O ex-ministro da Cultura foi esta tarde de sexta-feira absolvido do crime de violência de doméstica e de 21 crimes de difamação. Manuel Maria Carrilho foi condenado, no entanto, por um crime de difamação a uma multa de 900 euros. O ex-governante terá, ainda, que pagar uma indemnização de 3 mil euros a Bárbara Guimarães. A sentença foi lida no Campus de Justiça, em Lisboa.

Relativamente ao crime violência domestica, a juíza Joana Ferrer — que foi alvo de dois pedidos de afastamento por parte de Bárbara ao longo do julgamento — afirmou que o tribunal se deparou com falta de provas. A apresentadora de televisão, disse a magistrada, sempre usou roupas que permitiam denunciar marcas de agressões e as testemunhas que foram a tribunal não corroboraram essa versão. “Deparamo-nos com a ausência de uma prova pericial consistente, uma vez que as perícias realizadas o foram com base em suporte fotográfico sem valor forense, com as fragilidades supra descritas”, lê-se na sentença disponibilizada aos jornalistas no final da audiência.

No julgamento, a apresentadora Bárbara Guimarães disse sempre que nunca se deslocou a um hospital ou ao Instituto Nacional de Medicina Legal por “vergonha”. Argumento que não convenceu a juíza. O tribunal compreenderia a vergonha, justificou a juíza, caso a intenção de Bárbara fosse avançar apenas com uma ação de divorcio de modo a por um ponto final no casamento e a regular o poder paternal dos dois filhos que tinha com Carrilho. Mas tal “argumento cai por terra a partir do momento em que a assistente, concomitantemente e tendo já Mandatário constituído, decide ainda avançar com uma queixa-crime contra o Arguido, por violência doméstica”, lê-se na decisão.

Mais. Bárbara acusa Carrilho de a ter agredido a 14 de outubro de 2013, antes de este ir três dias para Paris. E aproveitou. depois, esta sua ausência para apresentar uma queixa-crime por violência doméstica e interpor uma ação de divórcio. “Um relatório pericial de dano corporal seria, seguramente, um fortíssimo e decisivo elemento de prova a apresentar num julgamento por crime de violência doméstica”, argumenta o tribunal. Carrilho seria informado destas intenções a 18 de outubro, quando chegou ao aeroporto, por um amigo de Bárbara que lhe entregou um documento a dar-lhe conta dessas ações e da proibição de entrar em casa.

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“Uma mulher determinada e senhora da sua vontade (como afirmado pelos seus próprios amigos) ‘casa’ mal com qualquer tipo de inibição, no caso de efetivamente se encontrar numa situação de perigo a que tivesse de reagir”, escreve a juíza.

Joana Ferrer Antunes também não aceitou os argumentos de Bárbara em tribunal relativamente aos elogios que fez ao marido em entrevistas a vários jornais, revistas e televisões até poucos meses antes do divórcio e numa altura em que o casamento já estaria mal. Disse a apresentadora que essas entrevistas foram “um esforço para manter as aparências como mandam os cânones que regem a conduta das figuras públicas”. “Este argumento também cai por terra”, explica a juíza, quando há testemunhas próximas de Bárbara a garantirem que ela sempre disse ser muito feliz ao lado do marido.

“Temos mais dificuldade em considerar como verosímil que o tivesse feito com uma amiga e confidente de muitos anos e que lhe merece claramente uma grande confiança”, lê-se.

O tribunal também considerou inverosímil que Carrilho tivesse ameaçado Bárbara com uma faca, quando esta tinha a filha Carlota ao colo. “Tal não se coaduna com as regras da normalidade do acontecer que, num hipotético cenário de um tal violência, uma criança pequenina de 3 anos apenas (a qual, além do mais e no caso de Carlota, reagia com prontidão a qualquer acontecimento que ocorresse junto de si), não desse por nada e não desatasse num pranto compulsivo.”, justificou a sentença. E mais uma vez invoca a personalidade de Bárbara.

“Assim como se não se coaduna com as regras da normalidade do acontecer que uma mulher determinada, independente e auto-suficiente em termos financeiros como é a Assistente – a qual afirma que aquele episódio a assustou e causou medo -, ficasse passivamente à espera de outros eventuais atos tresloucados da mesma natureza, por parte do Arguido, e não tomasse imediatamente medidas para se proteger, a si e, desde logo e acima de tudo, aos seus filhos”, lê-se.

A juíza não compreende como é que a apresentadora, sentindo medo do arguido, mudou de casa e foi viver a escassos metros do ex-marido, Manuel Maria Carrilho. E conclui que o cenário apresentado em tribunal “está nos antípodas de uma relação de aterrorizamento, de rebaixamento da dignidade, de domínio e de neutralização da vontade, de um dos membros do casal sobre o outro”. Joana Ferrer diz que não ficou provado que a relação dos dois tivesse chegado ao ponto que a acusação do Ministério Público descreve. Pelo que absolve o arguido do crime de violência doméstica.

“As versões conflituantes da Assistente e do Arguido, perante uma prova pericial inconclusiva porque desprovida de valor forense, e perante uma prova testemunhal abundante, mas que não foi capaz de sustentar a acusação pública”, refere a sentença.

Quanto aos 22 crimes de difamação, adverte a juíza que “nem tudo aquilo que se considere ofensa à dignidade ou uma desconsideração reveste tal natureza”. O tribunal entendeu, por isso, que Carrilho praticou apenas um crime de difamação “no contexto de uma situação de conflito agudo entre o mesmo e a sua então mulher”. Num “cenário de rutura” que o próprio arguido assumiu em tribunal, alegando que muitas vezes se “deixou levar” “pelas perturbadoras circunstâncias em que se encontrava”, sendo uma reação “a quente” a vários fatores”. A juíza considerou então que o arguido só atingiu a honra de Bárbara Guimarães em duas situações:

1) Numa declaração de Carrilho relativamente à fidelidade conjugal, em que que respondeu que teriam de colocar-se várias hipóteses: “homens, mulheres, gatos”.

2) Nas alusões feitas pelo Arguido sobre Bárbara e o alcoolismo. Ainda assim, considerou o tribunal “existir, efetivamente, um problema instalado” e alertou para o facto de Bárbara necessitar de ajuda e de apoio “antes que ocorram danos irreparáveis para próprios e terceiros inocente”.

“Não podendo o Tribunal perder de vista que no “epicentro” de tudo isto estão duas crianças, as quais sofrem as consequências do “furacão” que atingiu esta família, a sua família”, disse Joana Ferrer, no único momento em que levantou a voz enquanto lia um resumo da sentença.

Carrilho foi, por isto, condenado a 150 dias de multa, a uma taxa diária de 6 euros, o que totaliza os 900 euros. Se não pagar, terá que cumprir 100 dias de prisão. Foi ainda condenado ao pagamento de uma indemnização por danos morais de 3 mil euros à Bárbara Guimarães. A apresentadora pedia-lhe mais de 600 mil euros por indemnização, alegando que a imagem que fez passar dela tinha tido reflexos no seu trabalho. E que deixara de receber s cerca de 45 mil euros mensais que recebia antes do divórcio. O tribunal não deu como provadas estas consequências e até disse haver contradições nos argumentos de Bárbara. e

Durante a leitura do resumo da sentença de 276 páginas, a juíza disse que o tribunal teve em conta os relatos do ex-governante, com a “voz embargada” e os olhos “cheios de lágrimas. Carrilho ouviu, de semblante carregado, mas não manifestou qualquer emoção. À saída do tribunal, Manuel Maria Carrilho disse aos jornalistas que lhe tinham tirado “um peso dos ombros” e que a absolvição tinha sido o fim “de um calvário de quatro anos”. O professor disse que ia comemorar a decisão com o filho.

Dois processos, duas sentenças

A sentença foi precisamente o contrária da que lhe foi aplicada a 31 de outubro e a que foi condenado a uma pena suspensa de quatro anos e meio de cadeia pelos crimes de violência doméstica, ameaça, ofensas à integridade física, injúrias e denúncia caluniosa contra a ex-mulher, a apresentadora Bárbara Guimarães, o seu ex-namorado, o empresário Ernesto “Kiki” Neves, e um amigo de Bárbara, Ricardo Pereira. O ex-governante, de 66 anos, foi ainda obrigado a frequentar um programa de sensibilização contra a Violência Doméstica e proibido de contactar com a ex-mulher.

Manuel Maria Carrilho tinha já sido condenado em dois outros processos, que já transitaram em julgado, pelo crime de difamação e ameaça agravada a familiares de Bárbara Guimarães. Um transitou em julgado em 2016 e outro já este ano.

Processo Carrilho e Bárbara. Que provas tem a juíza?