A academia sueca anunciou que não vai entregar o Nobel da Literatura este ano, adiando essa decisão para 2019. O anúncio foi feito esta sexta-feira em comunicado na sequência do escândalo conhecido recentemente que envolve fugas de informação e abusos sexuais.
As denúncias desses casos levaram à saída de cinco membros do júri, deixando assim de haver quórum para avaliar e decidir o nome a atribuir o prémio máximo da literatura. A Fundação Nobel, liderada por Carl-Henrik Heldin, que assina o comunicado, já tinha anunciado que o adiamento do prémio era uma possibilidade. Na mensagem em que confirmam a decisão — lembrando que, embora raras, já houve situações em que tomaram posições semelhantes, mas nunca por estes motivos –, os responsáveis da instituição explicam que “uma das circunstâncias que pode justificar uma exceção acontece quando uma instituição que atribui distinções é atingida por algo tão grave que pode minar a sua credibilidade”.
O impacto gerado pela denúncia de abusos sexuais está assim a ser encarado como “uma crise na Academia Sueca que afetou significativamente o prémio Nobel. Esta decisão tem por base a gravidade da situação e deverá ajudar a proteger a longa reputação do prémio Nobel”. Fica ainda esclarecido que a Literatura será a única categoria a ser alvo desta decisão, as restantes distinções serão entregues, como previsto, durante este ano.
A Fundação Nobel anunciou ainda que a academia irá colocar “todo o seu empenho na missão de restaurar a sua credibilidade e que todas as situações concretas serão reportadas”. Referem ainda que está em marcha “um alargado processo de reforma”, para o qual pedem o envolvimento de todos os membros da academia, e que “a futura estrutura organizacional deverá ficar marcada por uma maior abertura ao exterior”.
Uma decisão rara motivada por um escândalo
O Nobel da Literatura, atualmente no valor de nove milhões de coroas suecas (863 mil euros) foi, tal como os das restantes categorias, sete vezes não atribuído durante as guerras mundiais do século passado — em 1914 e 1918, em 1935, e depois em 1940, 1941, 1942 e 1943 – mas nunca por outros motivos como o atual. O escândalo rebentou em novembro, quando o jornal Dagens Nyheter publicou a denúncia anónima de 18 mulheres de abusos e agressões sexuais contra o dramaturgo Jean-Claude Arnault, ligado à academia através do seu clube literário e marido de um dos seus membros, Katarina Frostenson.
A academia cortou todas as ligações a Arnault e encomendou uma auditoria independente sobre as suas relações com a instituição, mas divergências internas quanto às medidas a adotar desencadearam demissões, acusações e saídas de cinco membros, entre os quais a secretária permanente em exercício, Sara Danius, e Katarina Frostenson.
Na passada quinta-feira, os membros que continuam a ocupar as suas cadeiras na academia decidiram divulgar os resultados dessa auditoria e entregá-los às autoridades, além de anunciar reformas. O relatório rejeita que Arnault tenha influenciado decisões sobre prémios e subsídios, embora o apoio económico que recebeu viole as regras de imparcialidade, pelo facto de a sua mulher ser coproprietária da empresa que geria o clube literário; e confirma que a confidencialidade sobre o vencedor do Nobel foi diversas vezes violada.
De entre as mudanças no funcionamento da instituição, destaca-se a reforma dos estatutos proposta pelo rei Carlos XVI Gustavo, patrono da academia, para permitir a verdadeira renúncia dos seus membros, por desejo próprio ou após dois anos sem participarem ativamente, e a possibilidade de serem substituídos.
Até agora, as renúncias são simbólicas, porque a pertença à academia é vitalícia e só são eleitos novos membros quando vaga alguma cadeira por morte do respetivo ocupante. Estas últimas cinco saídas (somadas à ausência de duas autoras que há vários anos boicotam a instituição, por outros motivos) deixaram a instituição com apenas 11 dos 18 assentos ocupados, menos um que os necessários para eleger novos membros e tomar decisões, como as relativas ao Nobel.