O pretexto era a apresentação das contas anuais do grupo Sonae. Mas Paulo Azevedo não resistiu a reagir às mais recentes notícias sobre a investigação da Operação Marquês, em especial aos elementos que envolvem a tentativa falhada de compra da Portugal Telecom (PT) pela Sonae. Independentemente de haver dinheiro ou não, “estavam todos feitos e isso fez-nos a vida difícil, durante muito tempo, de forma muito injusta”, afirmou o presidente do grupo empresarial. E, apesar das garantias de que havia concorrência, a verdade é que “o jogo estava distorcido”, acusou Paulo Azevedo, durante o encontro com jornalistas, na Maia, esta quinta-feira.
Paulo Azevedo não esconde “alguma satisfação” com as revelações que têm sido feitas e deixa os resultados nas mãos da justiça. “Diziam-nos que a concorrência era limpa e depois, em privado, riam-se da nossa cara”, afirmou. “Fizemos o nosso caminho e estamos muito satisfeitos. A justiça fará o seu trabalho”, acrescentou.
A Sonae, recorde-se, apresentou em 2006 uma proposta para comprar a PT. Mas a operação acabou por falhar depois de os acionistas chumbarem a desblindagem dos estatutos, um passo essencial para que o negócio se concretizasse. Após o chumbo, em 2007, a operadora fez o spin off da PT Multimédia e avançou com a venda da posição na brasileira Vivo à espanhola Telefónica – parte da receita com esse negócio foi então utilizada para remunerar os acionistas (entre os quais estava então o Grupo Espírito Santo, por exemplo) e para investir na Oi, empresa que agora está em processo de insolvência.
Os antigos gestores da PT, Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, foram agora constituídos arguidos na Operação Marquês. Os antigos administradores da operadora de telecomunicações são suspeitos de terem sido corrompidos pelo grupo liderado por Ricardo Salgado para, no âmbito das suas funções, agirem de acordo com os interesses daquele grupo, nomeadamente no negócio da entrada da PT na Oi.
Não é a primeira vez que o executivo aponta o dedo acusador aos responsáveis e processos que envolveram a OPA lançada pela Sonae sobre a operadora. Quando deu o seu testemunho no âmbito da investigação da Operação Marquês, em Setembro de 2015, como o Observador noticiou, Paulo Azevedo já antecipava os problemas do Grupo Espírito Santo.
Paulo Azevedo, o homem que antecipou o fim do GES sete anos antes
Paulo Azevedo terá afirmado aos investigadores na Operação Marquês que o GES já tinha uma situação líquida perto do zero em fevereiro de 2007 — altura em que a Sonae lançou uma OPA à Portugal Telecom (PT). Mesmo assim, o grupo da família Espírito Santo conseguiu financiar e reforçar a sua posição acionista na PT de 8% para 10%.
A informação da degradação financeira do grupo, segundo Azevedo, seria do conhecimento generalizado dos bancos portugueses e só a influência que Ricardo Salgado tinha no sistema de negócios português terá permitido que a derrocada do império da família Espírito Santo apenas tivesse ocorrido em 2014. Caso a Sonae tivesse ganho a OPA, Paulo Azevedo não terá dúvidas de que as fragilidades do GES teriam sido conhecidas mais cedo.
O testemunho do líder da Sonae, que se verificou em setembro de 2015, ganhou então mais importância face às novas suspeitas que ligam o alegado favorecimento do GES por parte do governo de José Sócrates nos negócios da PT às transferências suspeitas do grupo para Carlos Santos Silva, o empresário amigo de Sócrates, considerado pelo Ministério Público como o seu testa de ferro. Foi a partir do testemunho de Paulo Azevedo que a investigação da Operação Marquês começou a ganhar esse novo rumo. E que o procurador Rosário Teixeira e os restantes investigadores terão reforçado os seus indícios de que terá existido uma aliança estratégia entre o governo de José Sócrates e o grupo liderado por Ricardo Salgado.
Lucros da Sonae crescem em 2016
Na mesma conferência, Paulo Azevedo explicou as contas do grupo Sonae relativas a 2016, ano em que o resultado líquido atribuível a acionistas subiu 22,7% no ano passado face ao ano anterior, para 215 milhões de euros. A Sonae adiantou que o lucro beneficiou “do desempenho ao nível do resultado líquido direto e indireto, ou seja, refletindo o crescimento das vendas, a melhoria da rentabilidade operacional, a redução da dívida líquida, os menores custos financeiros e a valorização dos ativos”.