Os técnicos do Banco Central Europeu, em Frankfurt, já estão a estudar a melhor forma de retirar os estímulos monetários que foram lançados em 2015 — o quantitative easing — e que têm sido decisivos para a retoma económica e o fim da turbulência nos mercados financeiros da zona euro. Segundo a Bloomberg, que cita fontes próximas deste processo, os meses de verão irão servir para definir diferentes estratégias para um desmame, que se quer o mais suave possível. O Conselho do BCE reúne-se esta quinta-feira mas o anúncio do fim das compras de dívida só deverá chegar na próxima reunião, em setembro.

A expectativa dos economistas, de um modo geral, é que o presidente do BCE, Mario Draghi, irá esperar pela rentrée para anunciar o ínício do fim dos estímulos. O desmame deverá começar, depois, em janeiro, de forma gradual. Os mercados financeiros antecipam que o programa estará totalmente finalizado no espaço de nove meses, ou seja, até setembro de 2018, a julgar por uma sondagem da Bloomberg junto de especialistas.

O desmame pode ser mais longo ou mais repentino (do que estes nove meses, até setembro de 2018), conforme a análise e as simulações que já estão a ser feitas pelos técnicos. Porém, a expectativa dos economistas é que é mais provável que a autoridade monetária peque por excesso do que por carência. A subida rápida das taxas de juro nas últimas semanas, depois de um discurso em Sintra em que Draghi pareceu querer testar a reação dos mercados a um fim mais rápido dos estímulos, terá servido de aviso: o programa de compras de dívida continua a ser um fator importante para manter as taxas de juro de países e empresas em níveis historicamente baixos.

Apesar desse efeito positivo, a realidade é que a taxa de inflação subjacente na zona euro continua perto de 1%, ou seja, metade do objetivo de médio prazo da autoridade monetária na zona euro. “O BCE tem mesmo de encerrar o programa de compras de dívida no próximo ano, não tem alternativa se quiser respeitar as limitações legais [auto-impostas] de não deter mais do que um terço da dívida de cada país”, escreve Jörg Krämer, economista-chefe do Commerzbank, em nota de antecipação da reunião desta quinta-feira. “Por outro lado, o programa de compras de dívida ainda não atingiu os objetivos a que se propôs”, isto é, elevar a taxa de inflação até aos 2%, explica o economista.

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Para os analistas do Morgan Stanley, Mario Draghi terá nos próximos meses de fazer um “ato de equilibrismo”, como um trapezista. Porquê? Porque adotou recentemente um tom ligeiramente mais hawkish, ou seja, tendente a reduzir os estímulos, o que pode ser uma boa ideia para começar a preparar os mercados para o desmame inevitável. Contudo, Mario Draghi tem de ter cuidado para não parecer que está a haver uma mudança demasiado súbita, caso contrário as taxas de mercado podem subir ainda mais e o euro pode valorizar-se (o que também não seria algo bem-vindo, nesta fase, para o BCE).

Ao longo dos próximos meses, porém, antecipamos mais mudanças [no discurso do BCE], à medida que a economia continua a melhorar — na aproximação à divulgação das novas projeções macroeconómicas — e fique demonstrado que estamos num ponto de inflexão, ainda que pouco pronunciado”, diz o Morgan Stanley.

Qual é o risco? É que alguns países não aproveitaram as taxas de juro baixas para fazer as reformas estruturais que os coloquem em melhor posição para quando a política monetária for normalizada. O exemplo mais claro? Itália, diz o Commerzbank. “A Itália não usou a margem de manobra dada pelo BCE para reformar a sua economia e continua a representar uma ameaça para a estabilidade da união monetária”, escreve Jörg Krämer.

Com o BCE a reduzir os estímulos, a incerteza económica e política em Itália é um dos riscos capazes de “aumentar o nervosismo entre os investidores e, em última análise, reacender a crise da dívida soberana”.