Se alguém que tenha um património negativo — porque, por exemplo, a sua dívida no crédito à habitação vale mais do que a própria casa — lhe pedisse dinheiro, você emprestaria? E se soubesse que essa pessoa gasta mensalmente mais do que recebe, agravando o património negativo? E se lhe propusesse pagar apenas um ponto percentual acima de uma aplicação de baixo risco? É isso que a Futebol Clube do Porto SAD está vender agora aos investidores.

Estão em subscrição as obrigações FC Porto SAD 2017-2020, em que a sociedade anónima desportiva propõe aos investidores uma taxa de juro fixa de 4,25% por ano durante um triénio. É um investimento arriscado. A SAD está em falência técnica. Tem capitais próprios cada vez mais negativos: o património individual de -31,2 milhões de euros no final de junho de 2016 passou para -62,2 milhões de euros no final do ano. “A primeira metade da época 2016/2017 foi bastante melhor em termos desportivos do que económicos”, lê-se no relatório da SAD sobre o semestre que terminou no passado dia 31 de dezembro.

As novas obrigações são um bom negócio para a FC Porto SAD, porque a taxa de juro de 4,25% é mais baixa do que os 6,04% que os seus empréstimos bancários e obrigacionistas pagavam, em média, no início do ano. São também um bom negócio para o sindicato de bancos colocadores do empréstimo, porque cobram comissões aos seus clientes. Não são, no entanto, um bom negócio para esses clientes, que, depois de pagarem várias camadas de comissões, despesas e impostos, veem a rentabilidade deste investimento aproximar-se do retorno prometido por aplicações de baixo risco.

Rentabilidade anual líquida de 2,35%

Tal como na última emissão obrigacionista da Benfica SAD, o rendimento das obrigações FC Porto SAD 2017-2020 após subtrair todos os custos é muito baixo, tendo em conta o risco de incumprimento.

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Quem investir agora 9.375 euros — a média de subscrição na última operação do género desta SAD portista —, deve estimar uma rentabilidade anual líquida de 2,35%, assumindo que a sociedade pagará os juros semestrais e reembolsará totalmente o capital dentro de três anos. É pouco, porque o melhor depósito a três anos concede um retorno anual líquido de 1,38% e os Certificados do Tesouro Poupança Mais fornecem 1,26% por ano. Ao contrário das obrigações da FC Porto SAD, os depósitos a prazo estão protegidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos e os Certificados do Tesouro Poupança Mais são garantidos pela República Portuguesa.

Rentabilidade anual líquida de comissões, taxas, despesas e impostos
Estas rentabilidades assumem que a FC Porto SAD cumpre todos os pagamentos de juros e reembolsa a totalidade do capital investido nas obrigações FC Porto SAD 2017-2020 no vencimento.
Montante investido Rentabilidade média
100€ -30,74%
500€ -5,94%
1.000€ -1,57%
2.000€ 0,64%
5.000€ 1,96%
10.000€ 2,38%
20.000€ 2,58%
50.000€ 2,68%
100.000€ 2,73%
Cálculos usam preçários a 25 de maio de 2017 dos seguintes intermediários: ActivoBank, Banco Best, Banco BIC, Banco Carregosa, Banco Popular, Caixa Geral de Depósitos, Millennium bcp, Montepio e Novo Banco. Assumem a subscrição por um investidor de Portugal continental, que as obrigações FC Porto SAD 2017-2020 são os únicos títulos em carteira durante 3 anos e uma taxa de IRS sobre os juros de 28%.

Estes cálculos de rentabilidade incorporam o impacto das comissões de subscrição, de guarda de títulos, de pagamento de juros e de reembolso, bem como impostos, despesas e taxas inerentes a essas operações. Todos os investidores têm de pagar estes custos, à exceção, eventualmente, da comissão de guarda: quem já tiver um dossiê de títulos, já paga essa comissão. Todavia, mesmo sem contabilizar a comissão de guarda de títulos, a rentabilidade anual líquida é, em média, de 2,76% numa aplicação de 9.375 euros nos nove intermediários que compõem o sindicato colocador da emissão.

Quanto menos for aplicado na subscrição das obrigações FC Porto SAD 2017-2020, menor a rentabilidade potencial do investimento. Até 1.500 euros, o retorno líquido é negativo na maioria dos intermediários, ou seja, paga mais em comissões, taxas, despesas e impostos do que recebe de juros. Até 3.000 euros, a rentabilidade é inferior à do melhor depósito a prazo a três anos.

A FC Porto SAD solicitou a admissão à negociação das obrigações à Euronext Lisbon, o que quer dizer que os investidores poderão negociar os títulos na bolsa, sujeitando-se a mais comissões bolsistas. Nas operações de bolsa, a rentabilidade dos investidores dependerá sempre dos preços negociados. As mais recentes obrigações da Benfica SAD estão a cotar agora abaixo do valor nominal, o que quer dizer que quem subscreveu em abril e quiser vender agora poderá registar um prejuízo.

David Almas é analista financeiro independente registado na CMVM com o número oito. O autor trabalha subordinado ao Código Deontológico dos Jornalistas.