O cenário é negro, talvez mais negro do que se antevia no ano passado, quando Marcelo Rebelo de Sousa usou o mesmo palco para descrever o panorama dos meios de comunicação social clássicos como “particularmente difícil”. Agora, com a crise financeira a dar sinais de estar a passar, fica a descoberto que o jornalismo, pelo contrário, não está a viver melhores dias. E isso preocupa o Presidente da República, ele próprio com um passado muito ligado à fundação de jornais. Na entrega dos Prémios Gazeta 2016, Marcelo Rebelo de Sousa pintou o panorama do jornalismo com “cores escuras”, ainda mais escuras do que há um ano, mas deixou claro que “o jornalismo não vai morrer nunca”. Tal como não vai morrer “o direito a vivermos em liberdade”.

“Quero deixar uma palavra para adensar as cores escuras com que pintei há um ano o panorama nacional de muita da nossa comunicação social. Estamos a sair da crise das finanças públicas, crescemos mais do que esperávamos, o emprego aumentou, mas houve mais alguns jornais a morrer ou a sofrer agruras para sobreviverem. Mais jornalistas foram despedidos, as tiragens mirraram até valores inimagináveis, as rádios conheceram limitações enormes na sua viabilidade quotidiana, e até as televisões enfrentam desafios complexos”, disse, numa curta intervenção depois de dar os prémios e a palavra aos galardoados.

Marcelo avisou logo que “o tempo comunicacional longo há muito passou à história”, por isso fez uma discurso relâmpago de pouco mais de três minutos. Primeiro para elogiar o “heroísmo” dos jornalistas — “porque o heroísmo também se faz com a pena, com a palavra e com a imagem” –, e para congratular aqueles que “teimam em manter viva e prestigiada a liberdade de imprensa em dias de aperto ou sufoco”.

Depois de descrever o cenário negro e de sufoco em que vivem os jornalistas, Marcelo criticou o facto de a Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) continuar há mais de um ano num impasse, sem dirigentes nomeados, devido à falta de “consensos” entre os partidos políticos, sobretudo PS e PSD, que têm falhado os entendimentos necessários para a eleição daqueles titulares. E acabou a deixar uma palavra de ordem para “prosseguir a luta”.

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“Sem informação forte não há democracia forte. E estes prémios têm o mérito adicional de serem um sinal de esperança, porque traduzem um gesto de resistência virada para o futuro”, disse. E vaticinou: “O jornalismo não vai morrer nunca, como não morrerá a liberdade de falar, escrever, criticar, denunciar, publicar, difundir, e emitir. Como não morrerá em Portugal o direito a vivermos em liberdade, em pluralismo e em democracia”.

Antes, já os premiados tinham feito os seus discursos, alguns mais politizados do que o discurso do próprio Presidente da República. Foi o caso do fotojornalista Enric Vives-Rubio, que venceu o Prémio Gazeta de Fotografia, pela imagem ‘Mulher a caminhar no meio do parque de estacionamento do Festival de Danças Populares Andanças’, publicada no jornal Público no ano passado. Enric, que está atualmente “no desemprego”, depois de vários anos a recibos verdes, “numa situação precária”, é de nacionalidade catalã e começou logo por cumprimentar o Presidente da República em catalão: “A língua do meu país”, como fez questão de sublinhar, numa referência à situação política que se vive naquela região autónoma de Espanha depois de aprovado o referendo à independência.

Além de Enric Vives-Rubio, também a jornalista do Expresso Luciana Leiderfarb foi distinguida com o Prémio Gazeta de Imprensa, e Teresa Abecassis e João Carlos Malta, da Rádio Renascença, receberam o Prémio Gazeta Multimédia. Isabel Meira, da TSF, recebeu o Gazeta de Rádio, e Margarida Metello, pela série documental “Reforma Agrária”, emitida pela RTP 2, foi distinguida com o mesmo galardão para Televisão. O prémio Gazeta de Mérito foi atribuído a José Quitério, que foi durante quatro décadas crítico gastronómico do semanário Expresso. E o prémio de imprensa regional foi atribuído ao jornal Barcelos Popular, fundado em 1976.