Pedro Santana Lopes desafiou Jorge Sampaio para um frente-a-frente televisivo para esclarecer todos os factos sobre o processo que resultou na dissolução da Assembleia da República e consequente convocação de eleições em 2004.

“Se o Dr. Jorge Sampaio porventura quiser falar disto civilizadamente perante as câmaras de televisão, eu tenho todo o gosto”, afirmou na terça-feira à noite o ex-primeiro-ministro, no seu espaço de comentário na SIC Notícias.

O ex-presidente da Câmara de Lisboa comentava assim as declarações do ex-Presidente da República no segundo volume da sua biografia, da autoria do jornalista José Pedro Castanheira. Segundo a obra biográfica, Jorge Sampaio revela o seguinte: “Fartei-me do Santana como primeiro-ministro, estava a deixar o país à deriva, mas não foi uma decisão ad hominem. Ninguém gosta de dissolver o Parlamento e eu tomei essa decisão em pouco mais de 48 horas. Hoje faria o mesmo, porque era preciso”.

No mesmo espaço de opinião, Pedro Santana Lopes sugere que Jorge Sampaio tem “peso na consciência” por ter deixado caminho aberto à ascensão de José Sócrates, primeiro-ministro que se viu forçado a pedir a intervenção da troika e que está agora envolvido como principal suspeito da Operação Marquês.

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“Compreendo que Jorge Sampaio tenha peso na consciência porque a decisão dele é que pôs o país à deriva. Veja a semana em que o livro aparece, veja só. Eu acho que ele [Sampaio] deve viver nesse tormento. Essa dissolução deu origem aquilo de que andamos a falar todos os dias”, afirmou Santana Lopes.

No livro, o biógrafo de Sampaio, apoiando-se em revelações do próprio, sugere que o ex-Presidente da República desconfiava há muito dos planos de Santana Lopes e Durão Barroso. Para Santana Lopes, as alegações de que ele e Durão já tinham há muito tempo arquitetado que o primeiro sucederia ao segundo no cargo de primeiro-ministro, quando chegasse o momento de Durão rumar a Bruxelas, são “coisas de criança”.

Na mesma obra, o antigo Presidente da República garante que a dissolução “não foi vingança”, até porque “tinha boas relações pessoais” com Pedro Santana Lopes. “A minha relação com Santana era muito franca e cordial. Não tinha (nem tenho) nada de pessoal contra ele – tenho até estima. O Presidente tem de ter um diálogo com o primeiro-ministro na base da confiança e tive conversas muito positivas com ele. Pediu-me opinião várias vezes, dei-lhe conselhos francos, mas estive sempre preocupado com o desenrolar dos acontecimentos, que se precipitaram muito rapidamente até descambarem na confusão.”

A 28 de julho, Jorge Sampaio e Pedro Santana Lopes fizeram finalmente as pazes quando assinaram o memorando que permitia a atribuição de dez bolsas de estudo, no valor de cerca de 50 mil euros por ano, a jovens estudantes sírios. Para a história, no entanto, ficam as “memórias de um Governo curto onde aconteceu tudo“.

Memórias de um Governo curto onde aconteceu tudo, na primeira pessoa