da Coreia do Sul, uma das mais fortes atualmente]. As mulheres são loucas por cuidados de pele, fazem muitas cirurgias faciais e muito layering: de manhã são capazes de colocar 15 produtos no rosto. Põem tónicos, loções, essências, séruns, ampolas, creme, fluido… É inacreditável. Mas a verdade é que têm uma pele muito bonita e são provavelmente as mulheres mais bonitas de toda a Ásia. Por isso comecei a observar de perto a rotina de beleza delas.
E isso inspirou-a?
Na verdade sim. Vamos lançar em breve uma essência “aclaradora”. É um produto que dá este efeito de pele translúcida de que as coreanas estão à procura.
Da Coreia para o mundo, a rotina de beleza que todas querem copiar
Notou alguma alteração na sua pele com estas viagens, nomeadamente aí em Hong Kong?
Hong Kong é uma cidade muito húmida, por isso tive de mudar a minha rotina diária. Limpo a pele mais vezes do que habitualmente, de manhã e à noite, como as coreanas, e começo com um óleo e depois uso uma espuma de limpeza. De seguida aplico um hidratante e um creme com SPF 50, p0rque aqui o tempo é quente e faz sol.
Esta nova linha que chega a Portugal em março é muito focada na poluição e no stress. Porquê olhar para estes dois problemas especificamente?
Quem vive numa grande cidade é, infelizmente, confrontado com isso. Há cada vez mais partículas no ar, dióxido de carbono e gases que são nocivos para o ambiente e também para a pele, e que podem levar ao burnout das células. Nós somos especialistas — diria mesmo que somos uma autoridade — no que respeita aos antioxidantes, por isso quisemos dar um passo em frente e criar antioxidantes que são também anti-poluição e acabam por funcionar como um escudo de proteção da pele. Porque a poluição também envelhece.
Diria que atualmente a poluição é, para a cosmética, um desafio tão grande como o envelhecimento? Porque vemos cada vez mais essa tendência nos novos lançamentos.
Diria que é um desafio maior aqui na Ásia, embora vá chegar também, e infelizmente, à Europa. Mas é verdade que aqui há cremes que contêm ingredientes anti-poluição, porque os asiáticos querem proteger a pele do pó amarelo que é produzido pelas fábricas e a indústria. É uma grande tendência aqui e infelizmente está a chegar à Europa.
Já chegou a Paris, por exemplo. Estive lá recentemente e até havia sinais eletrónicos a pedir para os carros abrandarem porque os níveis de poluição estavam elevados.
Aqui é a primeira coisa que eu faço: de manhã acordo e vejo como estão os índices de poluição. Em Nova Iorque costumava ver a meteorologia, se estava frio ou calor, porque a cidade é de extremos, mas agora também costumo ver como está a poluição em Paris e é quase tão má como em Hong Kong. Isso é triste. É por isso que estamos a plantar árvores. Estamos a tentar ajudar.
Para além da questão da poluição, esta nova linha tem uma patente com um nome estranhamente familiar: anti-cell burnout complex. O que é que pensa do mundo onde vivemos atualmente, onde as pessoas chegam a níveis de esgotamento por causa do trabalho?
Creio que é preciso escolher a empresa certa, que partilhe os mesmos valores. É verdade que conhecemos cada vez mais pessoas que trabalham durante a maior parte do tempo, mas é quase sempre em grandes companhias internacionais que colocam muita pressão nos seus funcionários. Eu defendo a 100% as empresas detidas por uma família e que têm uma escala mais humana, onde se sabe para quem se trabalha e não se é tão pressionado.
Aqui resolveu olhar para as mulheres na faixa etária dos 30. Porquê?
Porque era um público que de certa forma estávamos a ignorar. Temos uma linha para os millennials, temos outra para as mulheres nos quarentas, quando a cara começa a ficar mais oval, mas não tínhamos um bom anti-rugas que também trouxesse luminosidade e servisse de escudo contra a poluição.
Muitas vezes é nos 30 que se colocam mais desafios. Sentimos pressão para ter filhos, se ainda não os tivemos, e ao mesmo tempo temos de nos focar no trabalho, ou seja, investir na família e na carreira simultaneamente.
Somos super-mulheres. É difícil. Se quiser ter uma carreira, ter filhos, ter uma boa vida amorosa, é muito desgastante. Mas ao mesmo tempo é importante tentar conseguir ter tudo isso. É muito cansativo mas o grande segredo é tentar manter o equilíbrio: não dar tudo ao trabalho, não dar tudo aos filhos, não dar tudo à pessoa com quem se está, e ao mesmo tempo tentar ter tempo só para si. Isto requer organização, mas quando se decide o tipo de equilíbrio que se quer ter, é preciso planear a agenda de acordo com isso.