Já chegaram a parar na Segunda Circular porque viram uma mancha de cor pela janela do carro e dizem que uma das fornecedoras com que trabalham lhes guarda tudo o que são pés tortos e flores estranhas. “Não temos pudor em usar seja o que for”, resume Luís, metade da kckliko, uma empresa familiar portuguesa que faz arranjos apenas com flores locais, a maioria pouco óbvias.
Entre as espécies inusitadas contam-se ramos de plátanos apanhados no chão, ramagens com líquenes ou bagas, frutos secos, ervas daninhas, espigas e até favas em flor ou restos de árvores podadas, adquiridas nas hortas dos vizinhos (que também fornecem flores dos próprios jardins) e habilmente transformadas em composições dignas da revista Kinfolk. “Agrada-nos poder reaproveitar”, continua Luís. Ponto assente desde a fundação da marca, há dois anos, por razões ambientais e de respeito pela origem das espécies, é “trabalhar só com flores portuguesas e da estação”.
A primeira a descobrir e a fascinar-se com o universo florido foi Albane, a costela feminina da empresa. Depois de trabalhar em diferentes floristas, a francesa chegou a ter uma loja própria quando se mudou para Lisboa, obrigatoriamente com nome de flor: Rose. Ao fim de três anos teve de fechar o espaço e afastou-se das jarras e das tesouras de podar, mas o parceiro fez força para que voltasse e hoje trabalham ambos a partir de casa, com uma sala transformada em armazém de flores e outra cheia de frascos alinhados onde os pés mais pequenos esperam a sua vez, mergulhados em água.
Um conselho prático
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As flores precisam de água limpa para se manterem bonitas mais tempo, pelo que é importante mudar a água regularmente. Se possível deve-se cortar a ponta do pé de cada flor porque é aí que estão os canais através dos quais elas bebem (e que podem ficar entupidos com a sujidade).
“Por mais inusitado que possa parecer, tudo o que incorporamos num arranjo passou por uma fase experimental em nossa casa para perceber a durabilidade da espécie e como evolui numa jarra”, explica Luís, sobretudo tendo em conta que “normalmente um ramo devia durar uma semana”.
Nas experiências ou na escolha dos recipientes (também apenas de origem portuguesa e de marcas de cerâmica como Otchipotchi e Anna Westerlund), o casal trabalha a quatro mãos, “às vezes seis”, quando a filha Violetta aparece para ajudar, e juntos fazem tudo, das composições às fotografias. Pontualmente, no caso de uma encomenda maior como um casamento, têm ajuda, mas não querem sair desta escala familiar.
Seja para um cliente particular, para um hotel/restaurante ou um evento, o ponto de partida de um novo arranjo tanto pode ser uma ramagem maior como uma paleta de cores harmoniosa, selecionada previamente. “Vamos trabalhando um pouco por sentimentos”, diz Luís. É preciso também ter em conta se o arranjo só tem uma frente ou se é para ser admirado de todos os lados, a altura da mesa em que vai ser colocado, as preferências do cliente e o orçamento disponível, sendo que o casal trabalha apenas a partir dos 40€, com entrega incluída.
Possíveis vestígios da formação em Belas Artes, na área da fotografia, ambos preferem evitar a simetria e procuram recriar “um ar mais natural, mais selvagem” nos seus arranjos. O próprio nome da empresa vem daí e é uma transposição fonética da palavra coquelicot, francês para a papoila comum. “Escolhemos esta espécie porque é uma flor particular. É uma planta espontânea e não a conseguimos usar porque assim que a colhemos ela perde as pétalas”, explica Luís. “Ao mesmo tempo, é uma flor que gosta de nascer em terrenos remexidos, lavrados, mas não é bem recebida pelos agricultores. Nós gostamos dessa tenacidade, gostamos das flores que vingam, que lutam contra a adversidade.” As flores que até na Segunda Circular teimam em aparecer.
Nome: Kckliko
Data: 2015
Encomendas: 91 749 1726, 91 760 9836 ou através do site
Preços: a partir de 40€ com entrega
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