O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, aproveitou a visita que fez esta terça-feira ao Centro de Desenvolvimento da Criança Torrado da Silva, no Hospital Garcia de Orta, em Almada, para concretizar, não um, mas dois sonhos de João Ribeiro, uma criança de 13 anos com um grave problema genético que é apoiado naquela unidade de saúde. “Soubemos que os técnicos do hospital tinham inscrito o João Ribeiro no Make-a-Wish e que o sonho que ele lá tinha colocado era conhecer o presidente Marcelo e andar de limousine“, explicou ao Observador Maria João Ruela, assessora do Presidente da República para os assuntos sociais.

“Ora o Presidente ia lá, por isso um dos sonhos já ia ser concretizado. Então ele lembrou-se: ‘porque não concretizar o outro também?’ Pedimos então à secretaria-geral da Presidência que contactasse empresas no sentido de uma limousine estar disponível dentro de meia-hora no hospital“, detalha a assessora, explicando que “os serviços da Presidência só serviram para facilitar os contactos”, uma vez que Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de pagar o serviço de limousine do seu próprio bolso.

Marcelo deu uma volta com João Ribeiro em torno do hospital no interior da limousine. “Depois, como o Presidente tinha compromissos de agenda e teve de regressar a Lisboa, deixou a limousine com o João e a mãe”, explica a mesma responsável, detalhando que “eles foram dar uma volta pela Costa da Caparica, uma vez que a família vive ali na zona da Charneca; passaram depois pela escola do João, onde a limousine inclusivamente buzinou para os colegas dele virem cá fora vê-lo, e depois o motorista deixou-os em casa.”

No fim do dia, Marcelo quis saber o que tinha achado João da experiência. “À noite telefonei à mãe do João, porque sabíamos que ele tem uma doença grave e que estes picos de euforia também podiam ter efeitos negativos, e porque o Presidente também queria ter novidades sobre a experiência do João. E a mãe disse-me uma coisa engraçada. Disse-me que lhe tínhamos concedido o sonho de andar de limousine e que ele tinha gostado muito, mas que o mais importante tinha sido conhecer o Presidente Marcelo, porque isso era uma coisa que normalmente a mãe não lhe conseguiria proporcionar”, acrescentou Maria João Ruela.

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“O João foi a pessoa mais importante que transportei além do meu filho”

Por volta das 12h de terça-feira, Nuno Sousa preparava-se para almoçar após ter estacionado a carrinha com que tinha concluído mais um serviço de transporte privado durante a manhã quando recebeu o telefonema da central da empresa de João Lima. “Era precisa uma limousine dali a 30 minutos no Garcia de Orta. Está a ver o que isso é, daqui até lá. Nem almocei”, conta ao Observador o motorista, na garagem no Prior Velho em que a limousine está habitualmente estacionada. “Disseram que era qualquer coisa onde ia estar o Presidente da República, mas não havia detalhes nenhuns. Foi só o tempo de tirar a limousine da garagem e de me pôr a andar para lá, mas inicialmente aqui na garagem ainda ficámos a pensar que era alguma piada.”

Nuno Sousa conduziu a limousine que transportou Marcelo Rebelo de Sousa e João Ribeiro (Fotografia: HENRIQUE CASINHAS/OBSERVADOR)

Os serviços que Nuno faz com a limousine são raros. “Só de vez em quando, para casamentos, batizados, despedidas de solteira. Mas o carro está muito parado”, explica. Além disso, dado o requinte do momento, exigem uma indumentária adequada — sempre que conduz a limousine Nuno veste fato e gravata. “Mas naquele momento nem tive tempo para isso. Tive de ir como estava, camisa normal e calças, ainda pus uma gravata, que ando sempre com gravatas no carro“, recorda Nuno.

Só quando chegou ao hospital na margem sul é que lhe foi explicado o objetivo do serviço. “Explicaram-me que era para concretizar o sonho do João, que o Presidente da República queria ajudar o miúdo”, lembra. “Nós fazemos várias vezes estes serviços, estas ações sociais. E aqui, quando soubemos, também quisemos oferecer o serviço, mas o Presidente fez questão de pagar”, conta Nuno, recordando a alegria de João Ribeiro quando viu a limousine.

“Ele entrou dentro do carro com toda a elegância. Gostei muito de ver que o Presidente da República passou para o menino todo o protocolo. Abriu a porta, sentou-o no lugar mais importante do carro, fez com que as atenções fossem todas para ele”, recorda o motorista, sublinhando que “a criança estava radiante, abria os vidros, ligava e desligava o rádio, estava maravilhada”. Depois da primeira volta, com Marcelo ao lado, é que começou a verdadeira viagem para João. “Perguntei-lhe ‘então conta lá, o que é que gostas de fazer?”. E ele: ‘gosto de andar de limousine’. Mas disse-me também que me faltava um chapéu. Ele tinha feito um desenho de uma limousine em que o motorista usava um chapéu, mas eu tive de lhe dizer que não me tinham comunicado que era preciso levar chapéu e pedi desculpa.”

A limousine saiu do hospital Garcia de Orta com o objetivo de dar uma volta maior com João e com a mãe. “Perguntei-lhe onde é que ele morava e passei por casa dele. Vieram os avós à porta vê-lo, ele ficou todo contente. Depois, passei pela escola onde ele andava e até buzinei para os colegas dele virem vê-lo à porta. E ele estava sempre a abrir o vidro e a acenar pela janela”, recorda Nuno, que depois perguntou à criança de 13 anos há quanto tempo é que não via o mar. “Há cerca de dois anos que ele não via o mar, apesar de viver ali na zona da Caparica. Aí eu decidi pôr-me a caminho da zona da praia e ele ficou maravilhado com o que viu.”

Entretanto, em conversa com a criança, Nuno percebeu que João é sportinguista. “Eu tenho o telefone do William e do João Mário e tentei ligar-lhes, para eles lhe darem um abraço, mas eles estavam numa formação e não puderam atender. Mas fiquei de ver se lhe arranjo uma camisola autografada”, conta o motorista da limousine. Quando percebeu que a criança já estava a ficar cansada, levou João e a mãe para casa. “No fim, ele agradeceu-me muito por lhe ter proporcionado aquele sonho. E eu posso dizer que ele foi a pessoa mais importante que transportei além do meu filho”, reconhece Nuno. “Ver a força dele, apesar das coisas por que está a passar… A mãe ia-se abaixo às vezes, mas ele não. Tocou-me muito ver a força dele“, lembra o motorista, que se despediu de João com um desafio: “Da próxima vez que te transportar na limousine é quando tiveres 16 anos e uma namorada”. João respondeu que vai “ver se trata disso”.

“Ganhei o mês, o ano, com este serviço. Já conduzi ministros, gente importante, mas agora conduzir o Presidente da República e este menino… Nem sei dizer qual deles me deu mais gosto conduzir, se o Presidente Marcelo se o João. É que o carro está parado, o custo está feito. Sair daqui e dar uma volta com um garoto durante uma hora ou duas não é nada. Aquilo é uma coisa irrisória e é nestes momentos que vemos o bem que podemos fazer aos outros com coisas simples“, afirma Nuno Sousa, lembrando a felicidade de João ao subir para o teto de abrir da viatura e ao sair da limousine, à porta de casa, com um ar de satisfação “e a acenar a toda a gente”.

Empresa que alugou limousine queria oferecer o serviço, mas Marcelo insiste em pagar

A Lisboa Limousines, empresa que alugou a viatura que Marcelo usou para cumprir o sonho de João, foi surpreendida pelo pedido. “Recebemos o contacto da Presidência da República e, inicialmente, nesse primeiro contacto, não sabíamos bem qual era o objetivo”, revela ao Observador João Lima, gerente da empresa. “Inicialmente foi complicado dar resposta, porque temos uma grande frota no Porto, mas em Lisboa só temos uma limousine e nem temos motorista fixo, vamos contratando motorista à medida dos serviços que temos“, detalha o responsável da empresa.

“Ligaram a dizer que precisavam de uma limousine rapidamente, no espaço de cerca de meia-hora, no Hospital Garcia de Orta. Era com urgência, pareceu-nos que aquilo tinha sido uma coisa decidida em cima da hora. Tivemos sorte e conseguimos contactar um dos motoristas a quem costumamos recorrer para os serviços em Lisboa”, explica João Lima. O motorista “só não teve tempo de se vestir a rigor como é habitual para os serviços com limousine, foi como estava buscar a viatura e ainda conseguiu chegar ao local combinado num intervalo de tempo aceitável”.

O serviço foi então contratado segundo os procedimentos normais da Lisboa Limousines. Nem a Presidência nem a empresa revelam o valor pago do bolso de Marcelo Rebelo de Sousa, mas a Lisboa Limousines confirma que se tratou de um serviço normal, de acordo com “o preço normal, que é público, de 159 euros por hora”. “Mas quando nos apercebemos daquilo que na realidade era o serviço, tentámos comunicar à Presidência aquilo que teríamos dito se soubéssemos de antemão: que iríamos colaborar de forma gratuita, porque somos sensíveis a esse tipo de situações e inclusivamente já participámos em outras iniciativas da Make-a-Wish, no Porto“, explica João Lima.

“Demos essa indicação à assessora do Presidente. Queríamos saber se o senhor Presidente da República aceitava não pagar este serviço, que tínhamos o gosto em oferecer. Ela disse-nos que agradecia e que iria comunicar ao Presidente a intenção. Depois foi-nos dito que não. Que o Presidente agradecia o nosso gesto, mas que fazia questão de pagar ele próprio o serviço“, diz o empresário ao Observador. “Ele vai pagar-nos na totalidade. Não quis aproveitar para não pagar, o que também é um gesto de ressalvar”, comenta.