Uma semana depois da March for Our Lives, o vídeo que a CBS News publicou no Youtube com o discurso de Naomi Wadler já soma mais de 100 mil visualizações. Um outro vídeo, do Guardian News, com cinco das intervenções mais marcantes da tarde de sábado — entre as quais a da menina de 11 anos de Alexandria, EUA — já ultrapassou as 157 mil visualizações. O nome de Wadler tornou-se viral nas redes sociais poucas horas depois de a criança de origem etíope subir ao palco de Washington e dizer que estava ali “para mencionar as meninas afro-americanas cujas histórias não chegam às primeiras páginas dos jornais nacionais, cujas histórias não abrem os telejornais da tarde”. Centenas de milhares de pessoas aplaudiram a intervenção que escutaram de pé; nos dias seguintes, milhões de pessoas fariam de Naomi Wadler uma das principais figuras da luta contra as armas nos EUA e da defesa das mulheres afro-americanas.
Uma semana depois, Naomi — que não tem conta em qualquer rede social e que, garantiu a mãe ao britânico The Guardian, não a terá tão cedo— já começa a ganhar consciência do movimento a que deu um forte impulso com os seus quatro minutos e alguns segundos de discurso. Nos primeiros momentos, estava longe de imaginar o impacto das suas palavras.
Só quando disse o último ‘obrigado’ me apercebi de quanta gente estava a olhar para mim”, recordou, numa entrevista por telefone dada no mesmo dia em que falou na capital norte-americana.
Foi a segunda mais nova pessoa a falar na March of Our Lives — Yolanda King, neta do ativista Martin Luther King, ficou com esse estatuto aos 9 anos, mas protagonizou uma intervenção mais ensaiada, com todo o simbolismo pelo apelido que carrega mas menos consciente daquilo que estava verdadeiramente em causa numa manifestação em que se marchou contra o fácil acesso a armas de guerra na sociedade norte-americana e que surgiu em resposta a mais um tiroteio escolar, desta vez na escola secundária de Marjory Stoneman Douglas, em Parkland, no estado da Florida.
Neta de Martin Luther King também tem um sonho: acabar com as armas
Antes de subir ao palco, em Washington, Naomi estava com receio de “fazer asneira”, escreve o Guardian. Esse convite surgiu depois de ter organizado, com a colega uma marcha de 18 minutos na sua escola na Virginia, em homenagem às 17 crianças assassinadas. Todas as outras manifestações duraram 17 minutos, mas ali o protesto durou mais um minuto, para que se homenageasse Courtlin Arrington, uma adolescente afro-americana morta a tiro na escola, no Alabama, em março.
“Superámos as expectativas”, disse a jovem aluna na manhã dessa primeira marcha que organizou. Nascida na Etiópia, adotada ainda bebé nos EUA, Naomi cresceu protegida de um ambiente de violência nas ruas. Na escola onde estuda, a probabilidade de um aluno ou um adulto irromperem pelos corredores de armas nas mãos a disparar sobre quem quer que apareça no caminho é menor. O contexto social é outro. Mas a consciência social de Naomi formou-se, apesar dessa bolha que a protege. Alexandria é um bairro de classe média-alta, nos arredores de Washington. “Cresci numa zona em que os tiroteios não são regulares, mas eles também não acontecem de forma não-frequente”, assinalava pouco antes de sair para a rua com os colegas de escola, a 14 de março.
Depois da marcha de 14 de março — um mês do massacre de Parkland –, a autarca Alexandria, Allison Silberberg dirigiu-se a Naomi, sugerindo-lhe que apostasse numa carreira como advogada, como autarca ou, eventualmente, presidente. Enquanto apertavam as mãos, a criança de 11 anos explicou que a última sugestão lhe estava vedada. A Constituição norte-americana limita candidaturas à Casa Branca a “cidadãos nascidos” no país.