Já há muito que o ex-autarca do Porto, Rui Rio, anda a preparar a candidatura à liderança do PSD, o que aconteceria independentemente dos resultados nas autárquicas, tendo até já um site pronto. O péssimo resultado de domingo só veio tornar a decisão e o anúncio mais iminente. Numa declaração ao DN, a propósito da reunião desta segunda-feira com altas figuras do partido, o social-democrata confirmou a intenção, dizendo que “notícia era se eu não falasse com ninguém nesta altura”.
Tal como o Expresso noticiou esta segunda-feira, Rui Rio convidou várias figuras de peso do partido para um jantar, numa quinta de um amigo em Azeitão, entre as quais se destacam nomes como o de Ângelo Correia (que foi apoiante de Passos), Nuno Morais Sarmento, Manuela Ferreira Leite, Feliciano Barreiras Duarte (ex-chefe de gabinete de Passos Coelho) e José Eduardo Martins. O objetivo desse encontro foi analisar os resultados das eleições autárquicas e apresentar e discutir as linhas orientadoras da sua candidatura. Ao DN, Rui Rio confirmou que já há algum tempo anda a falar com as principais figuras do PSD e que vai continuar a fazê-lo nos próximos dias.
Este jantar aconteceu um dia depois do desastre eleitoral de domingo para o PSD e um dia antes do Conselho Nacional desta noite, onde Passos Coelho poderá anunciar se avança ou não com uma recandidatura à liderança do partido. Seja já esta terça-feira ou daqui a uns dias, várias fontes do partido acreditam que a decisão do atual líder será a de não se recandidatar, responsabilizando-se pelos maus resultados nas autárquicas, embora o ex-primeiro-ministro tenha deixado tudo em aberto no discurso de reação aos resultados, na noite de domingo.
“Não vou apresentar a minha demissão do PSD por causa de umas eleições locais. O que vou avaliar é se, politicamente, faz sentido recandidatar-me a um novo mandato”, disse Passos Coelho.
Nessa mesma noite, na TVI, Manuela Ferreira Leite confessou estar “atónita e chocada” com os resultados “demasiadamente maus”. E a ex-líder do PSD afirmou ainda que “o núcleo duro do PSD desapareceu”, pedindo responsabilização do líder. Também Marques Mendes, no seu espaço de comentário na SIC, disse que não ficaria surpreendido se “hoje ou na terça-feira Pedro Passos Coelho dissesse que sai”. “Se Passos não o fizer, a vida dele vai ser um inferno e vai ter muitas dificuldades numas diretas.”
E até José Miguel Júdice, que já foi vice-presidente do PSD, disse que “a grande dúvida destas eleições é saber a que horas é que Passos Coelho se demite”.
A verdade é que mesmo antes destes resultados, já algumas figuras de peso do partido andavam a pressionar para a saída de Passos Coelho. Escreve o DN que, há uma semana, um conjunto de críticos (Manuela Ferreira Leite, Silva Peneda e João de Deus Pinheiro) próximos de Rui Rio começaram a esboçar uma carta aberta com um balanço crítico de Passos e em defesa de um novo rumo para o PSD.
Ao Observador, Ângelo Correia, afirmou na tarde desta segunda-feira que “Passos esgotou-se” e que as autárquicas “deixaram o partido frágil em vários pontos de vista”. O antigo dirigente do PSD defendeu contudo que o atual líder social democrata “deve ser tratado com uma dignidade adequada” e que é preciso ter “cuidado para não fazer exclusões”, embora considere que mais importante do que discutir pessoas é discutir a estratégia e as ideias do partido. E que se estivesse no lugar de Passos, nas atuais circunstâncias, já se teria demitido.
Se Passos não for a jogo, Montenegro entra em campo?
Luís Montenegro, que tem sido o nome apontado como o substituto mais natural de Passos Coelho caso este desista de se recandidatar, tem-se mantido em silêncio. E a verdade é que Montenegro não estaria a contar com a possibilidade de Passos Coelho não se recandidatar e ter de avançar tão cedo.
O Expresso escreve esta terça-feira que, em primeiro lugar, o ex-líder parlamentar estava a contar avançar para a presidência do partido só em 2019 caso Passos Coelho perdesse nas legislativas com Costa. Além disso, escreve ainda o mesmo jornal, Luís Montenegro sabe que está demasiado associado a Passos e que esse seria um ponto contra ele, depois dos resultados deste domingo. E cita um colaborador muito próximo do social-democrata que diz que “a melhor pessoa para o fazer nesta fase é Rui Rio, que já começou esse trabalho”.
Paulo Rangel, outro possível candidato não assumido à liderança do PSD, apurou o Observador, desmarcou a agenda em Estrasburgo para estar presente no Conselho Nacional desta terça-feira.
Esta terça-feira, num artigo assinado no jornal Público, o eurodeputado social-democrata reconhece que “a derrota foi dura” e que os resultados do PSD — “especialmente dolorosos, porque o PSD é genética e sociologicamente um partido das autarquias e dos territórios” — exigem “decerto reflexão, avaliação e debate, que, em grande parte, mesmo sem estudos mais profundos, é possível fazer no curto prazo. Esse debate foi aberto (ou reaberto) no domingo, está já em curso e segue o seu caminho”.
Acrescentando que essa reflexão “não deve esfumar-se numa luta de personalidades ou num choque de séquitos e aparelhos”. Incita, antes disso, ao fim da “anestesia crítica” e deixa críticas ao Governo que, “todos os dias, descura e desguarnece o Estado, nas áreas da segurança e da soberania em geral, desnata e esvazia o serviço nacional de saúde, fragiliza e ilude o sistema educativo, paralisa e trava qualquer impulso reformista” –
PSD aquece: Rangel cancela agenda em Estrasburgo, Rio em Azeitão com barões
Outras nomes que já foram mencionados para a presidência do partido são os de Pedro Duarte e Miguel Pinto Luz, presidente da distrital de Lisboa até junho e vice-presidente da Câmara de Cascais.
Pedro Duarte escreve, também esta terça-feira no Público, sobre “Ser social-democrata em 2017”. Num tom bastante crítico diz que embaraço do PSD está “na sua obsoleta organização, no seu estilo de liderança e, principalmente, na ausência de um programa político decente e inspirador”.
O ex-dirigente da Juventude Social-Democrata e antigo vice-presidente do grupo parlamentar do partido considera que o resultado “desastroso” das últimas eleições é só mais uma prova do “caminho errático seguido pelo PSD nos últimos anos”. Para Pedro Duarte, contudo, os próximos tempos arriscam-se a ser de “disputa infantilizada em torno de rostos e personagens”, em que haverá “uma divisão do partido entre os ‘nossos’ e os ‘deles'”.
Ainda assim, o jurista propõe que aos dirigentes do PSD a convocação imediata de um Congresso “para discutir ideias, projetos, estratégias e políticas”. “Sem disputa de liderança, nesta primeira fase. Entendamo-nos sobre a agenda e a proposta que o PSD quer apresentar aos portugueses. Discuta-se de forma livre, sem condicionalismos, nem dependências de candidatos ou lugares. Para que, num momento posterior, se faça a escolha dos melhores protagonistas.”
Já o crítico Pacheco Pereira admite que a mudança de líder é importante, mas desde que não seja um “seguidor” de Passos Coelho. “Pode haver uma ou outra afirmação cosmética, e tudo continuar na mesma, seja com Passos Coelho ou com um seu seguidor e discípulo, ou pode haver alguma mudança, que, mesmo sendo pouca, se for na direção certa, pode começar a virar uma página negra da história partidária”, lê-se no artigo que assina também no Público. “Não vai ser fácil, exactamente porque não é apenas um problema de mudar de líder, mas sim de mudar de grupo dirigente, principalmente em Lisboa e Porto e, mais importante do que tudo isso, mudar de política.”
E volta a criticar a deriva dos últimos anos no PSD: “Criou-se assim uma espécie de esquizofrenia política, que não ocultava no entanto o caminho de posicionamento do PSD para uma direita que deixaria horrorizados os fundadores do partido. Este caminho abandonou o centro político ao PS e era só uma questão de tempo até as sondagens e os resultados eleitorais começarem a revelar a usura do PSD reformista do passado a favor de um partido que se sentia bem numa frente de direita com o CDS e cuja linguagem e posições políticas o isolam cada dia que passa”.
O PSD estará reunido esta manhã em Comissão Permanente, durante a tarde será a vez da Comissão Política e à noite o Conselho Nacional.