Bolos, bolachas, cereais de pequeno almoço e pipocas. Estas são algumas das categorias de alimentos em que o Governo quer discutir com a indústria uma redução dos níveis de açúcar, sal e ácidos trans até ao ano de 2020. E essa é apenas uma das medidas previstas no despacho que formaliza a criação da Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (EIPAS), que será publicado esta sexta-feira, e a que o Observador teve acesso.
A ideia é atender às recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e, na linha do que já se está a fazer com o pão, fazer com que o consumo de sal “se aproxime dos 5g / dia em 2020”, o consumo de açúcar das 50g/dia e as gorduras trans se “aproximem do zero”.
Um em cada quatro portugueses sofre de hipertensão e um em cada 10 tem diabetes. Estes dois números ajudam a ilustrar a necessidade de mudar comportamentos alimentares, sobretudo quando a “evidência científica demonstra que o elevado consumo de açúcar está relacionado com a prevalência de doenças crónicas como a obesidade e a diabetes, estando, por seu lado, o consumo excessivo de sal associado à hipertensão arterial e à doença cardiovascular”.
Em Portugal os hábitos alimentares inadequados são o fator que mais contribui para o total de anos de vida saudável perdidos pela população portuguesa”, lê-se no diploma.
A “maior dificuldade”, sublinha, será “construir mecanismos robustos de verificação do cumprimento e não deixar que fique ao critério da indústria”, mas de uma Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), de uma ASAE, ou até de um INSA (Instituto Ricardo Jorge), defende Pedro Graça, da DGS. “Se não houver monitorização a estratégia não funciona.”
“A meta para que isto aconteça é 2020. Agora, se vamos ter metas apenas para 2020 ou criar três momentos de verificação vamos ter ainda de definir internamente.”
Além disso há uma outra medida que se destaca entre as cerca de meia centena, que aponta para o alargamento da proibição de alimentos nocivos à saúde a outras máquinas de venda automática automática nos serviços do Estado. Será preciso perceber como e quando avançam.
O teor do despacho que será agora publicado é em quase tudo idêntico ao documento apresentado no final de julho e que esteve em discussão pública nos primeiros quinze dias de agosto. Pedro Graça, diretor do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, admite que “a maior parte das coisas que estão aqui são intenções que agora, ponto a ponto, o grupo que vai gerir a estratégia vai ter de ter a capacidade de transformar em valores concretos”.
Mas não quer dizer que uma coisa cheia de intenções seja uma mão cheia de nada. A partir e 1 de janeiro, a primeira coisa a definir são metas mais concretas e as grandes categorias de alimentos pelas quais vamos começar.”
Outra das vertentes desta estratégia é a da comunicação, de modo a que os portugueses estejam mais informados sobre a real composição dos produtos, do impacto do seu consumo na saúde, e possam fazer escolhas saudáveis.
Dessas medidas destaque, por exemplo, para a promoção da “literacia alimentar em grávidas e nos pais sobre a importância da alimentação saudável nos primeiros 1000 dias”. Porque além de “os primeiros 1.000 dias de vida serem muito mais determinantes do que pensamos na modelação do gosto pelo açúcar e sal”, “as idas ao pediatra são menos recorrentes”, justificou ao Observador Pedro Graça, acrescentando que “uma área que acho que vale a pena trabalhar muito é nos jardins de infancia”.
“A definição de uma estratégia integrada, que envolva o Ministério da Saúde e os restantes ministérios, bem como os diferentes parceiros intervenientes no sector da alimentação, assume inquestionável relevância, de forma a obter uma redução significativa e sustentável do consumo excessivo de açúcar, sal e gorduras, e promover a disponibilidade dos alimentos enquadrados num padrão alimentar saudável”, lê-se no despacho. Assinaram o despacho da estratégia o ministro da Agricultura, a ministra do Mar, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o secretário de Estado das Autarquias Locais, o secretário de Estado da Educação, o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, o Adjunto do Comércio a secretária de Estado da Indústria e a secretária de Estado do Turismo.
A publicação deste diploma, chega um dia depois de se ficar a saber que o Governo quer que, até 30 de junho, deixe de estar disponível nos bares, cafetarias e bufetes dos hospitais e centros de saúde de norte a sul do país alimentos nocivos à saúde.
Incentivos fiscais para promoção de alimentação saudável ficaram pelo caminho
O Governo chegou a pensar em introduzir incentivos fiscais para pôr os portugueses a comerem melhor, mas essa ideia, que constava de uma versão preliminar do documento, caiu logo na altura em que se abriu o documento a discussão pública, em agosto. E dessa discussão não resultou qualquer alteração, pelo que o despacho que será esta sexta-feira publicado continua a não fazer referência aos ditos incentivos.
Governo quer incentivos fiscais para promover consumo de alimentos mais saudáveis
No despacho que aprova a Estratégia Nacional da Promoção para a Alimentação Saudável, ao invés de se ler “incentivar fiscalmente o consumo de categorias de alimentos diretamente relacionados com a prevenção da doença crónica, nomeadamente fruta e produtos hortícolas frescos”, como se lia no documento preliminar noticiado pelo Observador no final de julho, lê-se antes “incentivar transversalmente o consumo de categorias de alimentos diretamente relacionados com a prevenção de doença crónica, nomeadamente fruta e produtos hortícolas frescos”.
De referir que este Governo tentou avançar com uma nova taxa sobre produtos com excesso de sal, como batatas fritas, pipocas e outros, no próximo ano, mas PSD e CDS, com a ajuda (abstenção) do PCP, bloquearam a medida. Fim diferente teve a “sweet tax”, introduzida no Orçamento do Estado para este ano, e que se aplica a bebidas açucaradas. Também este ano foi firmado um protocolo com a indústria de panificação e, pastelaria e similares, para reduzir gradualmente o sal no pão.