O deputado José Silvano é o nome escolhido por Rui Rio para suceder a Feliciano Barreiras Duarte no lugar de secretário-geral do PSD, avançou o partido numa nota enviada às redações. Admite que ficou “surpreendido” com o convite de Rui Rio, mas garante que aceitou com “espírito de missão”. Ao Observador, o deputado que coordenou as polémicas alterações à lei do financiamento dos partidos no Parlamento, deixa um recado aos conselheiros nacionais que ainda vão ter de votar, e aprovar, o seu nome: “Se querem ganhar eleições (regionais, europeias e legislativas) temos de nos unir. Se querem jogos de outra forma, então votem contra”.

José Silvano começará a exercer funções de imediato, de forma interina, até ser eleito no final do mês. A nomeação do deputado social-democrata tem ainda de ser ratificada na próxima Comissão Política Nacional, agendada para 28 de março, e, posteriormente, no Conselho Nacional do PSD, previsto para o mesmo dia. Sem candidatura alternativa, e sendo que o rioísmo não tem maioria no Conselho Nacional, a eleição de Silvano será mais um teste decisivo à liderança de Rui Rio. O social-democrata desvaloriza e diz não ter sequer “receio” de não ter o apoio da maioria dos conselheiros.

Nem sequer tenho receio disso. Quando aceitei esta missão, porque entendo isto com uma missão, fi-lo porque sempre vivi a minha vida política fora da política de salão: com trabalho, e sempre com eleições ganhas no meu distrito (Bragança), em autárquicas e legislativas”, disse em declarações ao Observador, acrescentando que até já recebeu “mensagens e telefonemas” de conselheiros nacionais afetos à ala santanista, a congratulá-lo pela nova função, o que indicia que não haverá problema na eleição. Ao Observador, um conselheiro eleito na lista de Rio mas afeto à ala de Santana diz que não vê qualquer razão para votar contra o nome escolhido pelo presidente do partido: “Aceitei estar na lista de Rui Rio, agora não vejo razões para não aceitar quem quer que seja escolhido pelo presidente do partido”, afirma, sublinhando que “se há lugar político que deve ser da confiança política do presidente do partido é o cargo de secretário-geral”.

José Silvano acrescenta ainda ao Observador que o convite de Rui Rio foi feito na base do “trabalho que é preciso desenvolver para o PSD ganhar as próximas eleições”. “É preciso dizer que temos de nos unir para ganhar”, disse. “[Rui Rio] Disse-me que era preciso uma pessoa que metesse as mãos no trabalho, e eu sou essa pessoa”, acrescenta.

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Na nota que fez chegar às redações, a direção do PSD lembra o percurso do advogado de 61 anos. Silvano é natural de Vila Real, tendo sido Presidente da Câmara Municipal de Mirandela. É atualmente deputado e líder da distrital do PSD/Bragança.

Coordenou o negócio secreto entre os partidos sobre o financiamento

Deputado eleito nesta legislatura pelo círculo de Bragança, José Silvano já tinha estado no Parlamento entre 1995 e 1999. Foi designado na passada quarta-feira coordenador do grupo de trabalho do reforço da transparência no exercício de cargos públicos, depois de Luís Marques Guedes, até então coordenador, ter passado para o lugar de Fernando Negrão na presidência dessa comissão. Silvano assumiu a “responsabilidade” de coordenar esses trabalhos dizendo “medidas para aumentar a confiança dos cargos políticos e altos cargos públicos serão preocupações centrais”.

“Com a eleição para presidente do grupo parlamentar do PSD do deputado Fernando Negrão, foi eleito presidente desta comissão o deputado Marques Guedes que exercia as funções de coordenador. Nesta circunstância, assumi as funções de coordenador do grupo parlamentar do PSD nesta comissão. Temas como a Transparência na vida pública, incompatibilidades e impedimentos e enriquecimento ilícito, serão prioridades a tratar. Medidas para aumentar a confiança dos cargos políticos e altos cargos públicos serão preocupações centrais dos trabalhos desta comissão. É uma grande responsabilidade coordenar os trabalhos desta comissão em representação do grupo parlamentar do PSD”, escrevia na altura na sua página de Facebook.

Foi também a José Silvano que foi dada a missão de coordenar os trabalhos “escondidos” do grupo de trabalho sobre o financiamento dos partidos, onde PSD, PS, BE e PCP foram muito rápidos a fazer aprovar, em vésperas de Natal, alterações à lei do financiamento dos partidos, que lhes conferia vantagem na angariação de fundos e isenção de IVA. O grupo de trabalho foi acusado de ter atuado “às escondidas”. Na altura, veio-se a saber depois quando foi divulgada a ata da reunião, foi a José Silvano que coube descrever à comissão dos Assuntos Constitucionais, “de forma sucinta”, as mudanças “minimalistas” introduzidas na lei. O problema era que as alterações não eram tão minimalistas assim.

No debate parlamentar de 16 minutos, no dia 21 de dezembro, minutos antes de as alterações serem aprovadas, José Silvano elogiou os resultados alcançados pelo grupo de trabalho: “Temos uma lei mais eficaz, mais eficiente, sem inconstitucionalidades, capaz de dar resposta aos partidos e às campanhas eleitorais”.

[“Um grande consenso”. Veja no vídeo os autoelogios de José Silvano e dos outros deputados no momento em que aprovaram as alterações à lei do financiamento dos partidos]

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A eleição de Silvano e o novo teste para Rio

O estatutos do PSD estabelecem que compete aos 70 membros do Conselho Nacional do PSD “eleger o substituto de qualquer dos titulares da Mesa do Congresso e da Comissão Política Nacional, com exceção do seu Presidente, no caso de vacatura do cargo ou de impedimento prolongado, sob proposta do respetivo órgão.” Rui Rio não controla a maioria do Conselho Nacional, mas os seus opositores internos também não estarão interessados em passar a imagem de que deixarão, de forma gratuita, o PSD ingovernável, como contava aqui o Observador.

Rui Rio até elegeu 34 conselheiros (dos 70) na lista que apoiou ao Conselho Nacional. Parece quase maioria do Conselho Nacional, mas, na prática não é, na sequência do acordo Rio-Santana no Congresso. Tendo em conta a proporção do acordo feito pelos dois antigos candidatos durante o Congresso, Rio só tem cerca de metade dessas “tropas”, já que a outra metade são apoiantes de Santana Lopes, em resultado da fusão das candidaturas.

Os estatutos não prevêem a figura de “voto contra”, pelo que, em teoria, a eleição de José Silvano para o cargo será uma mera formalidade — à semelhança do que aconteceu com Fernando Negrão, para a liderança da bancada parlamentar do PSD. Mas os resultados serão sempre um barómetro da legitimidade política do novo secretário-geral — basta recordar o que disse, por exemplo, Paula Teixeira Cruz depois de Negrão falhar a maioria simples na eleição para a bancada. Na altura, a ex-ministra da Justiça foi taxativa: “A liderança da bancada do PSD não está legitimada nem do ponto de vista político nem do ponto de vista jurídico”. Resta saber o que acontecerá agora a José Silvano.

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Elina Fraga no PSD pela mão de Silvano

Há um dado curioso que liga José Silvano a outra figura central da direção de Rui Rio: Elina Fraga. Como contava aqui o Observador, foi o então presidente da Câmara de Mirandela que convidou, em 2005, a ex-bastonária da Ordem dos Advogados para se juntar à bancada municipal do PSD, logo depois de Fraga ter rompido com o CDS.

A saída de Elina Fraga aconteceu depois de uma luta fratricida no CDS. A então advogada era uma militante “muito destacada” no aparelho democrata-cristão e tinha uma vida ligada ao partido — a mãe levava-a aos congressos quando era ainda criança. Em 2003, no entanto, tudo mudou: Elina Fraga candidatou-se à concelhia do CDS e perdeu para outra facção que disputava o controlo de Mirandela. O resultado mudaria para sempre a vida da atual vice-presidente do PSD.

Depois da derrota, Elina Fraga e outros 11 deputados do CDS na Assembleia Municipal de Mirandela tornaram-se independentes, em protesto contra a liderança da concelhia. O rombo foi brutal: dois anos antes, nas autárquicas que ditaram o fim do guterrismo, o CDS, liderado precisamente por Domingos Doutel, quase roubara a vitória ao PSD, ficando a escassos 322 votos do vencedor, o hoje deputado social-democrata José Silvano. A bancada municipal do CDS tinha 18 deputados, os mesmos que a do PSD. Agora, mais de metade saía com Elina Fraga. Mas era apenas o segundo assalto. A 25 janeiro de 2005, dava-se a rutura final: Domingos Doutel era escolhido pela estrutura local como cabeça de lista pelo círculo eleitoral de Bragança e Elina Fraga entregava finalmente o cartão de militante.

Elina Fraga. Quem é a vice de Rio que partiu o PSD ao meio?

José Silvano, então presidente da Câmara de Mirandela, aproveitou a oportunidade. “Vi nela muito potencial“, recorda ao Observador. “Tinha sido uma adversária política difícil, mas sempre correta e leal. Decidi convidá-la e ela aceitou. Não houve dramas”, resume o social-democrata, indicado para suceder a Feliciano Barreiras Duarte. Começava assim a aventura de Elina Fraga no PSD, de que é hoje vice-presidente.