O Governo, através do secretário de Estado da Energia, anulou um despacho emitido pelo anterior executivo que permitia refletir determinados custos das produtoras de eletricidade nos preços finais ao consumidor, a partir de 2016.
Em causa estão os encargos com a tarifa social de eletricidade e com a Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE), medidas que pela lei não devem ser suportadas pelos consumidores, mas sim pelos produtores.
A EDP é a principal pagadora da CESE da eletricidade e da tarifa social, matérias que aliás que está a contestar. E nessa medida terá sido a principal beneficiária desta disposição. O Governo deu ainda ordens para o regulador fazer as contas a esses ganhos e descontá-los nos preços da eletricidade de 2018, com benefício para os consumidores. O impacto deste efeito retroativo, que deve ser contestado pelas elétricas, ainda é desconhecido. Segundo o jornal Público, o benefício para os preços de eletricidade em 2018 pode chegar ao seu 100 milhões de euros.
A decisão, publicada esta quarta-feira em Diário da República, surgiu na sequência de dúvidas sobre a legalidade do que foi decidido em dois pontos do despacho assinado a 3 de outubro de 2015, mesmo em cima das eleições legislativas.
O atual secretário de Estado com a área de energia, Jorge Seguro Sanches, declara nulidade parcial do despacho assinado pelo antecessor, Artur Trindade. No despacho de anulação, o atual secretário de Estado fundamenta esta anulação com o facto de um estudo elaborado pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) não apresentar qualquer “justificação que permita afastar a ilegalidade detetada e anteriormente enunciada aos números 11 e 12 do despacho de 2015”.
Para o atual Governo, a repercussão destes custos só poderia ser incluída se estivesse previstas na lei, o que não é o caso. “Na verdade, a determinação por ato administrativo (despacho) da repercussão nas tarifas de eletricidade dos custos suportados pelos produtores com a tarifa social e com a CESE constitui a criação de uma nova contribuição pecuniária para os consumidores”.
E neste caso, continua o despacho, “não só não existia lei que previsse tal contribuição pecuniária como, pior, existia Lei que expressamente a proibia, o que determina a nulidade parcial do despacho (….) por força do código do procedimento administrativo”.
Para além da lei, os responsáveis do Governo de então afirmaram publicamente que a CESE não poderia ser repercutida no preço final da eletricidade pelas elétricas.
A legislação, publicada a tempo de produzir efeitos nos preços de energia de 2016, inclui várias medidas de política energética e determina como deve ser repercutido o seu impacto nas tarifas de eletricidade. Os pontos 11 e 12 do despacho de 2015, cuja ilegalidade é suscitada, não referem explicitamente qual o seu significado ou intenção do legislador, limitando-se a fazer referências a disposições previstas em variados decretos-lei e portarias.
O objetivo seria o de neutralizar o efeito dos impostos em Espanha, de acordo com a informação recolhida pelo Observador. O despacho procurava harmonizar o impacto da carga fiscal nos preços do mercado ibérico. Considerando que em Espanha os impostos específicos sobre a eletricidade são mais elevados, a finalidade era deduzir o efeito fiscal nos preços em Portugal.
A decisão de 2015 foi tomada ao abrigo de um decreto-lei de 2013 de harmonização fiscal no quadro do MIBEL (mercado ibérico de eletricidade). O despacho define 6,5 euros por megawatt hora como o impacto líquido dos impostos a cobrar em Portugal para igualar a carga fiscal praticada em Espanha. Estes valores deveriam ser fundamentados num estudo do regulador, que quando chegou ao atual governo foi, na análise de Jorge Seguro Sanches, “omisso no que se reporta à ponderação dos custos com a tarifa social e com a CESE.”
Este é já o segundo despacho assinado pelo atual Governo sobre a legislação publicada pelo Governo PSD/CDS sobre a repercussão dos custos de interesse económico geral nas tarifas de eletricidade e que tiveram efeitos em 2016 e 2017. Já em agosto, o secretário de Estado da Energia tinha revogado a totalidade do despacho no que diz respeito ao seu efeito futuro.
A decisão mais recente determina que perante a ilegalidade dos dois pontos referidos, a ERSE deve voltar a fazer as contas à tarifa do uso geral do sistema (USG) aplicada aos preços da eletricidade de 2016 e 2017 para determinar qual deve ser a “recuperação em benefício das tarifas pagas pelos consumidores, dos montantes indevidamente nelas incluídos nos anos anteriores”.
As centrais elétricas que foram beneficiadas têm 10 dias para se pronunciarem sobre esta intenção com efeitos retroativos.
Esta é a segunda medida do Governo conhecida esta quarta-feira que vai penalizar a elétrica liderada por António Mexia,depois de ter sido anunciado no Parlamento que as centrais da EDP terão de devolver cerca de 73 milhões de euros de ganhos a mais obtidos no mercado dos serviços de sistema.
Ainda se desconhece qual será o impacto da anulação do despacho do anterior Executivo nos preços da energia elétrica a partir de 2018. Números avançados pelo jornal Público apontam para 100 milhões de euros, o que elevaria a 173 milhões de euros o benefício a passar para os preços de eletricidade do próximo ano.
EDP obrigada a devolver ganhos de 72,9 milhões aos consumidores